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Autores da Paraíba criticam mudanças no Prêmio Jabuti

publicado: 20/06/2018 00h05, última modificação: 20/06/2018 07h41
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A escritora Maria Valéria Rezende - que já conquistou o Prêmio Jabuti por cinco vezes, não aprovou as mudanças - Foto: Divulgação

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Jãmarrí Nogueira

Os conflitos envolvendo mudanças no Prêmio Jabuti permanecem vivos e fortes. As críticas feitas às alterações nas regras e também o embate em que há acusação de homofobia levaram o curador do principal prêmio literário brasileiro a renunciar. Luiz Armando Bagolin, professor da USP, caiu, mas a polêmica está de pé...

A queda teve início após Bagolin reduzir de 29 para 18 as categorias da premiação e eliminar o segundo e o terceiro lugares de cada categoria. Houve ampliação de valor dos prêmios: o vencedor de uma categoria fica com R$ 5 mil. Já o ganhador do Livro do Ano, R$ 100 mil. Cerimônia de entrega será dia 8 de novembro.

As mudanças no Jabuti não param por aí. Além da redução do número de categorias, outras foram suprimidas e fundidas. Não há mais a categoria ‘livro-reportagem’. As categorias ‘Infantil’ e ‘Juvenil’, por exemplo, agora são uma só. Também houve deslocamento da categoria de ‘Ilustração’ para área técnica da premiação.

O bicho pegou mesmo quando o então curador Bagolin entrou em uma batalha dialética com Volnei Cônica (especialista em literatura infantil). Bagolin sugeriu que Cônica defendia “principalmente” o companheiro, o ilustrador Roger Mello, vencedor do Prêmio Hans Christian Andersen em 2014, “seu amor”, porque era Dia dos Namorados.

O texto de Bagolin, mandando beijos para ambos (Cônica e Mello), viralizou no meio literário e foi considerado por muitos, nas redes sociais, homofóbico. Resultado: Bagolin pediu demissão através de carta enviada à Câmara Brasileira do Livro (CBL), queixando-se por não ter ‘liberdade de pensamento’ e ‘autonomia’.

Vencedora de cinco estatuetas do Jabuti, a escritora Maria Valéria Rezende (radicada na Paraíba) criticou as mudanças adotadas pelo Prêmio. “Juntaram as categorias e puseram a ilustração do livro infantil como algo mais genérico, quando na verdade não tem sentido nenhum”, disse Maria Valéria.

Ela argumentou que a ilustração no livro infantil, por exemplo, representa uma outra versão do livro. “Dialoga com o texto. Criança muito pequena lê as imagens antes de ler as letras. A ilustração do livro infantil é uma outra escrita. Um homem, mesmo que não saiba ler, não entra no banheiro feminino...”, comentou a escritora.

Maria Valéria destacou que a A Associação de Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil já emitiu uma nota contrária às mudanças. “Tanto que o Bagolin renunciou. Ele foi de uma grosseria e de um preconceito ridículo. Foi ignorância. É não compreender nada sobre a escrita”, finalizou ela, que tem duas estatuetas na categoria Romance, uma de Livro Infantil, uma Livro de Infantojuvenil e uma de Livro do Ano.

Maria Valéria estreou na literatura em 2001, com o livro ‘Vasto Mundo’. Ganhou o Prêmio Jabuti de 2009 na categoria literatura infantil com ‘No risco do caracol’. Em 2013, categoria juvenil, com ‘Ouro dentro da cabeça’. Em 2015, nas categorias romance e Livro do Ano de Ficção, com ‘Quarenta dias’.

Em janeiro do ano passado, Maria Valéria recebeu o Prêmio Casa de las Américas pelo livro ‘Outros cantos’. A mesma publicação, e, pelo mesmo romance, ganhou o Prêmio São Paulo de Literatura e o terceiro lugar no Prêmio Jabuti em novembro de 2017.

De que vale o prêmio Jabuti?

O jornalista, poeta e escritor paraibano Linaldo Guedes dá de ombros para o Prêmio Jabuti e critica a criação da ideia de que é preciso vencer um prêmio literário. “O Jabuti virou uma indústria no Brasil. Tem quem escreva só pensando em concursos literários. Isso é patético! Virou paranoia. Para mim tanto faz existir [o Jabuti] como não existir”.

Linaldo é autor de ‘Metáforas para um duelo no Sertão’, ‘Os zumbis também escutam blues e outros poemas’ e ‘Intervalo lírico’. Recentemente, lançou “O Nirvana do EU: Os diálogos entre a poesia de Augusto dos Anjos e a doutrina budista”. Livro é resultado de sua dissertação de mestrado na UFPB.

O poeta e escritor paraibano André Ricardo Aguiar também não tem bons olhos para as mudanças anunciadas no Prêmio Jabuti. Ele fica ainda mais preocupado com a junção das categorias Infantil e Juvenil. “A natureza de cada um depende muito do projeto. E o modo de juntar os dois para uma só avaliação é um modo apressado de classificação. Empobrece”.

Autor do livro infantil ‘Chá de sumiço’, André Ricardo Aguiar também afirmou que o desprestígio do ilustrador “já existia um pouco” na premiação literária. “Reforçar isso é um erro visto que entende o ilustrador como coautor, com autonomia suficiente para criar o sentido visual do livro”, disse ele.

Para o escritor, o Jabuti é um prêmio de prestígio e importante para o mercado editorial. “Mas como todo prêmio, tem suas contradições e erros. Vamos considerar movimentos e lobbies também. Mas a literatura é muito mais que um ou mais prêmios”, finalizou André, autor de ‘Fábulas portáteis’, ‘A flor em construção’,  ’O rato que roeu o rei’ e ‘A idade das chuvas’.