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Pesquisadores conseguem reproduzir efeitos do zika vírus em embriões de camundongos

publicado: 03/03/2017 00h05, última modificação: 03/03/2017 08h37
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O estudo rastreou o caminho que o vírus percorre ao cair na corrente sanguínea, de modo similar ao que acontece após a picada do mosquito Aedes aegypti - Foto: Divulgação/EPTU

tags: laboratório nacional de biociências , zíka vírus , estudo , embriões , camundongo

 

Pesquisadores do Laboratório Nacional de Biociências (LNBio) reproduziram em laboratório, com precisão, os efeitos do vírus zika no desenvolvimento embrionário. Ao serem infectadas, fêmeas de camundongos geraram, pela primeira vez, embriões com malformações que também vêm sendo encontradas em seres humanos. O LNBio é um laboratório que integra o Centro Nacional de Energia e Pesquisa em Materiais (CNPEM), vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).

Em artigo publicado na revista internacional PLOS Neglected Tropical Diseases, os pesquisadores relacionam o desenvolvimento das malformações ao tempo de gestação. Fêmeas infectadas entre 5,5 e 9,5 dias após o coito – período análogo àquele da segunda à quinta semana de gestação em seres humanos – estiveram mais suscetíveis a apresentar embriões com problemas. Já cobaias contaminadas em fases mais avançadas não apresentaram problemas morfológicos.

“Pensávamos que a exposição crítica seria um pouco mais tardia, por volta do início do segundo trimestre, mas os nossos estudos mostram que não. Na realidade, ela é muito precoce”, explicou o pesquisador José Xavier Neto, do LNBio.

“Isso não significa, porém, que exista um período livre de riscos, uma janela segura na qual as grávidas poderiam ser expor ao vírus zika”, acrescenta o pesquisador do laboratório, Murilo Carvalho.

Os embriões gerados durante o estudo apresentaram malformações como hidrocefalia (acúmulo de líquido no cérebro), artrogripose (doença congênita caracterizada por múltiplas contraturas nas articulações) e disrafia espinhal (problemas no fechamento do tubo neural). De acordo com pesquisas anteriores, a hidrocefalia precede a microcefalia. “Nós avançamos nisso, ao mostrar que antes da hidrocefalia há um processo de falha na fusão do tubo neural [estrutura embrionária que dá origem ao cérebro e à medula espinhal]. Isso provoca um defeito nas paredes do tubo”, descreveu Xavier Neto.

Até então, os modelos animais disponíveis para estudos do vírus zika continham limitações, como sistema imunológico deficiente, emprego de linhagens geneticamente modificadas ou meios de infecção invasivos, como injeções cerebrais. Já na pesquisa desenvolvida no LNBio, o sistema imunológico das cobaias foi mantido intacto e a contaminação aconteceu por meio de injeção intravenosa nas fêmeas grávidas. Dessa forma, o modelo rastreou o caminho que o vírus enfrenta ao cair na corrente sanguínea, de modo similar ao que acontece após a picada do mosquito Aedes aegypti.

Ser humano

“O que a gente fez foi reproduzir exatamente o que acontece no ser humano, onde as defesas imunológicas são todas saudáveis, em um animal também saudável, e a gente conseguiu mostrar que mesmo neste tipo de modelo, o vírus é capaz de alcançar o embrião”, explicou Carvalho, ao informar que os camundongos receberam a mesma quantidade de zika que o Aedes aegypti pode transmitir ao picar o homem.

Por representar condições semelhantes às observadas em grávidas e embriões humanos infectados, o novo modelo pode promover estudos sobre anomalias e malformações embrionárias decorrentes.

A pesquisa também permitiu a descrição de danos à placenta. Dentre as principais alterações causadas pelo vírus, está a destruição de camadas essenciais à gestação. A barreira onde ocorrem as trocas de metabólitos entre os organismos materno e fetal se mostrou inexistente, substituída por uma camada de colágeno e pontos de hemorragia. O estudo ainda demonstrou ausência da camada placentária responsável por secretar hormônios. O LNBio realizou o trabalho em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) de Pernambuco. O estudo foi financiado com recursos do MCTIC, do Ministério da Saúde, por meio do programa Rede Zika, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).