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Espaços alternativos agitam a cena cultural da capital

publicado: 02/03/2018 16h05, última modificação: 02/03/2018 16h13
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O Buarque-se Café com Arte traz uma atmosfera saudosista da casa da vovó e divulga obras produzidas na Paraíba - Foto: Divulgação

tags: espaços alternativos , cultura alternativa , cultura local , buarque-se arte e café , a tamarindeira


Mariana Lira

Especial para A União

Manter um espaço de cultura em tempos de perseguições artísticas, políticas, de violências de gênero e orientação sexual, violências motivadas por crenças religiosas, racismos, entre outras barreiras, não é uma missão simples. Entretanto, motivados pelas artes, proprietários de centros culturais em João Pessoa continuam esperançosos por um futuro satisfatório, no qual a arte e cultura local recebam seu valor. Na capital, encontra-se A Tamarindeira - Processos Criativos e o Buarque-se Café com Arte como exemplos dessa resistência cultural.

“Foi um jeito que arranjei para me manter viva e acreditando que podemos ter dias melhores pela frente”, expressa Ana Marinho, em entrevista ao jornal A União, sobre a criação de A Tamarindeira - Processos Criativos. Ela conta que o local trata-se de um sonho, partilhado com Maria Botelho, de ter um espaço de cultura num bairro como o do Miramar. “O espaço, alugado, passou por uma grande reforma, com o consentimento do proprietário, para que fosse possível a apresentação de espetáculos de dança, teatro e música, em pequenos formatos”, informa.

Ana Marinho e Maria Botelho, artistas visionárias, transformaram uma casa comum em um espaço disponível para disseminação das artes, que abriga os grupos de Teatro Osfodidário e Bigorna de Teatro. Em outubro de 2016, a Tamarindeira abriu suas portas com a apresentação do espetáculo ‘Razão para ficar’, monólogo da atriz Ana Marinho, do Grupo de Teatro Osfodidário. Desde a abertura, a casa recebe temporadas de espetáculos de teatro e música, além de oficinas de teatro, grafite e dança de rua para adultos e crianças.

Com poucos recursos de iluminação e de som, a Tamarindeira vem se consolidando como um espaço alternativo, localizado no Bairro do Miramar, que concentra equipamentos de cultura como o Espaço Cultural José Lins do Rego, além de vários ateliês de artistas plásticos e pequenos centros de cultura. “Não posso dizer ainda se a casa deu certo, até agora não conseguimos pagar todas as contas com o pouco dinheiro que entra através das parcerias com os grupos de teatro e da realização de eventos de música. Já tivemos eventos de música com um público de 200 pessoas, mas o dinheiro foi repassado para os artistas, como acreditamos que deve ser”, confessa a proprietária.

Um desafio para os espaços alternativos é o público seleto, que acaba restringindo também a fonte de renda. “Já temos um público fiel que nos acompanha, mas ainda é um público pequeno”, diz Ana. Considerando as dimensões da casa, que não possibilitam um grande público, a pretensão para o ano de 2018 e os próximos é a realização de novas parcerias, projetos de interação artísticas com grupos de fora, músicos, bailarinos, haverá a oportunidade de realizar eventos que se auto-financiem, conforme avalia a artista.

O nome ‘A Tamarindeira’ deve-se as quatro tamarineiras existentes na rua em que a casa está localizada. “São as últimas árvores preservadas do bairro, localizadas no meio da rua, e só estão lá porque uma das moradoras do local realizou uma campanha para que não fossem derrubadas, pois abrigavam ninhos de gavião. Além do mais, o fruto do tamarindo tem um gosto peculiar, doce e amargo. A escolha do termo tamarindeira, e não tamarineira, se deve ao fato de que somos duas mulheres malucas e trabalhadeiras”, conta Ana.

Buarque-se Café com  Arte

Alex e Fagner, amigos e empreendedores, inspirados pelo Museu de Arte Latino-Americana de Buenos Aires (Malba), criaram um local que reúne arte, gastronomia e cultura nordestina. O ‘Buarque-se Café com Arte’ colore o Bairro de Intermares, desde 2015.”Numa viagem a Buenos Aires, a procura do Abaporu da Tarsila do Amaral, conhecemos o Malba, museu onde está a obra. O que mais nos chamou atenção foi a junção do Café com Galeria de arte, exposições, lojinha de artesanato, tudo isso no museu”, conta José Alex Oliveira ao jornal A União.

Diferente do Malba, que é um museu moderno, “a Cafeteria é um espaço onde nós procuramos reproduzir uma casa de vó, repleto de memórias e sensibilidade. A inspiração do Malba é apenas filosófica”, revela o empreendedor. Os visitantes são submetidos a uma viagem no tempo, com a oportunidade de se emocionar com a decoração repleta de bules, louças antigas, antiguidades. “Ouvimos muitas histórias, referências ao passado. Esses objetos remetem lembranças, remetem pessoas queridas”, diz Alex.

O ambiente é completamente tomado por uma atmosfera cultural, que valoriza artistas da terra. Além da decoração poética, o som envolvente e as exposições de quadros, livros, artesanatos, entre outras obras, o estabelecimento tem um diferencial em seu menu. Nesse cardápio exótico, no qual o cliente deveria encontrar “cuscuz com carne de sol”, encontra-se “menino do engenho”, por exemplo. “O Café facilita muito na divulgação da arte paraibana que é a nossa principal filosofia. Sobretudo resgatamos a culinária afetiva e a de raiz. Tudo recebe nome de artistas ou obra paraibana. Isso cria familiaridade e acesso”, explica Alex.

“Resolvemos homenagear os artistas da terra em nosso cardápio, seja nos cafés, chás e pratos. Acontece muito de um cliente pedir um café sem nunca ter ouvido falar naquele artista. Aquilo leva a curiosidade e pesquisa, já que a internet nos possibilitou tanto acesso à informação. Ali mesmo no café, eles passam a conhecer o artista. E outros pedem no cardápio, o artista de sua preferência”, acrescenta.

A estratégia enaltece a cultura local, que por sua vez, agrega valor e atenção ao estabelecimento. “Percebemos que deu certo quando presenciamos um novo público adquirindo obras, livros, arte dos artistas paraibanos. Pra nós é um orgulho imenso por ter formado esses novos apreciadores e o Buarque-se ser citado e lembrado pela arte que divulga”, comenta José Alex.
Recebendo um público misto, muitas vezes motivados pelo interesse artístico, o local é um agente cultural na capital paraibana. Com potencial para ser um dos principais pontos de encontro de artistas e apreciadores de uma boa gastronomia, cultura e arte.

A cidade de João Pessoa é contemplada com diversos empreendimentos comprometidos com a cultura, sobretudo a popular. Além da Tamarindeira - Processos Criativos (Miramar) e o Buarque-se Café com Arte (Intermares), encontram-se distribuídos pela cidade diversos outros, a exemplo de A Budega Arte e Café, no Bairro dos Bancários, Vila do Porto, Casa Cosmopopeia e o Ateliê Multicultural Elioenai Gomes, no Centro da cidade.