Notícias

'Doidinho’: Segunda obra de José Lins do Rego permanece atual e vai celebrar nove décadas de lançamento no próximo ano

publicado: 03/05/2022 08h48, última modificação: 03/05/2022 08h48
imagemglobaldivulgacao.png

Imagem: Global/Divulgação

por Guilherme Cabral*

Marcado o aniversário de nove décadas do seu lançamento original para o próximo ano – sendo a sequência de Menino de Engenho, do escritor paraibano José Lins do Rego (1901-1957) –, o livro Doidinho continua sendo atual. Foi o que garantiu o escritor, mestre em Sociologia e professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Cauby Dantas. “A obra aborda temas que ainda hoje continuam sendo tratados, como a homossexualidade, a pedagogia da educação e a questão de uma atitude que só agora se dá o nome de bullying, porque até então não se sabia. Doidinho é um romance eterno, um clássico. É um clássico porque, como diz Ítalo Calvino, uma das características do clássico é o de não parar de dizer o que se tem para dizer, fornecendo uma agenda temática”, apontou o pesquisador.

O livro consolida o paraibano como “um grande autor prolífico e que vem para ficar, depois de ter lançado Menino de Engenho, em 1932, com recursos próprios. Esse é o segundo livro dos cinco títulos que integram o chamado ‘Ciclo da Cana-de-Açúcar’, cuja lista oficial ainda inclui Bangüê, Moleque Ricardo e Usina”, elencou o sociólogo. “Alguns críticos – incluindo eu – preferem trocar Moleque Ricardo por Fogo Morto nessa lista, por ter mais relação com a temática dos engenhos, além de ser sua obra-prima", comentou o professor Cauby Dantas.

O escritor ainda observou que o segundo livro segue a temática e a cronologia de Menino de Engenho e a história se passa praticamente na zona urbana. “Essa segunda obra faz parte da trilogia sobre Carlos de Melo, que se completa com Bangüê, as quais mostram, respectivamente, a infância, a adolescência e a fase adulta de Carlos”, disse o professor, que possui Bacharelado em Ciências Sociais e mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia, ambos pela UFPB.

“Em Doidinho, Carlos de Melo sai do Engenho Santa Isabel, na cidade de Pilar, onde José Lins do Rego nasceu, para ir estudar no Instituto Nossa Senhora do Carmo, do professor Maciel, no município de Itabaiana. Nesse Instituto ele encontra um mundo diferente do seu mundo rural, mas amplia os seus horizontes. Ele conhece amigos, o sofrimento do castigo físico, com palmatória, por parte do diretor Maciel, para os alunos que errassem, mas também fica todo orgulhoso, porque percebe que seu avô, José Paulino, é um homem poderoso, por receber atenções durante as visitas ao Instituto”, relatou o Dantas.

Sendo natural de Itabaiana, Doidinho é uma obra que o cineasta paraibano redicado em Brasília, Vladimir Carvalho, chegou a revelar para A União que gostaria de adaptar para um longa de ficção.

Cauby Dantas ressaltou alguns aspectos para justificar que o livro ainda é atual. “A obra aborda o homossexualismo entre os alunos do Instituto, mas Carlos de Melo não está entre os que praticam esse tipo de atividade. Carlos também descobre a pedagogia sádica do diretor Maciel, que usa palmatória e faz o aluno se ajoelhar sobre grãos de milho. Ele recebe esse apelido de Doidinho, daí o título do livro, por ser meio apressado e ansioso, dado pelos colegas do Instituto quando souberam que seu pai estava internado no Hospital da Tamarineira, em Recife, por ter assassinado a esposa, num surto psicótico, o que é relatado no início do livro Menino de Engenho. É uma atitude que, hoje, seria considerada bullying. Carlos de Melo tem um aprendizado de alegrias e tristezas, já que a morte de um dos alunos que estava doente o faz lembrar da mãe que havia falecido”, disse ele.

‘Cidades de Zé Lins’

Segundo romance de Zé Lins, Doidinho foi escrito quando ele morava na cidade de Maceió (AL).

Falando nos lugares por onde o escritor passou e se inspirou, recentemente foi lançado a obra inédita intitulada As Cidades de Zé Lins (270 páginas), parceria entre a Editora A União, Cepe e Cepal, com participação da ABL), que faz um “passeio crítico” pela geografia sentimental do paraibano.

Também foi em Maceió que Zé Lins publicou Bangüê (1934) e O Moleque Ricardo (1935) e fez a sua estreia com Menino de Engenho (1932).

Atualmente, Doidinho está sendo publicado pela Editora Global (236 páginas, R$ 59,90), que detém os direitos das obras do autor.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 3 de maio de 2022