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TURISMO CULTURAL

Fazenda Tanques de portas abertas

publicado: 01/07/2024 09h12, última modificação: 01/07/2024 09h14
Local no Brejo paraibano é apontado como maternidade para negras escravizadas durante o século 19
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Há 200 anos, o grande complexo rural era formado por casa-grande, senzala, curtume, tanques para armazenar água, pasto para pecuária e plantação de agave | Fotos: Arquivo pessoal/Rosa Aguiar
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por Rasa Aguiar (Especial para A União)*

A Fazenda Tanques, propriedade privada que é patrimônio cultural e arquitetônico de 1823, localizada às margens da BR-104, distante apenas 6 km da cidade de Remígio, no Brejo paraibano, se abre para o turismo recebendo grupos para visitas guiadas de estudantes de escolas, universidades e grupos diversos, para a realização de eventos e cafés.

No passado, o local era um grande complexo rural formado por casa-grande, senzala, curtume, área de tanques para armazenar água, pasto para pecuária e plantação de agave. Entretanto, é reconhecida por todos da região por ter sido também uma maternidade para negras escravizadas.

A tradição oral conta que as ruínas da Fazenda Tanques são um registro da história do passado escravocrata de Areia, já que Remígio era distrito do município. A área pertencia ao rico comerciante português de escravizados chamado Francisco Jorge Torres — o Jorge Marinheiro, proprietário também do Casarão José Rufino, localizado no Centro de Areia, onde existia uma senzala urbana.

O casarão foi recentemente recuperado e está aberto a visitação. Gerações de moradores da região contam que era na Fazenda Tanques que as mulheres escravizadas de propriedade de Jorge Marinheiro vinham de Areia para ter seus filhos, que, em pouco tempo, seriam separados para a venda.

Na época, a reprodução de pessoas escravizadas significava novos ganhos comerciais. O Marinheiro Jorge comercializou mais de uma centena de negros escravizados e dizem que as negras vinham para Tanques porque era menos frio — já que é localizada na divisa com a região do Agreste.

Patrimônio promove eventos de pesquisa e de lazer na região

Para chegar ao exato local apontado como a maternidade na Fazenda Tanques, é preciso seguir o que os guias chamam de “trilha cultural”, enquanto se observa a natureza e sua flora típica. É um caminho curto para chegar a algumas ruínas, uma delas formada por uma casa feita de pedras e paredes grossas, apenas uma porta de entrada e saída, e com apenas uma janela, que teria uma grade. Lá seriam realizados os partos e onde ficavam mães e filhos até eles serem comercializados.

De acordo com o pesquisador e professor Raimundo Segundo, a Fazenda Tanques “era uma fazenda de gado e também de gente”. Ele é um dos guias da equipe que recebe os visitantes e mostra todo o local, que tem ainda as ruínas de uma possível senzala, o curtume onde eram tratados o couro dos animais e uma grande área cercada por muralhas antigas. Esse também pode ter sido um dos primeiros lugares no Nordeste onde foi feito o represamento de água para a fazenda, e daí o nome de Tanques.

O lugar recebeu, em 2020, a visita do escritor e pesquisador Laurentino Gomes, autor da trilogia Escravidão. Ele gravou um vídeo impressionado com as informações da tradição oral sobre o lugar. “A reprodução sistemática era uma das formas do sistema escravista pouco documentada, como se fosse a pecuária hoje”. O escritor ressalta que informações importantes para as pesquisas sobre a dinâmica da escravidão e seus processos não eram registradas em papel e lápis, mas na tradição das histórias passadas pelas gerações, que podem esclarecer diversos fatos.

A Fazenda Tanques sempre esteve fechada para visitação e, depois de mais de 200 anos, ela se abre para o turismo cultural, de experiência e para a promoção de eventos de pesquisa, como o que aconteceu recentemente, intitulado Reflexões sobre a memória da escravidão no interior da Paraíba, que recebeu estudantes, professores, pesquisadores e profissionais de diversas áreas do conhecimento.

Sem dúvida, um lugar que poderá revelar ainda muitas informações sobre esse nefasto período da história do Brasil, que é preciso conhecer para aprender as lições. A Fazenda Tanques possui uma área de apoio para os visitantes formada por um café para lanches rápidos com mesas, redes para descanso e banheiros.

É possível agendar grupos grandes para cafés e piquenique durante o pôr do sol. Está aberta para visitação nos sábados, das 14h30 às 16h30, e nos domingos, das 9h até as 11h. Agendamentos devem ser feitos pelo telefone (83) 99184-5711 ou pelo perfil oficial do local no Instagram (@fazendatanquesrmg).

Use o link para acessar o perfil oficial da Fazenda Tanques no Instagram

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 20 de junho de 2024.