Foi a mãe de Suzy Lopes quem percebeu a inclinação da filha para a atuação antes mesmo que a própria artista pudesse se reconhecer assim: ela matriculou a cajazeirense num curso de teatro, em João Pessoa, em meados dos anos 1990. “Mas na primeira semana, eu entendi o que ela queria dizer com ‘você tem jeito para essas coisas’”, ela recorda. A paixão pelo drama surgiu “com o bonde andando”, mas seu encantamento pelo cinema é anterior, como revela a seguir. Hoje, Suzy e a colega Lucy Alves ganham uma homenagem durante o Fest Aruanda, na capital: elas participam de um debate, às 11h, no Hotel Aram, em Tambaú, e recebem o Troféu Aruanda na cerimônia de encerramento do festival, às 19h30, no Cinépolis do Manaíra Shopping (veja a programação completa de hoje no quadro abaixo).
Suzy destaca que pela falta de acesso ao teatro, nas primeiras décadas de vida, não se via nos palcos, mas já sentia admiração pelos futuros companheiros de profissão, quando os via nas novelas e nos filmes. O ingresso nas aulas de teatro no Espaço Cultural precipitou o seu destino. “Roberto Cartaxo, que era meu professor na Funesc, levou a turma para assistir Vau da Sarapalha, do greupo Piollín. Eu amei a peça e falei para mim mesma que um dia trabalharia com eles. Isso aconteceu em 2010, quando protagonizei o espetáculo Retábulo, de Luiz Carlos Vasconcelos”, rememora.
O convite para o seu primeiro filme surgiu em 2000: um papel pequeno em A Sintomática Narrativa de Constantino, curta do paraibano Carlos Dowling. Ela interpreta a funcionária de um supermercado. “A personagem que eu fiz era para ser interpretada por um homem, mas Carlinhos gostou tanto do meu teste que resolveu me colocar naquele papel. Eu amei aquela experiência e fiquei querendo fazer mais”, recorda.
Suzy soma ao todo 16 curtas e 13 longas--metragens. Mas dentre todos esses trabalhos, ela guarda carinho especial pela paciente Eliclaustenes, seu papel no filme Era uma Vez Eu, Verônica, do pernambucano Marcelo Gomes, lançado em 2012.
“Foi meu primeiro longa, uma experiência que me fisgou. Mexeu muito comigo. Foram muitos ensaios e um laboratório fortíssimo visitando clínicas públicas de Recife, de forma que a cena que fiz (sendo atendida por Verônica, papel de Hermila Guedes) ficou muito intensa, e até hoje é uma das minhas preferidas”, pontua.
- Entrada franca
- Hotel Aram (R. Nossa Sra. dos Navegantes, 431, Tambaú, João Pessoa)
- Cinépolis Manaíra (Manaíra Shopping, Av. Gov. Flávio Ribeiro Coutinho, 220, Lot. Oceania II, João Pessoa)
Lucy: da música às novelas
Se há quem acredite que crianças são trazidas ao mundo por cegonhas ou repolhos, é possível imaginar que a paraibana Lucy Alves é fruto de sanfona resfolegada após três batidas do cajado de Moliére... Mulher de sete instrumentos e de muitos talentos, Lucy é mais que artista multitudinária. Na música e em diversas produções audiovisuais, ela já deu provas de suas plurais qualificações. Não à toa, está sendo homenageada no Fest Aruanda.
A estudante de violino (ex-violinista da Orquestra Sinfônica Infantil da Paraíba e da Camerata Izabel Burity) aprendeu a tocar muitos outros instrumentos e se tornaria cantora. E a cantora se tornaria atriz, com estreia na TV, em 2016, na novela Velho Chico, e ainda em Tempo de Amar (2017), Amor de Mãe (2020), Travessia (2022, da qual foi protagonista) e Renascer (2024). Lucy se tornaria sempre algo mais, sem deixar de ser aquilo que ela sempre foi... Mas quando teremos Lucy Alves nas telas dos cinemas?
“Como artista plural, enxergo no cinema uma plataforma não apenas de expressão, mas de conexão— onde podemos compartilhar nossas verdades e, ao mesmo tempo, nos transformarmos a cada papel. Espero muito em breve estrear na telona. É um sonho dentro da minha carreira”, afirma.
