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Adeus à Luzinete, a “Rainha da Seresta” na Paraíba

publicado: 25/11/2022 11h48, última modificação: 29/12/2022 15h32
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Com forte apelo popular, paraibana tinha quase 50 anos de carreira - Foto: Foto: Acervo Pessoal/Facebook

tags: Luzinete , CULTURA , tributo

por Joel Cavalcanti*

 

Uma voz que parecia vir de outra época, que trazia em seu timbre uma tradição nostálgica dos trovadores românticos que cantam as paixões e os desencantos amorosos com forte apelo popular. Luzinete Silva Firmino, mais conhecida como a “Rainha da Seresta”, morreu na madrugada ontem, em Bayeux, na Grande João Pessoa. Ela tinha 67 anos e deu entrada com um quadro de desconforto respiratório em uma UPA, mas não resistiu depois de sofrer sucessivas paradas cardiorrespiratórias. A artista havia contraído Covid-19 há cerca de 15 dias, mas teria se recuperado, conforme informações de parentes. O enterro foi realizado ontem em Bayeux, onde ela nasceu.

Para o jornalista e escritor Ademilson José, o que Luzinete fazia era algo raro em seus 47 anos de carreira. “Acho ela um fenômeno. Uma coisa rara. Não vou falar aqui em qualidade de produção musical, porque ela sempre trabalhou de forma mais improvisada, com apenas um tecladista. Ela não tinha apoio e as músicas dela não tocavam nas mídias. Mesmo assim, sua voz era conhecida de Cabedelo a Cajazeiras. Um show dela era a publicidade da próxima apresentação”, afirma Ademilson que há cerca de oito anos chegou a dedicar uma edição inteira de seu programa na televisão na TV Câmara para tratar sobre a trajetória pessoal e artística de Luzinete.

Caçula e única mulher entre oito irmãos, o pai de Luzinete tocava serestas e a mãe se apresentava no coral. Ela começou a carreira quando foi a um bar para comprar um maço de cigarros. Vendo que um rapaz estava tocando seresta com um violão, ela pediu, então, para cantar. Luzinete sempre se valeu apenas de sua voz, dos fãs e dos CDs e DVDs pirateados para difundir seus trabalhos. Ademilson chama atenção para a estratégia artística da cantora que transformava os formatos estéticos das antigas serenatas para um padrão de seresta. Ao final das apresentações, tudo virava um grande baile, abrindo espaço até para o forró. “Mas o mais interessante era que ela agradava todos os públicos, desde crianças até adultos. Alguém poderia até não gostar dela, mas certamente a conhecia. Ela marcou um tempo na Grande João Pessoa”, defende o especialista, que lamenta que a cantora não tenha recebido o reconhecimento devido da crítica musical.

Luzinete até tentou fazer carreira na música além das divisas da Paraíba, indo morar aos 20 anos de idade no Rio de Janeiro, onde trabalhava de babá para poder se sustentar. Depois que os patrões dela terem conseguido contatos para que ela se apresentasse em programas de televisão, uma amiga chegou a mentir que a mãe de Luzinete havia morrido, fazendo a artista regressar ao estado antes de ter tentado sua chance de sucesso. Mas o estilo dela agradava os conterrâneos, e isso já satisfazia a cantora. “Ela fazia esse estilo meio brega para um público majoritariamente de homens, mais machista, mas também havia muitas mulheres que a acompanhavam”.

Luzinete tinha por hábito beber cerveja ou run durante as apresentações, e isso acabou marcando sua vida, mesmo que ela não ficasse visivelmente embriagada. “O álcool prejudicou a sua carreira. Muitos comerciantes que contratavam os shows de Luzinete diziam, quando ela por qualquer motivo faltava ou pedia para adiar um compromisso, diziam que era por causa da bebida. Por isso que, nos últimos 10 anos, ela passou a cantar de ‘cara lisa’, como ela dizia”. Hoje, em qualquer boteco ou esquina da cidade, é dia de ouvir e homenagear a “Rainha da Seresta”. “Ela é uma pessoa que, não apenas pela voz, pelo cantar, mas pela espontaneidade - porque ela batia papo nos shows, dava gosto vê-la cantando em João Pessoa. É uma pena a morte da nossa amiga Luzinete. Que Deus a tenha”, conclui Ademilson José.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 25 de novembro de 2022.