Guilherme Cabral
Ao longo deste ano, o Coletivo de Teatro Alfenim está comemorando uma década de existência com a “mão na massa”, ou, em outras palavras, realizando diversas atividades. E, dentro da continuidade do cumprimento dessa programação que o grupo paraibano empreende, seus integrantes abrem hoje, a partir das 19h, na Casa Amarela, que é a sede da própria companhia, localizada no Centro Histórico da cidade de João Pessoa, minitemporada do espetáculo intitulado O Deus da Fortuna, que vai permanecer em cartaz amanhã e nos próximos dias 22 (sexta) e 23 (sábado), no mesmo horário. Os ingressos custam R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia) e os lugares para o público são limitados.
“Dentro dessa trajetória, conseguimos realizar um trabalho continuado de pesquisa, montar e produzir seis espetáculos. E, além desses espetáculos, com os quais circulamos pelo Brasil todo, ainda mantemos outras atividades de formação em nossa sede, a Casa Amarela. Por isso, essa trajetória de 10 anos foi bastante positiva porque, durante esse tempo, conseguir realizar um trabalho de pesquisa na Paraíba, distante do eixo Rio de Janeiro e São Paulo, é bastante significativo”, confessou para o jornal A União um dos fundadores do Coletivo Alfenim, o paulista - chegou na cidade de João Pessoa em 2006 - Márcio Marciano, que dirige, assina o texto e o cenário da montagem O Deus da Fortuna, a qual não conta com nenhum apoio ou patrocínio público.
Além das atividades que já foram desenvolvidas ao longo de 2017, dentro da programação que celebra uma década de existência - a exemplo da oficina de iluminação ministrada por Ronaldo Costa e a temporada de repertório, com o espetáculo intitulado Milagre Brasileiro -, Márcio Marciano antecipou que o Alfenim ainda pretende lançar, até o final deste ano, um CD contendo músicas autorais, que os integrantes do próprio grupo compuseram para as três primeiras peças do Coletivo: Quebra-Quilos, Milagre Brasileiro e O Deus da Fortuna, respectivamente. “Milagre Brasileiro chegou a ser indicado, em 2011, ao Prêmio Shell na categoria de Melhor Música”, ressaltou ele.
Ganhador do Prêmio Funarte de Teatro Myriam Muniz em 2010, o espetáculo O Deus da Fortuna - cujo texto foi criado por Márcio Marciano, em processo colaborativo com os atores do grupo - é uma parábola em chave cômica que utiliza, como ponto de partida, um argumento do dramaturgo alemão Bertolt Brecht (1898 - 1956), retirado de seus diários de trabalho. O elenco integrado por Adriano Cabral, Lara Torrezan, Nuriey Castro, Paula Coelho, Ricardo Canella, Verônica Cavalcante e Vítor Blam, dá vida ao enredo que enfoca o Capital em seu estágio global de volatilização, que narra a história do senhor Wang, um proprietário de terras na longínqua China Imperial. Afundado em dívidas, em virtude da crise da produção do arroz e da seda, ele manda erguer um altar em honra de Zao Gong Ming, o Deus da Fortuna, com a intenção de se salvar da falência.
No entanto, as oferendas são inúteis e o proprietário, o senhor Wang, vê-se obrigado a vender a própria filha a seu credor, como forma de amortização da dívida. Em meio aos rituais do matrimônio, o Deus surge à sua frente e lhe desvenda o futuro, com a condição de que seja erguido o grande Templo da Fortuna. O empresário chinês deixará as formas primitivas de acumulação do capital para dedicar-se à especulação e aprenderá como o ouro se transforma em pura aparência. De acordo com os integrantes do grupo, o Coletivo Alfenim experimenta a comédia com o propósito de desmascarar a maquinaria teatral utilizada para escamotear a lógica do capital especulativo e seus derivativos, que classificam de “metafisicantes”. É um espetáculo - embalado pelo trabalho dos músicos Mayra Ferreira e Nuriey Castro - bem atual, pois o capitalismo está vivendo crise sistemática, cuja lógica ainda continua sendo a de se alimentar de trabalho não pago e da promessa fictícia de que o capital especulativo promoverá a felicidade futura, comprometendo não apenas as gerações de hoje como também as vindouras.