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Entre o fazer literário e o humanismo

publicado: 11/04/2023 11h49, última modificação: 11/04/2023 11h49
Juca Pontes foi um incentivador de talentos, um formador de gerações e um incansável ativista cultural para o estado
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Juca estava com dois livros inéditos para serem lançados: uma obra infantil e uma coletânea de poesias - Foto: Evandro Pereira

por Guilherme Cabral e Lucilene Meireles*

Juca Pontes nasceu na cidade de Campina Grande, mas radicou-se na capital, João Pessoa, há mais de três décadas. A família refletia no seu ofício de escrever, produzir versos e editar: pai de quatro filhos – Ian, Maíra, Tao e Jade –, e avô de quatro netos – Ravi, Ben, Maya e Joaquim, eles foram fontes de inspiração para o livro As Flores do Meu Jardim, contendo a maioria de poesias inéditas, apresentado em maio de 2021, por meio do projeto virtual Livro Live, da Livraria do Luiz, recanto que Juca constantemente frequentava na capital, e que nem o isolamento social o impediu de promover e divulgar os lançamentos literários durante a pandemia.

As raízes de Pontes estão fincadas nas cidades de Santa Cruz do Capibaribe e Caruaru, onde passou a infância e parte da adolescência, ambas em Pernambuco, e, na Paraíba, em Campina Grande, Catolé do Rocha e João Pessoa, onde se radicou e criou sua família a partir dos anos 1980.

De acordo com o Correio das Artes de julho de 2021, ele começou a gostar de música quando ainda estava na barriga da mãe, que ela gostava muito de ouvir. Ao longo de sua vida, o poeta incluiu outras referências artísticas para produzir, fomentada por meio de amizade com outros poetas, jornalistas, músicos, artistas visuais e cineastas.

Juca Pontes foi criado praticamente pela mãe, pois o pai deixou a família muito cedo, quando o então garoto tinha por volta de seis anos de idade. O poeta atribuía à mãe tudo o que aprendeu na vida e ela ainda lhe legou os ensinamentos de que a beleza vem da simplicidade e que valorizasse tudo que fosse bom e relegasse o que não prestasse. Quando ela morreu, Juca tinha 14 anos de idade e se mudou para Campina Grande, onde foi criado pelos tios. Ele não se encaixava em nenhuma escola de poesia, pois não tinha tal pretensão, embora seus primeiros escritos tenham se inspirado em autores como Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Manuel Bandeira e João Cabral de Melo Neto. A inspiração vinha dos seus próprios conterrâneos.

Autor de outros livros, a exemplo de Ciclo Vegetal, Ranhuras do Corpo e Carro de Boi, Juca Pontes estava com dois livros inéditos para serem publicados, sendo um infantil, que estava previsto para ser lançado até o fim deste ano, e o outro de poesias, agendado para 2024. A sua última obra foi a antologia poética Itacoatiara, apresentada em novembro do ano passado.

Juca foi um dos fundadores da Confraria Sol das Letras, que realiza eventos literários na Academia Paraibana de Letras (APL), em João Pessoa, como o Pôr do Sol Literário, e tinha algumas parcerias literárias com fotógrafos paraibanos, a exemplo de João Lobo e Gustavo Moura, e também com artistas plásticos, como Flávio Tavares.

Buraco enorme

Com a recente morte prematura do poeta, escritor, editor, jornalista e um dos mais importantes ativistas culturais da Paraíba, o universo literário do estado ficou mais pobre, sendo sentido esse enorme “vão” entre os profissionais do meio das letras, leitores e artistas nos quais ele se relacionava, tanto do ponto de vista editorial e criativo quanto na perspectiva humanista centrada na pessoa que era Juca Pontes.

O jornalista Alarico Correia Neto tinha ele como um irmão. Trabalharam juntos em alguns projetos, edições de livros e chamavam um ao outro de “veinho” toda vez que se encontravam. “Nos abraçávamos, nos beijávamos respeitosamente porque tínhamos o maior carinho um pelo outro, desde os problemas mais difíceis que ele passou, sempre estivemos juntos. Juca tem que ser homenageado pelo trabalho que fez. Minha esposa tem uma ONG e pensamos em fazer uma exposição dos livros editados por ele. É uma perda irreparável”.

Já o jornalista e escritor Nonato Guedes ressaltou que a grande característica de Juca Pontes era a de ativista cultural porque ele promovia eventos dessa natureza, não necessariamente ligados aos trabalhos dele, com uma multiplicidade de obras, poemas, escritos, textos jornalísticos. “Ele era, sobretudo, um incentivador de talentos, um formador de gerações, dava um assessoramento independente do vínculo profissional”, disse ele.

O poeta e escritor Lau Siqueira acredita que o legado de Juca Pontes vem do profissional de excelência e do poeta maravilhoso, mas principalmente, pela figura humana que ele foi, extremamente querido por todos. “Vemos o quanto esse fato hoje abalou todo mundo. Temos a sensação, às vezes, de que as pessoas boas são eternas e, quando as perdemos, é muito difícil para todo mundo. Causou um buraco enorme na sociedade e na cultura paraibanas, pela perda do grande profissional, grande poeta, grande editor e da pessoa humana fantástica que foi Juca, lamentou.

Gerardo Rabello, jornalista e amigo de Juca Pontes, disse que ele era porto seguro para todo mundo. “Quem tivesse um projeto no jornalismo impresso, na literatura ou que carecesse de uma atenção para elaboração de textos, o caminho passava por Juca. E ele acolhia todo mundo. Tinha uma palavra, um sorriso de ternura e um acolhimento de abraçar que nos deixava enternecidos”, recordou.

Muito emocionado, o jornalista e colunista Abelardo Jurema observou que é um momento muito difícil. “Temos convivido com tantas perdas, mas eu considero que uma perda como Juca é imensurável. Ele era um homem que vivia para os outros, pensava coletivamente. Só pensava em fazer as coisas bem-feitas, um coração extraordinário. Eu tinha um afeto por ele muito grande. Juca editou três livros meus e tudo que ele fazia era para melhorar o trabalho. Acho que ele deixa um legado de bondade, um legado de que na vida nós temos que servir aos outros”, finalizou ele.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 11 de abril de 2023.