Hilton Gouvêa
Era uma vez a história de três irmãos entre 16 e 20 anos de idade, que liam muita ficção científica. Um dia eles resolveram fundar um grupo musical em São Paulo e o batizaram como “Os Mutantes”. Meses depois, estouravam nas paradas de sucesso com o álbum que tinha o nome da banda. Era 1º de junho de 1968. Atualmente, 50 anos depois (completados na próxima sexta-feira), o conjunto está desfeito, mas seus sucessos ainda giram por aí, para alegria de quem gosta de música de boa qualidade. Só que, no Brasil, os discos de “Os Mutantes” são raros, sendo mais fácil adquiri-los no exterior.
Sérgio Dias, Cláudio César, Arnaldo e Dinho, inicialmente formaram o grupo. Mas Cláudio César era luthier dedicado e passava os dias fabricando instrumentos musicais no quintal, inclusive esculpindo uma guitarra de ouro. Não demorou muito e eles descobriram que a vaga de Cláudio poderia ser substituída por uma loirinha sardenta, de olhos azuis, descendente de americanos. Era Rita Jones, que adotou o sobrenome Lee, em homenagem ao general sulista da Guerra da Secessão (EUA), que acabou vencido pelos nortistas.
Tudo na banda nascia de uma inspiração exótica. O nome dela foi tirado do livro “O Império dos Mutantes”, de Stefan Wul. Com o grupo já conhecido e autor de muito sucesso, surge, entre eles, numa excursão fora do Brasil, um músico garotão norte-americano. Sérgio, Dinho e Rita haviam descoberto Ritchie, que fez sucesso com “Garota Veneno”. Poucos sabem disso, né? Mas uma colaboradora chamada Pricila, nos dá essa e outras valiosas informações.
“Os Mutantes” então, elaboram sua primeira letra. Foi o rock “Ando Meio Desligado”, que não falava só de amor, mas incluía uma passagem sobre a sensação causada pela maconha, segundo depoimento de discípulos da erva. Para burlar a censura, “Os mutantes criaram a gíria “burets”. Significava maconha. E isto ficou claro no disco “Os Mutantes e Seus Cometas no País do Burets”. Em português, Burets significa bureta, um vaso de vidro em formas redondas, utilizado nas dosagens químicas dos laboratórios.
Sérgio Dias tinha uma guitarra de ouro, fabricada por seu irmão, Cláudio. Atrás do instrumento havia uma maldição escrita, “A conjuração do Sábado”, uma espécie de ameaça aos ladrões ou invejosos. A maldição dizia que quem pegasse a guitarra, vendesse, copiasse ou até mesmo fizesse sobre ela comentários difamatórios, seria amaldiçoado pelo resto da vida. Por coincidência, Rita Lee foi presa e perseguida pelo governo da ditadura e acabou saindo do conjunto. Foi substituída por Liminha, um baixista e produtor musical, que veio a ser o mago das produções pop atuais.
Na música “Ando Meio Desligado”, ouve-se uma conga no início da música é tocada pelo percussionista pernambucano Naná, que agradou a todos. Mas, em 1973, nas gravações de AO e Z, o material não agradou a gravadora, que recusou lançar o disco e demitiu a banda. Sem contrato e enfrentando problemas diversos com as drogas Arnaldo, um dos integrantes do grupo, decide abandoná-lo e parte em carreira solo. Dinho e Liminha o imitam.
Houve inúmeras tentativas para reunir o grupo novamente, mas Sérgio Dias não conseguiu êxito. Arnaldo recusou todos os pedidos para que voltassem a tocar juntos. E repetiu esta negativa em 1992, quando seus irmãos se reuniram para um show, mas Arnaldo não apareceu. O show foi feito apenas com a presença de Rita Lee e Sérgio Dias. Arnaldo vive atualmente em seu sítio, no interior de Minas Gerais, ao lado de Lucinha, sua esposa, não muito ligado em assuntos musicais.