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Amor, realidade e amizade

publicado: 29/10/2025 08h50, última modificação: 29/10/2025 12h24
Programação de filmes nacionais em cartaz no Cine Banguê tem clássico restaurado, documentário premiado e filme jovem que se passa nos anos 1990
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A camaradagem entre o escritor Jorge Amado, o pintor Carybé e o músico Dorival Caymmi é o tema de “3 Obás de Xangô” | Foto: Divulgação/Guillane

por Esmejoano Lincol*

Com sua reabertura, na sexta-feira passada, o Cine Bangüê do Espaço Cultural, em João Pessoa, tem seis filmes nacionais em cartaz. Destes, quatro são novidade: os clássicos relançados Iracema, uma Transa Amazônica (1976) e Carlota Joaquina, Princeza do Brasil (1995) e as estreias 3 Obás de Xangô (2025) e O Último Episódio (2025). A bilheteria presencial do Bangüê (no bairro de Tambauzinho) abre uma hora antes de cada sessão. Os ingressos custam R$ 5 (meia) e R$ 10 (inteira). Iracema  e 3 Obás de Xangô têm exibição hoje (às 16h e às 20h, respectivamente). O Último Episódio tem sessão amanhã (às 18h).

Iracema, uma Transa Amazônica (como Carlota Joaquina, que foi tema de matéria de A União na edição de domingo) será exibido numa versão restaurada em 4K, lançada no ano passado. O filme foi encomendado por uma TV alemã e foi conduzido de forma semidocumental pelos diretores Jorge Bodanzky, paulista, e Orlando Senna, baiano. 

Edna de Cássia abre o olhos do público para os problemas da Amazônia em “Iracema” | Foto: Divulgação/Guillane

Como o título antecipa, os realizadores ambientaram sua narrativa às margens da rodovia Transamazônica, que tem início na Paraíba e termina no estado do Amazonas. O impacto ambiental e social da construção da estrada é tema.

A protagonista (Edna de Cássia) é uma adolescente nortista que passa a se prostituir. Até conhecer o caminhoneiro Tião (Paulo César Pereio). O encontro é promissor, a princípio, mas a simpatia é dissipada quando o homem se cansa da moça e a deixa num cabaré, à beira da estrada.

O tempo se passa e a dupla reencontra-se. Enquanto Tião está em melhor condição financeira, a ponto de comprar um novo veículo, Iracema está perdida na dura realidade em que vive. Censurado pela Ditadura, estreou oficialmente no Brasil apenas em 1981, em meio à abertura política, e depois de já ter sido lançado na Europa.

O Último Episódio, do mineiro Maurílio Martins, propõe um mergulho na cultura pop dos anos 1980 e 1990 e numa das maiores lendas desse período. Nos anos 1990, o garoto Erik (Matheus Sampaio) cria uma mentira na tentativa de conquistar uma colega: ele teria a fita com o último episódio de Caverna do Dragão, desenho de sucesso na TV brasileira e que, na realidade, nunca teve um desfecho oficial. Disposto a levar o plano adiante, ele contará com a ajuda dos amigos Cássio (Daniel Victor) e Cristiane (Tatiana Costa).

A direção de arte de O Último Episódio é assinada por Mariana Souto e remonta o início da década retratada: além dos figurinos, do cabelo e da maquiagem, itens como discos de vinil e um tratamento a certas sequências, rodadas de forma semelhante ao das gravações em VHS.

Em “O Último Episódio”, garoto quer impressionar a colega e mente que tem uma fita com o final de “Caverna do Dragão” | Foto: Divulgação/Embaúba

A trilha sonora original é assinada por John Ulhoa e Richard Neves, do Pato Fu. A vocalista da banda, Fernanda Takai, interpreta, a propósito, um cover da canção “Qualquer jeito”, sucesso de Kátia no fim dos anos 1990. A trilha deve ser lançada em vinil.

Por fim, 3 Obás de Xangô retrata a amizade e a contribuição seminal de três figuras importantes para a cultura brasileira, bem como suas intersecções com as religiões de matriz africana: Dorival Caymmi e Jorge Amado e o argentino Carybé, pintor que viveu por décadas em nosso país. Com uma extensa coletânea de imagens, muitas delas raras, o documentário investiga como a identidade baiana foi forjada e difundida no Brasil e no mundo por meio da produção literária, musical e visual do trio.

Em entrevista exclusiva para A União, o realizador Sérgio Machado, também baiano, revela que apesar da amizade, há poucos registros públicos dos três, em fotos ou vídeos, apesar das colaborações múltiplas entre eles. A pesquisa também trouxe à tona informações surpreendentes sobre a obra de Amado, Caymmi e Carybé.

“Aquela música ‘Minha jangada vai sair pro mar’, parceria de Amado e Caymmi, foi traduzida para o russo e virou um grande sucesso na União Soviética. Curiosamente, é uma das favoritas do Vladimir Putin, em ritmo de marcha”, informa.

O diretor sustenta que apesar de terem falecido há algum tempo — Carybé, em 1997; Amado em 2001; e Caymmi, em 2008 — o legado do trio permanece vivo mesmo entre as gerações que não puderam testemunhar sua produção em vida. “As famílias ficaram muito contentes com o resultado. Recentemente, teve até uma sessão à beira-mar, para três mil pessoas. O que pegou muitas pessoas é a força dessa amizade desinteressada deles num período de tanta desilusão, de competição. O diretor Walter Salles falou isso quando saiu do filme: nós somos bombardeados por uma torrente de afeto”, conclui.  Os outros dois filmes brasileiros, que já estavam em cartaz no Bangüê antes do cinema ficar algumas semanas com programação suspensa, são O Último Azul (próxima sessão: amanhã, 16h) e Dormir de Olhos Abertos (próxima sessão: sexta, 20h). O cinema ainda não divulgou sua programação a partir de 1o de novembro.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 29 de outubro de 2025.