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Em busca do amor

publicado: 26/11/2024 09h18, última modificação: 26/11/2024 09h18
Pedro Luís conversa com A União sobre seu novo disco de inéditas, no qual reflete sobre a sociedade pós-pandemia
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Chico César é uma das parcerias de Pedro Luís no novo álbum | Foto: Marcos Hermes/Divulgação

por Daniel Abath*

A pouca gentileza e os discursos de ódio que marcaram a atmosfera distópica do Brasil pandêmico serviram de inspiração para que o cantor e compositor carioca Pedro Luís pudesse imaginar o revés de um tal estado opressivo, o que viria a se tornar seu mais novo álbum solo, E Se Tudo Terminasse em Amor?, lançado no último dia 15 de novembro nas principais plataformas de streaming de áudio. “Já me acendia uma vontade de falar do amor, do afeto. A ideia era poder tocar com esse próximo álbum os botões de sensibilidade das pessoas”, conta.

Conhecido por projetos como o grupo Pedro Luís e a Parede — com o qual gravou, junto com Ney Matogrosso, o álbum Vagabundo (2004) — e o bloco carnavalesco Monobloco, Pedro Luís apresenta um disco que ele mesmo define como a proposta mais pessoal e minuciosa de sua carreira.

Com 10 faixas, E Se Tudo Terminasse em Amor? inclui colaborações, experimentações sonoras e reflexões sobre o amor e o cotidiano, traduzindo o seu olhar sobre questões sociais e afetivas, sem abandonar a identidade poética que permeia sua obra. De acordo com o compositor, o processo de criação e produção do disco foi diferente de tudo o que ele já havia realizado. “Eu cuido desse álbum do nascedouro das canções até a entrega final. Foi o álbum que eu mais me apropriei de todos os processos. Esse disco representa um novo momento na minha vida”, declara.

 Amor, parceria e crítica

Natural do Rio de Janeiro, Pedro Luís Teixeira de Oliveira possui uma trajetória musical marcada pelo ecletismo, iniciada nos anos 1980, com a banda de punk rock Urge, primeiro grupo musical do artista, que foi sócio-fundador da famosa casa de shows Circo Voador. Na década de 1990, atuou como violonista e produtor musical, vindo a formar, em 1996, o grupo Pedro Luís e a Parede, e no ano 2000, o Monobloco. Em 2011, lançou seu primeiro disco solo, Tempo de Menino. “Tudo é uma sedimentação de exercícios com música e criação. Cada trabalho traz desafios, apreensões e muito prazer. Este disco, no entanto, me coloca em um lugar novo, um passo à frente”, diz.

Além de temas afetivos, como preconiza o título da obra, o disco também explora questões sociais e urbanas, refletindo a respeito da realidade de sua cidade natal, o Rio de Janeiro, tratado em “Choro punk” como um Rio hostil. Segundo Pedro, o Rio teria mudado muito nos últimos anos, o que lhe ensejou o desejo de questionar e propor reflexões sobre o viver em coletividade.

Já “Carinho na rede”, faixa em parceria com Chico César — que, assim como em “Choro punk”, conecta esse novo trabalho às crônicas sociais próprias a Pedro Luís e a Parede —, lança uma dupla mensagem: “Pode ser o carinho na rede com o seu xodó, deitado na rede, mas eu tô pedindo carinho em outra rede, para que sejamos mais empáticos, menos violentos, agressivos e hostis nas redes da internet”, detalha.

Esta, inclusive, é a primeira vez que Pedro faz uma colab com Chico, apesar das várias ocasiões de encontro entre os dois músicos. “As pessoas estão acostumadas a ouvir essas crônicas comigo em trabalhos com a Parede. Este álbum, no entanto, passeia mais por baladas e experimentos pessoais, algo mais da minha pessoa do que dos coletivos dos quais faço parte”.

A escolha do reggae como base para “Vem amar comigo” e a releitura de “Muito romântico” (de Caetano Veloso) é um exemplo dessa evolução. Pedro justifica a escolha citando o impacto do reggae na obra de Caetano, que primeiro teria citado a palavra “reggae” em uma música brasileira — em “Nine out of ten”, do disco Transa (1972). “Acho que muitas músicas dele poderiam ser feitas na onda do reggae. A canção tem o nome ‘Muito romântico’, mas traz um dedo na ferida, tipo, sou romântico, mas alto lá!”, explica. O compositor de Santo Amaro aprovou o arranjo para a sua canção, o que foi recebido com entusiasmo por Pedro, que já havia gravado no início de sua carreira com o músico.

O disco também contou com outras parcerias. Entre elas, Marco André, do Pará, e Professor Batalha, do Rio de Janeiro, que contribuíram para ampliar a diversidade temática e melódica do trabalho. A canção “É tempo”, que encerra o álbum, surge dessa colaboração. “Ela fala dessa pluralidade do amor, que está contida nas canções e parcerias deste trabalho. Foi um projeto que me colocou em contato com muitas novidades e com pessoas incríveis”.

A própria produção do álbum exigiu a contribuição de diversas frentes, a exemplo do trabalho com o produtor André Moraes, responsável por trilhas famosas do cinema nacional, como a de Lisbela e o Prisioneiro. “Fui ao Rio Grande do Sul para começar a desenhar isso com ele. Foi um processo muito intenso e afetivo”, diz.

O músico afirma ainda o papel das imperfeições no processo de gravação, ressaltando o valor que é próprio a cada interpretação no estúdio. “Gravei todas as vozes em três sessões, o que é pouco tempo, porque você tem que repetir e repetir até — como diria o Manuel de Barros — ficar diferente; até chegar naquele lugar em que você diz ‘é isso’, com todas as qualidades e defeitos, já que os defeitos são preciosos e dão o DNA daquela interpretação. Eu tô muito satisfeito”, afirma.

 E se o amor saísse em turnê?

Para divulgar o novo álbum, Pedro Luís planeja uma turnê nacional. A ideia é criar um espetáculo que traduza o cuidado dedicado à produção do disco. “Queremos um show que nos agrade tanto quanto está nos agradando o resultado do disco e que possa agradar às pessoas também, levando as audiências a cantar essas canções com a gente e celebrar esse momento”.

Embora já tenha se apresentado em João Pessoa com outros projetos, como a Parede, Monobloco e junto com Ney Matogrosso, Pedro Luís nunca fez um show solo na cidade. Com a chancela de Chico César, ele espera que o desejo de levar a turnê à Paraíba venha a se concretizar e diz que está louco para se apresentar na Paraíba com o novo projeto, com o qual pôde aprender ainda mais acerca de convivência e, claro, sobre o amor.

“Sou um ‘pretenso poeta’, como dizia a mãe de uma namorada da minha adolescência [risos]; um apaixonado por poesia desde muito cedo, que escolheu a música pra tentar espraiar isso que a poesia me desperta desde tão cedo”, destaca.

Com o lançamento, Pedro Luís reafirma sua capacidade de transformar suas vivências em arte, mantendo os traços de uma carreira marcada por inovação, engajamento e a busca incessante por novos horizontes criativos. “Pretendo alcançar ouvidos, corações e corpos com esse álbum. Quero todo mundo dançando com ele, refletindo, se divertindo e se indagando, porque ele tem todos esses gatilhos de amor contidos nas canções. Encontrando novas parcerias para falar dessa diversidade do amor, o que eu espero é que eu alcance muitos corações que topem responder comigo: e se tudo terminasse em amor?”.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 26 de novembro de 2024.