Até o clarão cegante resultante de uma nuvem de cogumelo da bomba atômica – tema desenvolvido no que já chamam de “melhor filme de Christopher Nolan”: Oppenheimer – foi tingida de rosa-choque na “terra de ninguém” da internet. O termo “arrasa-quarteirão” (ou blockbuster) nunca coube tão bem entre os figurinos da boneca Barbie, um ícone (para o bem ou para o mal) da cultura pop (e do capitalismo) desde o pós-Guerra, quando foi criada no final da década de 1950, pela empresária norte-americana Ruth Handler (1916-2002), com inspiração em outra a boneca a Bild Lilli, de origem alemã, para fechar o ciclo bélico.
Na esteira do fenômeno, estreia nos cinemas paraibanos a partir de hoje Barbie, longa-metragem dirigido por Greta Gerwig, o que já indica que o filme não será (apenas) para vender brinquedos e cobiçar o seu bilhão de dólares nas bilheterias mundiais, como visto em outra “arma bélica” da Meca hollywoodiana do trauma pós-pandemia, o Top Gun – Maverick, do eterno galã Tom Cruise (que está em cartaz com seu sétimo Missão Impossível).
Porém, diferente de Maverick, a produção não está só. Para exercitar seus músculos – como o famoso cartaz do We Can Do It!, criado em plena Segunda Guerra Mundial para levantar o moral (e que atualmente foi convertido para ser um símbolo feminista de força) –, Barbie tem uma “queda de braço” direta com o supracitado Oppenheimer, que também estreia hoje no circuitão e seus 180 minutos de duração no ringue de cada sessão. Coincidência ou não, os estúdios Warner Bros. da Barbie são a “ex-casa” do diretor Christopher Nolan.
Em questões de marketing, Barbie ganha disparado, caindo como uma bomba em todos os lados, inclusive em cima da figura “apática” dentro e fora das telas do protagonista de Nolan, Cillian Murphy, que vive o físico teórico do título, um dos cabeças do Projeto Manhattan. Há semanas somos inundados por propagandas e memes espontâneos pelo mundo virtual. Desde a ferramenta de busca Google, tingindo de rosa toda a sua tela quando se pesquisa por “Barbie”, até o tradicional Teatro Santa Roza, localizado no Centro de João Pessoa, figurando na internet como “casa da Barbie” na Paraíba. Tudo é “barbierizado” em prol do longa.
Teor infantil?
Apesar de a sua base ser uma boneca, engana-se quem pensa que Barbie é “para crianças”, visto todos os seus trailers oficiais. A começar pela classificação indicativa do filme: 12 anos. Protagonizado pela Margot Robbie (a Arlequina da franquia Esquadrão Suicida), a atriz é uma das “Barbies” que vivem utopicamente na Barbielândia, um lugar onde não há guerras e as pessoas são tão leves que flutuam para seus carros e, assim como os moldes da boneca, tem seus “pés empinados” como bailarinas que atuam 24 horas por dia.
Um belo dia, ela começa a perceber que talvez sua vida é tão perfeita assim, caindo literalmente por terra tal crença e terminando por ser exilada do local paradisíaco, acompanhada por uma das versões do seu fiel e amado Ken (vivido por Ryan Gosling, do musical La La Land). Destino? O belicoso, duro e cruel “mundo real”.
Um dos trunfos do filme é a diretora norte-americana Greta Gerwig, cineasta indicada ao Oscar por Adoráveis Mulheres e Lady Bird, e que já atuou em filmes do seu atual marido, Noah Baumbach (aqui assinando como corroteirista), a exemplo de Frances Ha (2012). Os trailers apontam para algo a mais do que apenas o puro entretenimento, dando espaço também para outras camadas, inclusive as críticas e inclusivas (Issa Era, uma atriz negra, é a “Barbie presidente”).
O elenco ainda conta com a vencedora do Oscar, Helen Mirren (A Rainha), Kate McKinnon (Caça-Fantasmas), Simu Liu (Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis), Michael Cera (Scott Pilgrim vs. O Mundo) e o comediante Will Ferrell (Quase Irmãos).
Nas palavras do jornalista do Estadão, Simião Castro, que chegou a assistir uma prévia do longa a convite da Warner, o filme “não soa como um panfleto feminista. O longa exalta o poder das mulheres, sim, e não se limita a nenhuma discussão. Mas usa o deboche e o humor para atacar a temática, de forma esperta. Tudo contribui para o riso fácil”.
Ainda na análise de Simião Castro, o trecho exibido de Barbie para ele sinaliza “ser uma sátira à hegemonia masculina no mundo”, definiu o jornalista. “O roteiro cita nominalmente a – e tira sarro – da Mattel, criadora da boneca, tocando na ferida por mais de uma vez. Lembrando: isso só na primeira meia hora de filme”.
No final das contas, o mundo será cor-de-rosa para Barbie e “companhia” (no caso, a Mattel e Warner)? Só o tempo, logo ali adiante, dirá, após a poeira radioativa de Oppenheimer também baixar.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 20 de julho de 2023.