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Comida é poder

publicado: 29/08/2024 09h07, última modificação: 29/08/2024 09h07
O ator João Miguel e o diretor Marcos Jorge falam sobre “Estômago 2”, que estreia hoje nos cinemas
Estomago 2 - O Poderoso Chef - 06.jpg

João Miguel volta ao papel de Alecrim, cujo talento para a gastronomia o coloca em boa posição na penitenciária | Fotos: Divulgação/ Paris Filmes

por Esmejoano Lincol*

A receita de um bom macarrão alla puttanesca leva, além do molho de tomate, uma porção de azeitonas, alguns filés de anchovas e um toque de pimenta calabresa. Uma chuva de queijo parmesão ralado finaliza o prato — um dos prediletos da esfomeada Íria, personagem da atriz Fabíula Nascimento em Estômago, filme do diretor curitibano Marcos Jorge, lançado em 2007. Os ingredientes da sequência deste longa-metragem, que estreia hoje nos cinemas brasileiros, reúnem outros elementos picantes: em Estômago 2 — O Poderoso Chef, o protagonista Raimundo Nonato, nosso velho conhecido Alecrim, tipo criado por João Miguel, entra em conflito com Don Caroglio, mafioso italiano interpretado por Nicola Siri, que chega para entornar o caldo na cadeia.

No primeiro filme, inspirado pelo conto literário “Presos pelo estômago”, de Lusa Silvestre, Alecrim conquista a todos por meio de seu talento na cozinha, dentro e fora da prisão, onde vive. Ao longo da narrativa anterior, descobrimos que ele cumpre pena por ter assassinado sua namorada, Íria, e seu chefe, Giovanni (Carlo Briani) após a traição de ambos. No entrecho final do longa anterior, ele ainda envenena o líder Bujiú (Babu Santana), por meio de uma feijoada “batizada” e assume o lugar de prestígio dentro da cadeia e a “beliche de cima” na cela onde dorme. Caroglio, recém-chegado passa a disputar território com Etcétera, criação de Paulo Miklos, que reprisa seu papel neste novo filme. A vida pregressa do italiano também é retratada em Estômago 2

Nicola Siri e João Miguel dividiram o prêmio de melhor ator no Festival de Gramado este mês; filme também foi premiado pelo júri popular | Fotos: Divulgação/ Paris Filmes

Marcos Jorge conta que a ideia de se fazer uma sequência de Estômago partiu da produtora Cláudia da Natividade: ela enxergou a possibilidade de se fazer uma coprodução internacional de fato — parte dos recursos do primeiro Estômago foram captados a partir de acordo firmado em 2007 entre a Agência Nacional do Cinema (Ancine) e o Instituto Luce e a Cinecittá Holding, estes últimos vinculados ao governo italiano. “O argumento que me foi encomendado pela produtora tinha como premissa a continuação, mas solicitava a ampliação da história, que deveria ser levada também para a Itália. Fomos apoiados pelo ator João Miguel que nos deu sua disponibilidade”, rememora o realizador.

Mesmo tendo sido premiado nacional e internacionalmente, quando de sua estreia, o primeiro filme teve uma recepção mista de parte dos críticos e uma audiência tímida, como remonta Marcos. A opinião especializada foi revista: em 2015, Estômago entrou para a lista dos 100 melhores filmes brasileiros, da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). O público também foi sendo conquistado paulatinamente. “Ele foi se afirmando no boca-a-boca (o que seria natural até pelo seu título) e a ampla aceitação do público aumentou ainda mais quando do lançamento em DVD. Sua distribuição no streaming ampliou poderosamente sua base de fãs e se tornou um ‘cult’”, assevera Marcos.

Conquistando o diretor

Competindo no último Festival de Gramado, Estômago 2 levou para casa quatro prêmios: melhor filme pelo júri popular, melhores roteiro, direção de arte e trilha musical e melhor ator, dividido entre João Miguel e Nicola Siri — este se emocionou ao subir ao palco para receber o seu Troféu Kikito. “Nicola gosta de contar que ele não foi a minha escolha inicial para o personagem, ele teve que me conquistar. Mas ele foi tenaz, fez um selftest muito bom e acabou me convencendo do que agora parece óbvio: Dom Caroglio não poderia não ser ele”, afirma o diretor.

Apesar de ser vendido como uma sequência, Marcos Jorge prefere definir seu longa como um spin-off, uma nova produção dentro do universo criado anteriormente, e não uma continuação direta, focando agora no tipo criado por Nicola. “Como no primeiro filme, em relação a Alecrim, narramos a transformação de um pacato cidadão italiano no impiedoso Dom Caroglio. Enquanto o primeiro filme era quase minimalista, um jantar íntimo, digamos assim, este novo é um banquete barroco, luculiano, luxuoso”, justifica. 

Imagem: Divulgação/ Paris Filmes

João Miguel revela que a composição de seu personagem no primeiro longa visava representar a relação entre patrão e empregado no Brasil, aspecto que o honra e que o fez aceitar o convite para interpretá-lo, há quase duas décadas. “Contamos essa história a partir do ódio que o chefe provoca no seu subordinado e vice-versa. Mas especificamente para Notato, fui buscar referências nos artistas Giulietta Masina, Grande Otelo e Tom Zé, além de uma dose muito grande de Chaplin”, enumera.

O ator também confessou que ainda não viu o corte final de Estômago 2 — O Poderoso Chef, oportunidade que terá agora, com a estreia. O apelo do primeiro e do segundo filme repousa em um elemento simples e, ao mesmo tempo complexo, segundo João Miguel. “Tudo graças ao humor. O Nonato provoca riso a partir de uma complexidade do assunto abordado. O personagem é uma espécie de jogo, que propus para os atores que estavam comigo em cena e que toparam brincar comigo. Nos divertimos muito neste lugar”, finaliza João.

Para celebrar a estreia desta sequência (ou spin-off), o Canal Brasil exibe hoje, às 22h, o primeiro Estômago. O longa de origem também está disponível em streaming no catálogo do Globoplay e da Claro TV+.

ESTÔMAGO 2 – O PODEROSO CHEF
- Brasil/Itália, 2024. Dir.: Marcos Jorge. Elenco: João Miguel, Nicola Siri, Paulo Miklos, Violante Placido.
- Estreia hoje em João Pessoa. Veja locais e sessões no Em Cartaz, na página 12.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 29 de agosto de 2024.