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Banquinho & violão renovados

publicado: 25/06/2024 09h04, última modificação: 25/06/2024 09h04
O jovem violonista Will Santt é um novo nome da bossa nova fazendo sucesso no Brasil e no exterior
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Do sucesso cantando bossa nova no Instagram, Santt hoje apresenta músicas autorais em casas de prestígio no Brasil e no exterior | Foto: Douglas Shindy/ Divulgação

por Daniel Abath*

Ele começou a trilhar o próprio caminho como violonista aos 11 anos de idade, quando viu no YouTube “Águas de março”, cantada por Tom Jobim e Elis Regina. O vídeo o deixou tão fascinado que o fez estudar os principais compositores do estilo, tais como Vinícius de Moraes, Baden Powell e o próprio Tom. Dois anos depois, conheceu João Gilberto e assumiu para si a missão de resgatar a bossa nova com sua voz suave embalada por um virtuoso violão.

Emanuel Santos Souza, o Will Santt, viralizou no Instagram com uma interpretação de “O pato”, de João Gilberto. Will, que é paulistano e tem apenas 21 anos de idade, vem sendo objeto das mais positivas críticas por parte de especialistas da música, a exemplo de Roberto Menescal, para quem é impossível não associar a música de Will a de João. “O que eu faço é bossa nova. Talvez as pessoas caracterizem o que eu faço como algo novo, ‘a bossa novíssima’. Eu não me vejo dessa forma”, faz questão de ressaltar o compositor.

A recente turnê na Europa e o sucesso meteórico de Will nas redes sociais faz dele uma promessa frutífera da música popular para os próximos anos. Em conversa com o músico, é possível perceber tanto a seriedade profissional quanto a serenidade sensível, ingredientes essenciais à sua obra.

Ao Vivo no Blue Note SP
- De Will Santt.
- Disponível nas plataformas digitais

O caminho

Will é natural de Guaianases, na zona leste de São Paulo. Ele conta que em frente à casa onde morava havia uma igreja evangélica, frequentada por sua família. Por conta dos cultos musicados, ele e o irmão vieram a se apaixonar pela bateria. O pastor do local logo iria perceber que a oportunidade dada aos garotos para tocar o instrumento havia sido uma péssima ideia: os fiéis passaram a reclamar de muito barulho quando Will estava no comando das baquetas — alguns chegaram a se queixar de fortes dores de cabeça.

Toda aquela pressão fez com que Will deixasse a bateria a cargo do irmão, passando, com ímpeto mordaz, para as cordas, como lembra Will: “Eu aprendi violão só pra não tocar aquele instrumento, mas eu aprendi com raiva. Estipulei uma meta de aprender em um mês”. E aprendeu. Dentro de um mês, estava tocando bossa nova e, após dois meses de estudos, já tocava Bach, do alto dos seus 11 anos de idade.

Durante sua prodigiosa caminhada, afirma ter evoluído muito no violão a partir de Djavan, depois passando a conhecer a obra de João Gilberto. Com aprofundamento sempre crescente, tendo a calma como norte e o aprendizado como base, nunca quis pular etapas e aprender algo que estivesse acima das possibilidades para cada momento, traçando uma linha gradativa de evolução no violão.

O resultado não poderia ser outro; com um álbum autoral de estúdio — Meu Caminho — e uma gravação ao vivo desse mesmo álbum, Will já viaja pela Europa impressionando ao público em voz e violão.

Primeiros trabalhos

O cenário que se descortina, ao ouvir Meu Caminho ao Vivo no Blue Note SP, é o de uma sensível viagem ao passado da música popular brasileira. Diante de um mundo tão barulhento, as canções do álbum soam como um convite sutil à audição ativa das coisas do mundo.

Das faixas “Anil divinil” a “Lamento de Deus”, o canto de Will é quase um sussurro. “A gente tem que aprender a escutar mais. Eu aprendi escutando, e claro que João Gilberto teve uma participação nisso, porque eu percebi que dava para cantar baixo e cantar bonito”, reflete o artista.

A canção homônima ao álbum homenageia Caetano Veloso, outro grande nome da música popular brasileira, de quem Will retira imensas lições. A batida percussiva e sincopada do samba, uma marca indelével do estilo de Baden Powell, com a batida da mão direita no corpo do instrumento em escalas rápidas, salta aos ouvidos atentos às canções do trabalho de Will, a exemplo de “Amsterdã”, um samba espirituoso. Já a canção “Quando chover” impele à voz de Will graves extremos, porém versáteis, criando uma atmosfera triste e ao mesmo tempo terna, no melhor estilo bossa nova.

Seu álbum de estreia, gravado no estúdio de João Marcelo Bôscoli, foi retirado das plataformas para um trabalho de remasterização. “Está em processo de finalização nessa semana e, provavelmente, vai ser lançado em julho”, explicou Will.

Quanto à sua personalidade musical, Will destaca que nunca buscou um caminho de vulgaridade, como aquele que, segundo o artista, é trilhado pelas celebridades na grande mídia. “Não quero que as pessoas me vejam como uma celebridade da bossa nova, mas como um cara que encontrou um outro caminho para ser uma celebridade, buscando uma coisa que para muitos já é passado, já é defasado. Porque tem como ser celebridade, ser pop, sem ser vulgar, sem ser feio”.

Turnês na Europa e além

De 2023 para cá, o compositor já encarou duas turnês pela Europa e se apresentará, entre os dias 10 e 22 de julho, na Bulgária. Ele conta que no ano passado ainda não dedicava todo o repertório do show à bossa nova e percebeu que lá fora esse estilo era muito valorizado, o que o deixou ainda mais feliz.

Questionado sobre uma possível apresentação em João Pessoa, Will diz que já vem pensando em uma turnê pelo Nordeste — com João Pessoa em mente —, mas que não há data prevista. Nessa semana, ele entrou em estúdio para gravar sua versão de “O pato”, que deverá ser lançada em agosto e, para além disso, planeja gravar, também em agosto, um álbum em tributo aos cinco anos de falecimento de João Gilberto, com cinco canções autorais e mais cinco do repertório do mestre da bossa. Para finalizar o ano, pretende gravar ainda “Emaranhado”, seu novo single, e já guarda 22 canções autorais para o próximo álbum a ser lançado em 2025, quando completará 22 anos.

“As pessoas acham que eu já fiz parte do The Voice Brasil e ficam muito limitadas a ver os artistas crescerem daquele jeito: ou passa pelo The Voice Brasil, ou passa por um Canta Comigo, ou vai passar por um apadrinhamento. Eu sei onde eu vou chegar. Eu não preciso ter pressa e sei que no caminho que estou eu vou chegar aonde eu quero”, afirma o músico, sem qualquer soberba, ostentando, no entanto, uma autoconfiança digna de quem veio pra ficar e sabe muito bem o que faz.

Através do link, escute o álbum Ao Vivo no Blue Note SP

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 25 de junho de 2024.