Além das novelas, ela atuou para o streaming em Só Se For por Amor (2022), da Netflix. “Atuar para mim é um grande prazer e uma linda possibilidade de fazer arte. De passear por diversos sentimentos, quando damos vida aos personagens. É uma forma de sentir coisas que desconhecemos ser capazes”, conta. “Eu acho que a TV aberta no nosso país ainda tem um grande poder de disseminação para um grande público que ainda está se ‘achegando’ no streaming”.
A música veio antes, mas como instrumentista. “O instrumento da voz veio depois... Meu pai me convenceu que eu cantava bem. Sempre preferi tocar um instrumento. Mas hoje sigo me encantando com o poder de minha voz”, aponta. “Cantar é diferente… É nossa identidade mais intrínseca, inerente… É onde sou mais forte. A atriz surgiu na minha vida. De presente. De paraquedas. Fazendo expurgar vários sentimentos… Aí, não larguei mais”.
Seriam Lucy Alves e Lucyane Pereira Alves muito parecidas ou muito diferentes? “Lucy Alves é minha persona artística”, responde. “Ela supostamente dá mais as caras que Lucyane Pereira Alves, que é mais introspectiva desde sempre. Lucy Alves veio para ajudar a Lucyane a seguir se descobrindo, se ouvindo através de sua ancestralidade que segue guiando, ousando e transcendendo através da arte. Mas são próximas. Não são tão descoladas uma da outra assim”.
Seu próximo passo é na música. “Tem álbum novo a caminho. Ainda este mês estará disponível”, revela. “Fazer música tem sido essencial para a caminhada e álbuns são espécie de diários musicais de cada fase de minha vida”.
De lá para cá, outros títulos se destacam na filmografia de Suzy, na opinião da própria: Luciene, de Bacurau (Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, 2019); Alice, de Fim de Festa (Hilton Lacerda, 2019); a mãe de Atrito (curta de Diego Lima, 2017); e Andrea, de A Ética das Hienas (curta de Rodolpho de Barros, 2019).
“Tenho muito carinho por todas elas e seus processos, mas cito esses por terem sido personagens que mexeram muito comigo enquanto as criava e que mudaram coisas dentro da ‘minha casa’ de atuação”, afirma.
A projeção nacional chegou com a TV: além de uma participação na novela Quanto Mais Vida, Melhor!, contracenando com o amigo Thadelly Lima, ela deu vida a Cira, a fofoqueira das cidades de Canta Pedra e Lapão da Beirada: personagem originalmente de Mar do Sertão e que voltou em No Rancho Fundo.
Todavia, o cinema continua lhe fornecendo alguns de seus melhores espaços no audiovisual. “Sou frequentadora do Aruanda, sempre estive na plateia e, em muitas edições, também estive na sua tela. O festival me dá um presente gigante. Estou vendo a homenagem como um abraço de casa, um reconhecimento ao meu trabalho”, conclui.
PROGRAMAÇÃO/ HOJE
9h – Debate: diretores dos curtas-metragens exibidos na terça [Hotel Aram]
10h – Debate: diretores dos longas-metragens exibidos na terça [Hotel Aram]
10h30 – Sessão com acessibilidade: Filme a ser divulgado [Cinépolis Manaíra 9]
11h – Painel: Homenagens às atrizes Suzy Lopes e Lucy Alves [Hotel Aram]
14h – Panorama do cinema negro paraibano: 8 curtas [Cinépolis Manaíra 9]
16h – Avant-premiere: Oeste Outra Vez, de Erico Rassi, com debate com o ator Daniel Porpino após a sessão (2024, 1h37, 16 anos) [Cinépolis Manaíra 9]
19h30 – Cerimônia de encerramento:
Homenagens às atrizes Suzy Lopes e Lucy Alves; curta Atrito, de Diego Lima (2017, 18 min, 16 anos);
longa Alma Negra - Do Quilombo ao Baile, de Flávio Frederico (2024, 1h45, 14 anos) [Cinépolis Manaíra 9]
21h30 – Cerimônia de premiação [Cinépolis Manaíra 9]
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 11 de dezembro de 2024.