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Artista pernambucano conta sobre ‘Meu Livro Vermelho’, que reúne textos, poemas, fotografias e reflexões

Cantor e compositor Otto faz a sua estreia no campo literário

publicado: 06/12/2021 08h57, última modificação: 06/12/2021 09h07
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Produzida entre os anos de 2014 e 2019, coletânea é uma espécie de diário compartilhado com o público que aborda sentimentos cotidianos. Foto: Hugo Sá/Divulgação

tags: Otto , estreia , Meu Livro Vermelho , textos , poemas , fotografias , reflexões

por Joel Cavalcanti*

Todos os dias e por cinco anos, o cantor e compositor pernambucano Otto teve por hábito, assim que acordava, escrever suas emoções, epifanias e inquietações diante das dificuldades e alegrias do cotidiano. Partes desses textos eram compartilhados de forma despretensiosa com os cerca de 160 mil seguidores que ele tem em uma de suas redes sociais e que agora se tornaram Meu Livro Vermelho (Impressões de Minas, 188 páginas, R$70), obra de estreia na literatura do ex-percussionista da Nação Zumbi e multipremiado em sua carreira solo iniciada há 23 anos.

Editado de forma cronológica, a obra reúne textos, fotografias e reflexões do artista, produzidos entre os anos de 2014 a 2019, e que funcionam com uma espécie de diário aberto ao público. Com uma temática descontínua, Otto propõe uma experiência de oráculo com o seu livro, permitindo ao leitor que suas páginas sejam abertas de modo aleatório e os textos tenham algum significado único para quem os lê. “Escrever para mim já é uma realidade infernal – amo escrever todos os dias. Esse primeiro livro soa como desabafo, meus pensamentos mais atuais e minhas poesias mais de dentro. Joguei todo dia sementes sobre meus seguidores e sempre vou querer mais”, assume o músico e escritor natural de Belo Jardim, no Agreste pernambucano.

Meu Livro Vermelho tem versos brancos, sem rimas. Mas mesmo destituídos de métrica, os versos livres de Otto buscam uma melodia. “Toda poesia, todo texto, acho que já vem ritmado da minha alma. Não há como separar. Somos todos um: eu, a poesia, o texto e o som”, considera ele, que sabe que o seu público busca em suas poesias algo similar ao que está acostumado a encontrar em suas composições presentes nos nove álbuns já lançados.

O nome da obra de estreia de Otto é uma homenagem ao escritor norte-americano Paul Auster, que lançou, em 1995, o livro O Caderno Vermelho. “Eu adoro a escrita e a linguagem de Paul Auster”, conta Otto, que não esconde outra inspiração para intitular a sua antologia: a política. Desenvolvido durante o período de recrudescimento da crise institucional brasileira, os textos refletem a indignação de seu autor com o impeachment da presidenta Dilma e a ascensão da extrema-direita no país. “Vermelho talvez como resistência democrática, luta, comunismo, pois virei o próprio comunista. Eu, que achava que comunismo nem existia mais... Deve ser por tantas coisas, busca da democracia, necessidade de resistir”, descreve ele, que se filiou ao Partido dos Trabalhadores em julho deste ano. 

“Adoro falar de política sem ser tão panfletário. Tento ser mais otimista com o meu país e com o mundo. Tento ser para cima. A poesia ajuda e ao mesmo tempo é cortante e poderosa. Pensamentos nobres às vezes ajudam a conscientizar, a clarear, a mudar. Sou dos que acreditam no melhor do ser humano”, diz ele, que chega a citar o nome de Bolsonaro em uma de suas poesias, mas ele aparece com um grifo que corta a palavra no texto escrito um ano antes da eleição do presidente.

Mas a predominância é por textos afetivos e marcados por relatos que servem ao escape da solidão. Durante o período de escrita da obra, a filha de Otto tinha 10 anos e ele estava em seu primeiro ano de relacionamento com a fotógrafa francesa Kenza Louise Said. “Por incrível que pareça, acho que elas eram inspiração e segurança para eu prosseguir meu dia a dia. As coisas que eu escrevi pouco se relacionam com minha ex-mulher e minha filha. Elas ajudam a dar liberdade para eu escrever sobre o mundo, sobre o homem. O lado pessoal aparece talvez quando falo de amor. Quando tenho esperança de dias melhores”, revela o músico e escritor, que tem 53 anos e é pai de uma filha de 17 anos, com a atriz Alessandra Negrini, de quem se separou em 2008.

Volta aos palcos

Na música, Otto prepara o lançamento de um álbum e que vai se chamar Canicule Selvagem, que ele produziu e gravou através do aplicativo Garage Band, que permite a formatação de músicas como se o usuário estivesse em estúdio de gravação.

Hoje, ele volta às apresentações presenciais com um show na Studio SP, na região do Baixo Augusta, na capital paulista. “Estou no aguardo muito emocionado e ansioso por isso. Foi difícil a pandemia para a música, mas estamos voltando. A vontade de contribuir com a cultura brasileira me fez escrever o livro, faz eu cantar a minha música e me faz pintar meus quadros”, finaliza Otto.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 04 de dezembro de 2021