Guilherme Cabral
As produções nas áreas intelectual e artística, sobretudo como documentarista e montador de filmes, aliado ao papel que representou como uma espécie de fio condutor exercido, por meio da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), pelo fato de, oriundo da geração da década de 1960, ter acolhido e fomentado os novos e talentosos cineastas surgidos nos anos 1980, foram aspectos importantes apontados por amigos como sendo o legado deixado pelo cineasta paraibano Manfredo Caldas, que morreu aos 69 anos de idade, na última sexta, dia 25, em Brasília (DF), onde residia com a família há mais de quatro décadas. Natural da cidade de João Pessoa, ele - que estava sozinho e foi encontrado pela esposa, por volta das 21h, caído próximo à mesa do escritório - contribuiu para fundar o Núcleo de Documentação Cinematográfica (Nudoc) da UFPB e a Associação Brasileira de Documentaristas e a última obra que produziu, roteirizou e dirigiu se intitula Romance do Vaqueiro Voador, longa-metragem (1h17min de duração) lançado em 2006 e protagonizado pelo também paraibano Luiz Carlos Vasconcelos.
“Manfredo Caldas teve uma trajetória linda e a sua importância é enorme não apenas para o cinema paraibano, mas também para o cinema nacional. Era um amigo querido que perdi de uma maneira inesperada, como aconteceu. Sinto muito claro isso: ninguém sabe quando chega a hora e, quando isso acontece com um amigo próximo, é como se fosse um recado para que possamos aproveitar a vida”, comentou para o jornal A União o ator Luiz Carlos Vasconcelos, protagonista do documentário Romance do Vaqueiro Voador. Baseado no poema-cordel de João Bosco Bezerra Bonfim, esse longa registra - dentro de um universo mítico - a obra realizada pelos candangos, palavra que designava os trabalhadores nordestinos que ajudaram a construir Brasília. “É um ótimo trabalho, de uma sensibilidade muito grande de Manfredo, que conseguiu transformar o poema em uma coisa linda”, disse o artista paraibano. “Manfredo deixa o legado que todos nós deixamos, que é a produção artística e intelectual e sua ação como homem”, concluiu o artista paraibano.
O cineasta e professor da UFPB, Lúcio Vilar, também lamentou a morte de Manfredo Caldas. “Soube por um amigo meu. Essa perda chocou a todos nós e foi devastadora, porque ele estava no auge da maturidade intelectual e artística. Creio que ainda se terá muito para se descobrir o legado e a importância de Manfredo, por meio de um balanço mais frio”, disse ele, que, por ser o coordenador do Fest-Aruanda do Audiovisual Brasileiro, antecipou que a curadoria da 11ª edição - que vai ocorrer em João Pessoa, no período de oito a 14 deste mês de dezembro - já se mobiliza para prestar um tributo coletivo ao saudoso cineasta. A propósito, os integrantes do evento divulgaram a seguinte nota: “A organização do Fest-Aruanda se solidariza com a família do cineasta-documentarista Manfredo Caldas, morto prematuramente nesta sexta-feira, em Brasília. O fato enlutou a todos que fazem o audiovisual paraibano e, por que não dizer, ao próprio cinema brasileiro, que perde um montador de reconhecida trajetória em dezenas de filmes. Manfredo Caldas foi homenageado pelo Fest-Aruanda em 2008”.
“Manfredo Caldas teve participação muito peculiar na linha do documentário nos anos 1960, pois foi tributário dessa geração, da qual fazem parte Linduarte Noronha, Vladimir Carvalho, além de Ipojuca Pontes. Além de documentarista, ele também - é importante que se diga isso - foi montador, tendo passado pela escola cubana, a mais importante na América Latina, e foi o fio condutor, por meio do então Departamento de Artes e Comunicação (DAC) e Nudoc da UFPB, da geração sessentista para a geração de novos e talentosos cineastas dos anos 1980, a exemplo de Torquato Joel, Pedro Nunes, João de Lima, Everaldo Vasconcelos e Edilson Alves, época muito efervescente vivida da década de 1970 até a primeira metade dos anos 1980. Manfredo morreu no momento em que estava montando um filme de Márcio Curi, que faleceu três dias antes dele”, disse Lúcio Vilar, para quem um filme de Manfredo Caldas que considera “fundamental” é o curta-metragem intitulado Cinema Paraibano 20 Anos, lançado em 1983.
A causa da morte do cineasta e documentarista paraibano Manfredo Caldas - cujo corpo foi sepultado no Campo da Esperança, em Brasília - pode ter sido infarto fulminante. Ele competiu quatro vezes no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, das quais foi premiado pelo média-metragem intitulado Nau Catarineta, o longa Uma questão de terra, que é o relato do assassinato da líder camponesa paraibana - da cidade de Alagoa Grande - Margarida Maria Alves, em meio ao debate da reforma agrária e, também, pelo curta documental Negros de Cedro (1988). No entanto, o mês de novembro de 2006 é considerado um dos pontos mais altos da sua carreira, pois, naquela época, , ele abriu, em caráter hors-concours, o 39º Festival de Brasília com o longa Romance do Vaqueiro Voador.