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Documentário ‘Meu Pai, Eliézer Rolim’ estreia na 17ª edição do Fest Aruanda, evento audiovisual que, este ano, homenageia o cineasta

“Conheçam ele como eu conheci”

publicado: 27/11/2022 00h00, última modificação: 29/12/2022 15h32
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Cena gravada no Açude Grande foi recriada em ilustração pela própria artista e, além de ser o cartaz do filme, foi também o último cartão de aniversário dado ao seu pai

tags: eliézer rolim , minna miná , fest aruanda

por Gi Ismael*

 

“Papai, eu posso fazer esse documentário com você”. No cotidiano de Minna Miná e Eliézer Rolim, a parceria artística era constante: Minna, uma ilustradora, quadrinista e artista gráfica, Eliézer, um dramaturgo e cineasta. Com o quarteto familiar completo com a matriarca Rosangela Miná e o filho Kauê Rolim, todo mundo se ajudava quando o assunto era um novo projeto audiovisual. Sem saber, a afirmação que Minna fez ao seu pai seria sua última contribuição ao lado do pai e o começo de uma despedida emblemática.

A repentina morte de Eliézer Rolim em fevereiro deste ano emocionou o cenário cultural paraibano, que meses antes lamentava a partida do cineasta Ely Marques também em decorrência da Covid-19. Após o premiado longa-metragem Beiço de Estrada (baseado na peça homônima do próprio diretor), o documentário Meu pai, Eliézer Rolim foi o último projeto audiovisual que o diretor viria a se dedicar. Produzido e finalizado entre 2020 e 2022, o curta-metragem terá a estreia oficial na programação da 17ª edição do Fest Aruanda do Audiovisual Brasileiro, evento que homenageia a vida e obra de Eliézer Rolim. A sessão acontecerá no dia 6 de dezembro, às 14h, na Rede Cinépolis (Manaíra Shopping), em João Pessoa.

Contemplada pela Lei Aldir Blanc, através da Secretaria Estadual de Cultura (Secult-PB), a ideia do documentário partiu de Rosangela Miná, que foi produtora de diversos filmes e peças de seu marido. “Quando ela viu esse edital com uma premiação para projetos documentais sobre personalidades paraibanas, conversou com meu pai e, a princípio, ele não curtiu a ideia”, contou Minna. “Lembro que ele disse: ‘Eu mesmo fazer um documentário sobre mim, em vida? Quem faz isso?’, foi aí que eu me juntei pra tentar convencê-lo”. A filha sugeriu que o projeto fosse feito em dupla e que trouxesse uma história contada a partir da ótica dela enquanto filha e artista em busca de respostas ao conhecer mais a vida e a carreira de seu pai. “O documentário marcaria os 60 anos de vida dele, então seria ainda uma homenagem a ele e sua trajetória”, contou Minna Miná.

Ela no Porto, em Portugal, e ele em João Pessoa, no Brasil, os dois se comunicavam por telefone durante toda a pré-produção do filme, escrevendo argumento e roteiro juntos, até que Minna veio à Paraíba em 2021 para participar das filmagens. O filme passeia por locais importantes na vida de Eliézer, como sua casa em Cajazeiras, cidade do Sertão paraibano onde nasceu, e o Teatro Santa Roza, mas também traz um importante diálogo sobre um quadro mais geral o qual Rolim fazia parte: os trabalhadores das coxias. Através de depoimentos de colegas como Dadá Venceslau, o curta-metragem expressa a importância destas equipes que nem sempre recebem o devido reconhecimento.

Sem muitos registros fotográficos ou visuais para ilustrar as histórias contadas por Eliézer Rolim, parte do documentário conta com animações feitas por Minna Miná em rotoscopia, um processo frame a frame. Ela usou os familiares como modelos em filmagens caseiras, para depois dar vida com seu estilo sensível e lúdico de desenhos.

“Nós conseguimos fazer juntos todo o processo do filme. Durante a gravação, eu achava que o que eu estava fazendo não estava à altura do meu pai. Não era algo que ele pedia, mas eu sempre quis fazer mais. Era estressante, até, essa insegurança e ele me tranquilizava”, contou a artista. “Ele me dizia que a gente já havia feito o melhor que podia com aquele material, e insistia que a gente precisava terminar. Batemos o martelo e concluímos a produção em janeiro de 2022. Em 2 de fevereiro, meu pai faleceu”, comentou ela.

“Olhando para trás, vejo que conseguir concluir esse processo foi um momento de cura, precisávamos passar por isso juntos. Eu sentia que era importante, mas não sabia porquê, eu entendia o privilégio, a honra. Agora tudo faz sentido. Todo esse processo do documentário parece como uma preparação, uma despedida”.

Minna conta que a produção a fez se aproximar ainda de Eliézer e descreveu o momento como “profético”. “Eu descobri que ainda tinha muito a conhecer do meu pai. Fomos à casa de infância dele, conheci seus amigos, e tivemos essa aproximação, mas parecia também uma despedida. Meu pai era uma pessoa muito espiritualizada, eu chego a pensar que tudo isso fazia parte de uma alquimia, uma transmutação”, refletiu.

Por exemplo, ela falou que Rolim gostaria de encerrar o documentário com uma cena onde ele entraria sozinho no mar, um drone captaria essa imagem e seguiria para o horizonte. “Eu cheguei para o meu pai e falei que aquilo daria a entender que ele estava morrendo, que era melhor terminar de outra forma, algo mais pra cima. Então caminhamos juntos pela praia”.

A cena onde pai e filha conversam no Açude Grande, em Cajazeiras, sobre o que é ser artista foi tão especial para a ilustradora, que ela a replicou em desenho para o cartaz do filme, a única peça da produção que Eliézer não pôde conhecer. “Desde criança, em todos os aniversários do meu pai, eu fazia um cartão para ele com um desenho e uma mensagem. Essa cena foi a que eu desenhei no último cartão de aniversário que fiz para ele, quando completou 60 anos no ano passado. Ele disse que havia sido o cartão mais bonito que eu já havia feito. Eu tenho certeza que ele iria gostar do cartaz”.

Minna Miná, que pousa em João Pessoa na próxima semana para a estreia do curta-metragem, se emocionou quando refletiu sobre a importância da obra. “O fato de ele ter conseguido, em vida, terminar esse documentário comigo foi muito especial. Não sei se conseguiria sem ele. Depois do falecimento, a gente ter esse produto é uma forma, para mim, enquanto filha, sair com ele embaixo do braço e dizer: ‘Gente, meu pai foi uma pessoa muito especial. Conheçam ele. Conheçam ele como eu conheci’”, analisou ela.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 27 de novembro de 2022.