por Joel Cavalcanti*
Enquanto dava entrevista sobre o show gratuito que realiza hoje, às 20h, na Usina Cultural Energisa, em João Pessoa, a poeta, cantora e compositora paraibana Bixarte ainda estava em êxtase. É que algumas horas antes ela havia sido um dos destaques da apresentação do Women’s Music Event, a maior premiação de música para mulheres da América Latina, cantando ao lado da ativista indígena Kaê Guajajara. “Eu entrei em um lugar que ainda não tinha entrado na minha carreira, que é de realização muito mais que profissional. Sempre sonhei em fazer uma performance em uma premiação”, conta a artista, que se prepara para lançar em breve um álbum inédito que marcará sua nova linguagem estética, e para estrear como atriz em uma série da Rede Globo.
Nos bastidores do evento em São Paulo, Bixarte pode ampliar ainda mais sua rede de ligações artísticas e políticas que vem se aprofundando desde que ela precisou se mudar para o Sudeste do país. Entre tietagens com Gaby Amarantos e Karol Conká, ela teve a oportunidade de falar com a futura ministra da Cultura, Margareth Menezes. “Nós tivemos uma conversa muito promissora e ela me falou algo que me deixou muito emocionada: ‘Esse é um sinal que nosso povo está reencontrando o quilombo’”, teria dito para ela a cantora baiana sobre a oportunidade de uma mulher negra assumir o ministério que volta a existir com essa denominação dentro da administração federal.
Enquanto preparava a bagagem, Bixarte anuncia que vai trazer para João Pessoa um show que reunirá várias fases de sua trajetória artística, além de novos e antigos parceiros na música. A grande surpresa será a presença da cantora, compositora, multi-instrumentista e ativista Bia Ferreira, que estará pela primeira vez em na capital paraibana. Elas cantarão juntas a música ‘Doutrinação’, presente no álbum Faminta, da artista mineira, que também deve apresentar canções exclusivas de seu repertório. O Palco Música funcionará para a artista natural de Santa Rita como uma grande confraternização de final de ano, juntando além das duas artistas no mesmo palco, nomes como Big Jesi, Fúria Negra, Jader Finamore, Mari Santana, Lau Capym, Lucan Dan, Aiyra, Pedro Rolim, Gabrunca e Kauã Castro.
Época propícia para fazer balanços de como foi o ano, Bixarte tem muito que comemorar. O ano de 2022 foi de muito trabalho e marcou uma significativa transição musical. Ela tirou o nome MC de sua assinatura artística e o rap abriu espaço para assumir uma linguagem mais pop. “No início, eu fiquei com medo de as pessoas pensarem que não fosse cantar o que eu já canto. Mas eu quis mostrar que, por ser uma artista paraibana, a gente é muito versátil. Conseguimos cantar música de axé, rap e pop, fazendo uma ‘farofona’.” Maior símbolo dessa mudança, a música ‘Bibi Perigosa’ foi lançada com sucesso no mês passado em formato de single, que antecipa o álbum Traviarcado, patrocinado pela Natura com previsão de sair até o próximo mês de março, depois de dois anos em produção. “‘Bibi Perigosa’ fala sobre a liberdade da mulher, de ela estar em qualquer lugar. E é isso que eu trago em uma versão mais sensual e sexy”, afirma ela sobre a música que tem videoclipe gravado no Centro Histórico de João Pessoa.
Para os fãs que acompanham a artista desde o começo, quando ela venceu o 3º Festival de Música da Paraíba ou quando passou a disputar concursos de poesia falada – da qual ela foi bicampeã do slam estadual e finalista do slam Brasil –, Bixarte promete não decepcionar. O show deve começar com as músicas de axé, como as que estão presentes nos singles ‘Oxum’ e ‘Àrólé’, que tratam diretamente da religiosidade da artista, que não dissocia isso do que se costuma identificar como sendo o espírito natalino cristão. “No Natal, a gente fala sobre vida e nascimento. Nada mais justo que falar sobre nascimento de corpos dissidentes, numa era em que, pelo décimo quinto ano consecutivo, o Brasil é o país que mais mata travestis. Vai ser muito significativo esse show, de fato arrebatador”, antecipa Bixarte, que deve depois entrar no tema de músicas de amor e também do trap.
Final de ano também é um tempo de resoluções, e 2023 deve projetar também a carreira de atriz de Bianca Manicongo, que cada vez que volta à Paraíba está em novos patamares de influência nacional. Ela é uma das novidades da terceira temporada da série da Rede Globo, Cine Holliúdy, prevista para estrear no primeiro semestre. Sucesso de crítica com ótimos resultados de audiência, o programa de humor é apenas mais um de vários que tem levado a atriz a se aprofundar na teledramaturgia. “No palco, eu misturo tudo isso e criar um show bem magnético para que as pessoas consigam sentir, seja no amor, na fé ou na dor mesmo, com a poesia marginal que eu também trago sempre comigo. Isso vai ser muito importante para mim e para as meninas pretas que tiverem nesse show”, acredita Bixarte, que segue com seu projeto de colocar uma travesti no comando da nação cada vez mais firme.
Além dessa apresentação, o antepenúltimo dia de programação do ‘Natal da Usina’ vai contar também com outras duas atrações musicais. Antes, às 19h, Lua Alves sobe no Palco Bonde com o show acústico denominado Intima(mente). A noite será encerrada com apresentação do músico e artista visual Rieg, às 22h, na Sala Vladimir Carvalho.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 23 de dezembro de 2022.