por Joel Cavalcanti*
A técnica mais inovadora e criativa do trabalho do desenhista, pintor e escultor paraibano Wilson Figueiredo surgiu através de uma grande dose do acaso. Recém-aposentado da antiga Saelpa – como era denominada a empresa de distribuição de energia elétrica do Estado –, ele procurava algo para trabalhar nas artes plásticas que o distinguisse de tudo que já havia visto: vislumbrou no desenho com o fio de metal essa possibilidade. “Trabalhei a cena no arame e a proposta era colocá-la diretamente na parede. Era noite, por volta das 19h, quando eu fui pendura-lá, surgiu uma sombra ao aproximar e foi quando surgiu toda a ideia. Daí em diante, tudo partiu desse momento”, relembra o artista, que abre hoje a exposição Vínculos da Memória com a técnica desenvolvida por ele desde 2006.
São 20 peças que estarão dispostas no Museu do Artesanato Paraibano Janete Costa, localizado em frente da Praça da Independência, no bairro de Tambiá, em João Pessoa, a partir das 10h de hoje até o mês de março de 2022. As visitas podem ser realizadas gratuitamente de terça à domingo, das 9h às 17h. Na coleção estará destacada a criatividade do artista com o arame sobre uma tela em acrílico. Nela, o fio metálico fica afastado de sua base por uma distância de três centímetros, o que confere à obra um sombreado natural causado pela incidência da luz, criando uma sensação de tridimensionalidade.
Para dar um grau de dificuldade maior, as peças metálicas não passam por um processo de soldagem. “Costuradas” parte por parte, as emendadas são realizadas com o próprio arame. Esse aspecto imprime ao trabalho do artista uma leveza e movimento característicos. O efeito pretendido por Wilson depende da projeção da sombra, mas a luz natural mais difusa em ambientes amplos costuma garantir a apreciação ideal aos visitantes da exposição. “Isso me deu muita ousadia ao criar essa técnica e teve a aprovação desde quando expus pela primeira vez”, aponta Figueiredo, cuja aprovação atravessou o oceano e fez dele um mestre ao receber o título de ‘Chevalier Académicien’, da Mondial Art Academia da França, em 2015.
O nome Vínculos da Memória tem relação com os temas retratados por ele em suas telas. Uma mulher que vende milho assado na esquina, uma outra que colhe algodão na zona rural, ou um rabequeiro que reúne ao redor de si os dançantes de folguedo. “Eu valorizo muito a mulher brava no seu dia a dia, seja no trabalho, na maternidade ou no romantismo”, descreve ele. “Todo o meu trabalho é focado no Sertão, na região sertaneja, nas minhas origens. Vínculos da Memória foca no meu cotidiano na infância, o que eu via nos adultos na época: no lazer, na dança, no trabalho e no circo”, complementa Wilson, que é natural de Patos (PB), e está radicado em João Pessoa desde 1973.
O sol causticante de sua terra natal também está representado em suas obras. No processo de criação do artista, a definição das cores vem primeiro. Existe uma predominância no trabalho de Wilson por tons entre o amarelo, o laranja e o vermelho. A saturação remete mais uma vez ao interior paraibano. “Isso justifica a região de por do sol do Sertão. Todos os meus quadros focam nesse fundo forte, de luz quente”.
Além das telas em acrílico com desenhos em arame, a exposição vai contar ainda com outro tipo de trabalho desenvolvido por Wilson Figueiredo. Uma escultura de grandes proporções formada por sucatas de chapas de ferro e parafusos será instalada nos jardins do Museu do Artesanato. A obra somada a uma série de maquetes de outros trabalhos conhecidos do artista, por quem costuma circular por diversos bairros e prédios públicos de João Pessoa, é uma lembrança de outra área bastante explorada por ele.
“Isso fará uma alusão ao meu trabalho em geral para as pessoas associarem a minha arte, que se diversifica nesse sentido”, explica Wilson, que começou a criar esculturas com essas características em 2009 com a confecção de O cavaleiro alado, peça disposta em um girador viário localizado nas imediações da UFPB, próximo a entrada do bairro dos Bancários. Depois desta, já vieram O bem do mar, disposta em frente à sede da PBTur, Flor de cactos, na orla de Cabo Branco, e O legionário, na Praça Alcides Carneiro, em Manaíra, dentre outros.
Wilson Figueiredo, hoje com 72 anos, é um homem franzino. As suas esculturas costumam medir mais de três metros de altura. As partes que formam suas obras são pesadas e de difícil manipulação. Mesmo o arame não costuma se dobrar com facilidade às formas imaginadas por seu criador. “A dificuldade vem junto com o amor desde que eu iniciei. No começo, eu me furava bastante e isso me incomodou. Mas, com o tempo, a manutenção atenta ao uso dos alicates eu passei a nem tocar mais no arame com os meus dedos”, conta ele. “Acho que as coisas acontecem quando têm de acontecer”, finaliza o artista.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 03 de dezembro de 2021