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Literatura

Conjunto de singularidades de um autor

publicado: 03/05/2023 09h36, última modificação: 03/05/2023 09h36
Hoje, na capital paraibana, escritor Marcus Alves debuta no gênero literário do conto com o lançamento da coletânea ‘O Menino e a Sineta e outros contos’
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Antologia reúne nove histórias escritas nos últimos cinco anos e que têm por contexto comum a presença do cotidiano urbano em todos os enredos e, sobretudo, na vida das pessoas - Imagem: Editora Ideia/Divulgação
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por Joel Cavalcanti*

Da faceta de poeta veio o esmero artesanal com a palavra. Do sociólogo especializado na área cultural, o olhar de pesquisador que interpreta os fenômenos sociais urbanos. Do jornalista, uma forma de narrar situações originais do cotidiano de maneira clara e concisa. Foi juntando esses três princípios que o escritor Marcus Alves criou O Menino e a Sineta e outros contos (Editora Ideia, 78 páginas, R$ 40), sua primeira antologia de contos na carreira. “Eu sou muitos. Um autor é um conjunto de singularidades, das suas procuras e das suas percepções. Talvez o que eu tenha perseguido tenha sido exatamente isso”, conta o diretor executivo da Funjope, Marcus Alves.

O lançamento da obra acontece hoje, às 18h30, na Livraria do Luiz (matriz no MAG Shopping), em João Pessoa. São nove histórias escritas nos últimos cinco anos e que têm por contexto comum a presença do cotidiano urbano em todos os enredos e, sobretudo, na vida das pessoas. O universo da cidade é abordado desde como tema central quanto pela ambiência onde as histórias se estabelecem e por onde os personagens circulam, movimentando-se entre cafés, livrarias e igrejas. “São percepções que fui colecionando ao longo de um tempo e eu vi que não era um poema ali, que na verdade eu tinha elementos para desenvolver um conto”, lembra o paraibano natural de Itabaiana, autor dos livros de poemas O eterno e o provisório (2007) e Arqueologia (2013).

O ponto de partida criativo da escrita do livro surge por uma observação direta e curiosa da realidade, mas que se consubstancia com uma elaboração memorialista de origem literária que inspira o seu autor. “Às vezes, o conto vem do nada. Vem um elemento que você guarda, vai desenvolvendo e percebe que rendeu um conto daquilo. Não é um elemento biográfico que está no livro. Evidentemente que isso acaba aparecendo. Todos nós quando escrevemos acabamos por deixar uma coisa da gente nesse processo de escrita, mas não é o fundamental”, explica Alves, que escolheu dar destaque no título a um conto que simboliza todos esses aspectos.

O menino do título da obra é um coroinha. A sineta, o instrumento que ele precisa usar com precisão e sincronia durante a liturgia religiosa do catolicismo. “No final é que eu revelo porque aquele momento é tão importante para aquela criança. Eu tento mostrar que a beleza pode estar nas coisas mais simples e singelas, e que às vezes a gente nem percebe”. Com exceção de um conto que foi publicado há alguns anos no Correio das Artes, na forma de uma carta que um personagem escreve a Sherlock Holmes, nos anos 1950, e que foi incluído na coletânea, todos os demais textos são inéditos.

Enveredando pela primeira vez no gênero literário caracterizado pela narrativa breve e concentrada, escrever contos também é uma realização de técnicas e de linguagem sobre as quais Marcus Alves foi exigido a ter uma habilidade especial para escolher palavras precisas e criar uma atmosfera envolvente em poucas páginas. “A linguagem de contos tem que ser um grande exercício de objetividade sem perder a subjetividade. Ele tem que ser curto e tem que ter uma linguagem muito clara e concisa. Ao mesmo tempo, é preciso ter o elemento subjetivo da criação e manter a atenção do leitor. Esse é o desafio: como contar uma história breve e manter o encantamento com o leitor”, define o escritor.

A publicação conta com ilustrações do artista plástico Mirabeau Menezes e apoio da Confraria Sol das Letras. A apresentação é do jornalista e escritor José Nunes. Membro da Academia Paraibana de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba, José Nunes destaca que os contos de Alves são histórias simples que de tão reais abrem no leitor uma hipótese imaginativa se elas não teriam acontecido com o próprio leitor ou alguém próximo. “Isso porque, como poeta, ele sabe capinar as palavras para expressar emoções e o lenitivo que abastece a alma. Marcus apareceu para colocar um marco na história do conto paraibano. Escrever conto não é fácil, como dizia o escritor Júlio Cortázar, mestre no gênero, porque o conto deve girar como uma esfera em que a história se desenvolve até o desfecho. E Marcus consegue isso”, afirma José Nunes.

Tendo iniciado a carreira literária no ensaio de caráter científico e acadêmico através dos livros Cultura Rock e arte de massa (1995) e Cultura no Mercosul - uma política de discurso (2004), e depois das publicações de poesia, a obra mais recente de Alves é a novela K encontra Paludes, de 2018. Esse parece ser um percurso em busca contínua pela experimentação e exploração das diversas formas de expressão de um estilo e de uma voz própria. “Esse livro é uma vivência literária que estou fazendo que fortalece o conjunto dos meus textos, da minha obra. Esse é um exercício de um caminho literário que estou construindo”. E essa curiosidade por novos horizontes criativos não se encerra em O Menino e a Sineta e outros contos.

“Estou desenvolvendo um romance que está entre 60 e 70 páginas, mas ele precisa de um estudo maior, mais forte. A vida vai me aproximando desse romance. Essa é uma empreitada muito forte porque é preciso ter um domínio tanto de linguagem literária quanto de vivência, experiência. Pressupõe uma maturação, um tempo. Mas ele está bem ancorado. Se eu tiver mais um tempinho, acho que consigo desenvolvê-lo”, conclui Marcus Alves.

*Matéria publicada na edição impressa de 03 de maio de 2023.