Notícias

literatura

Augusto sempre presente

publicado: 17/04/2024 09h26, última modificação: 17/04/2024 09h26
O aniversário de 140 anos do poeta paraibano mais celebrado é lembrado em evento que começa hoje, em Sapé
Recorte-para-a-capa-Cultura.jpg

‘É um poeta vivo porque poeta vivo é aquele que é lido, admirado e amado’, diz Hildeberto Barbosa Filho sobre Augusto dos Anjos | Imagem: Reprodução

por Sheila Raposo*

No dia 20 de abril de 1884, quando o massapê do Engenho Pau d’Arco recebia as últimas mudas de cana-de-açúcar do plantio anual, dona Córdula sentiu a derradeira e mais forte contração, até que ouviu o choro estridente de um bebê irrompendo o silêncio ansioso da espera. A lua em quarto minguante não fazia clarão, mas o rosto do seu marido, Alexandre Rodrigues dos Anjos, iluminou-se: nascia mais um rebento seu.

Cento e quarenta anos depois, o nome daquela criança ainda ecoa em saraus, escolas, cadernos de cultura, concursos de poesia e incalculáveis produções acadêmicas e literárias Brasil afora: Augusto dos Anjos, o paraibano do século 20. “A poesia dele é abundante, em todos os sentidos. Quando se fala sobre ela, muito há para ser dito”, destacou a professora Neide Medeiros, escritora e pesquisadora da obra do poeta.

Autor de Eu, único documento literário que deixou ao mundo, Augusto dos Anjos ocupa um lugar de prestígio no panteão de poetas da língua portuguesa. Para o crítico literário e poeta Hildeberto Barbosa Filho, isso acontece porque a poesia dele é viva, não tem prazo de validade, é lida pela crítica e pelo povo. “Ele é o único poeta vivo da Paraíba, porque poeta vivo é aquele que é lido, admirado e amado”, disse.

Pelas inovações temáticas e de estilo, o autor quebrou barreiras. O professor Sérgio de Castro Pinto, outro poeta que admira o autor de “Versos íntimos”, disse que não é possível engavetá-lo em um movimento literário, pois ele estava à frente da sua época. “Quando Augusto comparou a lua a um paralelepípedo quebrado foi como se jogasse uma pedra no bom comportamento do parnasianismo”, ressaltou.

Não por acaso, um dos poemas que Castro Pinto fez para Augusto dos Anjos, intitulado “a lua de augusto”, é sobre esse tema: “a lua de augusto / é uma lua nova. / uma lua cheia / de modernidade. / a lua de augusto / é uma pedrada...”

Na cidade natal

Para marcar os 140 anos de nascimento de Augusto dos Anjos, a Prefeitura de Sapé, município onde se localizava o antigo Engenho Pau d’Arco (hoje Usina Santa Helena), realiza uma série de eventos alusivos ao aniversário do filho ilustre. A celebração começa às 19h de hoje, no Pavilhão Central da Praça Joaquim Simões, com apresentação de Elias Santos, que cantará Augusto, e declamações de estudantes das escolas municipais, estaduais e privadas da cidade.

Amanhã, na Praça João Pessoa, também às 19h, acontecerá um sarau com poesias de cordel, uma performance do professor Jailson Cândido com os alunos da EJA (EMEF Alfredo Coutinho) e uma apresentação da professora e poetisa Lúcia Freitas. Na sexta-feira, no prédio da ETN, haverá uma oficina de xilogravura, com Leonardo Leal, para alunos do Ensino Médio, a partir das 8h. No mesmo dia, às 19h, na Loja Maçônica Casa Rio Branco, diplomação na Academia Sapeense de Letras, Artes e Cultura (Aslac) e apresentações de Ocimar Santana e Matheus Mouzinho.

Por fim, no sábado, dia de nascimento do poeta, a programação será no Memorial Augusto dos Anjos, a partir das 8h, com execução do Hino Nacional, declamações os poetas sapeenses Gabriel Barbosa e Larte Batista, feira de artesanto e palestra da professora Rosilma Diniz Araújo Bühler (UFPB). Às 13h30, apresentação teatral em homenagem à ama de leite de Augusto, Guilhermina, e apresentações de Edno de Luna e banda, do cantor lírico Kleiton D’Araújo, do músico Chico Viola e da Banda Santa Cecília.

Para conhecer Augusto

Entronizado no cânone da literatura brasileira, Augusto dos Anjos é considerado um poeta completo. “Em seus poemas, ele tratou de temas universais de forma lírica, épica e dramática. É um poeta inusitado, sui generis, originalíssimo”, ressaltou a professora Neide Medeiros.

A pedido do jornal, ela fez uma relação de obras significativas para se aprofundar na obra do ocupante da cadeira n.º 1 da Academia Paraibana de Letras (APL):

Poesia e Vida de Augusto dos Anjos, de Raimundo Magalhães Jr. (Ed. Civilização Brasileira). Oferece um panorama da vida e da poesia de Augusto dos Anjos, em linguagem clara, concisa e sem subterfúgios.

Augusto dos Anjos - Obra Completa, de Alexei Bueno (Ed. Nova Aguilar). Reúne poemas, correspondências, ensaios. O leitor encontra toda a poesia de Augusto, poemas esquecidos, versos de circunstância, prosa dispersa e correspondência.

Augusto dos Anjos e Sua Época, de Humberto Nóbrega (Ed. Universitária). Traz o poeta Augusto dos Anjos na juventude, galanteador, jocoso, alegre e brincalhão. A segunda edição deste livro foi revista, ampliada e atualizada.

Ilustração de Lelo Alves para ‘Vida e Poesia de Augusto dos Anjos - Para Crianças, Jovens e Adultos’, que tem texto de Juca Pontes: obra para introduzir pequenos leitores no universo do poeta paraibano | Foto: Reprodução

Conversando sobre Augusto dos Anjos: uma História Oral, organizado por Maria do Socorro Silva de Aragão, Neide Medeiros Santos e Ana Isabel de Souza Leão Andrade (FIC/SEC/Ideia). Contém 33 entrevistas, sendo cinco com familiares do poeta e 28 com estudiosos da sua obra. Fruto da pesquisa “Redescobrindo as trilhas de Augusto dos Anjos”. Dos seis livros publicados por esse projeto, esse é o mais importante.

O Evangelho da Podridão - Culpa e Melancolia em Augusto dos Anjos, de Chico Viana (Ed. Universitária/UFPB). Tese de doutorado do professor Chico Viana, que orientou várias teses de doutorado sobre Augusto dos Anjos na UFPB e se tornou um especialista no poeta.

Augusto dos Anjos – A Saga de um Poeta, organizado por Juca Pontes e Murilo Melo Filho (Ed. Brasileira). Livro de ensaios que prima pela beleza gráfica e leveza dos ensaios. A edição recebeu o patrocínio do Governo da Paraíba.

Augusto dos Anjos ou Vida e Morte Severina, de Ferreira Gullar (Ed. Paz e Terra), Longo ensaio em que ele junta Augusto e João Cabral de Melo Neto na mesma vida e morte nordestina e faz o leitor caminhar pelas ruas e pontes do Recife sob “o fósforo alvo das estrelas”.

Adicionamos a esta lista duas obras para os pequenos leitores: Augusto dos Anjos em Quadrinhos, com roteiro de Jairo Cézar e ilustrações de Luyse Costa (editora Patmos), e Vida e Poesia de Augusto dos Anjos - Para Crianças, Jovens e Adultos, outra biografia em quadrinhos, com texto de Juca Pontes e desenhos de Lelo Alves (MVC Editora).

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 17 de março de 2024.