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Cantando contra o êxodo

publicado: 03/06/2025 08h45, última modificação: 03/06/2025 08h45
Pri Cler e Pedro Medeiros vencem o Festival de Música da Paraíba com uma composição sobre artistas que precisam tentar a carreira no Sudeste
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Pri Cler e Pedro Medeiros comemoram o primeiro lugar | Foto: Thercles Silva/Divulgação

por Esmejoano Lincol*

Com uma música que denuncia o êxodo dos artistas locais e valida a importância da cultura do estado, “Deixa eu cantar aqui”, Pri Cler e Pedro Medeiros sagraram-se campeões do Festival de Música da Paraíba, cuja final foi realizada na sábado (31 de maio), em João Pessoa. Pri Cler ainda foi eleita a melhor intérprete dessa oitava edição do evento.

Juzé, que compôs e defendeu “Beijo na praça”, alcançou o segundo lugar; Paulo Rafael e Karla Oliveira completaram o pódio definido pelo júri convidado com “Baque de realidade”, na terceira posição. Vânia Airam, que forneceu letra e voz à faixa “Nordestinês” , venceu a votação do público, realizada on-line.

Pri Cler repetiu o feito da quinta edição do festival, em 2022, ocasião em que também foi eleita a melhor compositora e a melhor intérprete, por “Bocaberta”. Agora, ela optou por trazer versos de “revolta e saudade”, como definiu em entrevista, que tratam da partida de colegas  para o Sudeste, em busca de melhores oportunidades: “Tá tendo um êxodo cultural / um deslocamento estético / de migração inter-regional / de outrora, mimético”.  

Com essa nova e dupla vitória, ela angariou R$ 10 mil (divididos com Pedro Medeiros, colega da banda Pri Cler e as Panteronas) e R$ 3 mil, entregues, respectivamente, pelo secretário de estado da Cultura, Pedro Santos, e pelo cantor e compositor Milton Dornellas.

Penúltima a subir no palco do Teatro de Arena do Espaço Cultural, no sábado, Pri Cler revelou que opta por “manter as expectativas baixas” em competições dessa natureza. A vencedora põe em perspectiva a problemática levantada nas estrofes.

“O que acontece para que os artistas autorais da Paraíba não tenham espaço para tocar, por exemplo, na praia, lugar frequentado pelos turistas e tudo mais? Uma pauta que começou a ganhar destaque foi o nosso couvert. Precisamos de parcerias do poder público com as instituições privadas, para melhorar as condições de trabalho dos trabalhadores da arte”, atestou. 

Pedro rememora que a inspiração para “Deixa eu cantar aqui” surgiu na competição do ano passado, com a ida do amigo cantor pessoense Pedro Índio Negro para São Paulo.

Vânia Airam (4) levou o prêmio do júri popular; Juzé (2) cantou a segunda colocada e Paulo Rafael (3), a terceira; Pri Cler (1) ganhou também como melhor intérprete | Fotos: Thercles Silva/Divulgação

“Pri Cler mandou o verso ‘Tem um grito gutural...’. Marcamos um encontro e começamos a testar algumas ideias. Com o tempo surgiu o começo da faixa, que faz alusão a uma música construída com a escala nordestina. Fizemos alguns ajustes, conversamos sobre como poderia ser a performance dela e gravamos. A inscrição foi feita, suamos muito e ganhamos!”, comemorou.

Com “Beijo na praça”, Juzé trouxe a público o relato pessoal de uma paixão intensa. Para ele, “canções de protesto” têm mais força em festivais. Mas, citando o legado de Cassiano, um dos homenageados do evento, o vice-campeão corroborou com a sobrevivência das canções românticas.

O cheque de R$ 7 mil foi recebido das mãos da diretora-presidente da Empresa Paraibana de Comunicação (EPC), Naná Garcez. “[O prêmio] veio para mim também num momento especial, de autoafirmação como compositor. Eu não vim aqui para competir, vencer ou perder, eu vim aqui defender uma canção e ser defendido por ela”, sustentou. 

Plataforma de criatividade

O casal Paulo Rafael e Karla Oliveira adicionou a vivência de ambos em grupos de maracatu paraibanos a “Baque de realidade”. A presidente da Fundação Espaço Cultural da Paraíba (Funesc), Bia Cagliani, entregou o cheque de R$ 5 mil à dupla. Paulo é quem esteve no palco durante a finalíssima, tocando um instrumento de percussão e cantando.

“Essa é a bandeira que eu quero levantar sempre: a da cultura popular. O palco do Festival de Música nos leva a vários outros lugares. E isso impulsiona a força da mensagem do que a gente quer dizer, do que a gente traz na música”, afirmou.

Por meio desse evento, Karla tornou pública sua escrita poética pela primeira vez. Depois de acompanhar da plateia a apresentação do companheiro, ela pontuou que o festival é um instrumento poderoso de divulgação da música autoral paraibana.

“Participo do grupo pedagógico de maracatu Tambores do Tempo. Essa arte integrada faz com que o maracatu vire realmente uma ferramenta para educar as crianças. A gente precisa trazer essa mensagem de que as pessoas precisam cantar, tocar, mover. A junção dessas três estruturas podem transformar um caminho inteiro”, proclamou.  

Vânia Airam totalizou 9.573 votos no júri popular, com uma diferença de quase 800 pontos para a segunda colocada. A intérprete de “Nordestinês” compartilhou com a platéia sua visão bem humorada das gírias nordestinas, concedendo a Luiz Gonzaga o papel de professor  desse dialeto.

Clóvis Gaião, gerente de comunicação da Companhia Paraibana de Gás (PBGás), entregou o cheque de R$ 5 mil a ela. “Minha música foi defendida com muito amor, com muito calor no coração e eu estou encantada, maravilhada em saber que quem premiou a minha música foi o povão.  E sabe o que significa isso? Que a voz do povo é a voz de Deus”, disse.

O júri convidado desta última etapa foi composto por cinco especialistas, de outros estados, que estiveram presentes na final, acompanhando as apresentações: Isaar, instrumentista; Jubileu Filho, musicista; Luísa Nascimento, cantora e vocalista da banda Luísa e os Alquimistas; Pietá Rivas, especialista em marketing cultural; e André Brasileiro produtor cultural. Após a divulgação dos resultados, quatro artistas se reuniram, no palco, para o tributo Elas Cantam Glória Gadelha – esta, também homenageada. Jéssica Cardoso, Maria Kamila, Meire Lima e Sandra Belê encerraram a noite passeando por sucessos do cancioneiro autoral da sousense.

O Festival de Música da Paraíba foi realizado em conjunto pela EPC e pela Funesc, com apoio da PBGás, da Secretaria de Comunicação Institucional (Secom) e da Loteria do Estado da Paraíba (Lotep). “É uma grande plataforma que lança a criatividade dos artistas locais ou radicados aqui: eles têm a oportunidade de mostrar o seu valor. E, normalmente, temos um enfoque muito contemporâneo que ratifica posicionamentos culturais. Foi um sucesso, sob muitos aspectos”, resumiu Naná Garcez, da EPC.  

1º LUGAR:
“Deixa eu cantar aqui”,
de Pricler e Pedro Medeiros

 2º LUGAR:
“Beijo na praça”
de Juzé e Jefferson Brito

3º LUGAR:
“Baque de Realidade”,
de Paulo Rafael e Karla Oliveira

JÚRI POPULAR:
“Nordestinês”, de Vania Airam

INTÉRPRETE: Pri Cler

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 03 de junho de 2025.