A Empresa Paraibana de Comunicação (EPC) completa seis anos de existência este mês. Para celebrar a empreitada, a Editora A União, adiciona ao seu catálogo três novos títulos, que virão a público amanhã, a partir das 19h, durante o Noite da Literatura, evento gratuito promovido pela Livraria A União Poeta Juca Pontes, situada no Espaço Cultural, em João Pessoa. Paraíba na Literatura VI dá continuidade à série de ensaios sobre importantes nomes da nossa cultura. Brejo de Areia, de Horácio de Almeida, e A Menina de Cipango, de Marília Arnaud, inauguram a Coleção A União, que pretende republicar livros paraibanos atualmente fora de catálogo.
Paraíba na Literatura VI reúne 20 perfis de artistas locais, nascidos ou radicados no estado, elaborados por outros 20 autores, que admiram sua trajetória no segmento em que atuam. O ensaio que abre o novo catálogo remonta a carreira do multiartista e jornalista pessoense Anco Márcio, falecido em 2013, redigido pelo amigo e escritor José Bezerra Filho.
“Anco Márcio tinha talento para ser um grande humorista, mas preferiu optar pelo jornalismo, pela literatura, pela direção de peças infantis, pela poesia e pelo rádio”, escreve Bezerra.
Já Carlos Aranha, também multiartista e escritor, morto em novembro, tem sua vida contada pelo jornalista Sílvio Osias, que conta como ouviu seu perfilado noticiar, nos anos 1960, a falsa morte de Paul McCartney, durante o programa que apresentava na Rádio Correio AM, seguida da execução de “A day in the life”, clássico dos Beatles. “A gravação, que Aranha colocou no Diário Íntimo da Cidade, ficou imperfeita. Meu pai resolveu fazer melhor, levou a fita para colocar no programa e foi na noite de 17 de dezembro de 1969 que estive com ele pela primeira vez”, recorda Osias.
Assim como nos cinco volumes anteriores, os textos abrangem diversas gerações de homenageados, como os jovens autores Bruno Gaudêncio e Jeniffer Trajano. Gaudêncio, campinense, ganha perfil escrito pelo professor Johniere Alves Ribeiro, seu conterrâneo: “É um escritor que preenche sua estética, seja nos escritos artísticos ou em seus artigos e ensaios com o ‘tom de devir’ [conceitos de Gilles Deleuze e Félix Guattari]».
Por sua vez, Jeniffer ganha descrição da colega Anna Apolinário: “Nas palavras dela, a literatura emana seu poder de efabulação, ampliação e expressão da subjetividade humana”.
O diretor de Mídia Impressa da EPC, William Costa, assevera a importância dos lançamentos citados. Ainda que perfaçam projetos diferentes, eles têm em comum a missão de resgatar ou de divulgar o trabalho de figuras proeminentes de nossas letras. “Esses perfis biográficos cumprem o papel de um dicionário literário paraibano. Buscamos manter a sociedade paraibana informada sobre esses grandes talentos: aliamos essas histórias relevantes ao talento de quem as descreve”, assinala, sobre o Paraíba na Literatura VI.
A história de Areia e livro premiado de Marília Arnaud
Publicado originalmente pelo Ministério da Educação e Cultura, Brejo de Areia – Memórias de um Município faz um recorte histórico da cidade homônima até a altura em que foi publicado, em 1958. Horácio de Almeida, falecido em 1983, aborda ainda como o município viveu fatos históricos importantes para o estado, como a Revolta do Quebra-Quilos e a Confederação do Equador.
Thélio Farias, escritor e membro da APL, foi o responsável pelo texto de apresentação da nova edição. Ele recorda que o seu pai tinha, em casa, uma edição original do livro. “O livro me impressionou pela análise completa que ele fez do município. Fala não somente da geografia, mas passa também pela sociologia e pelos aspectos culturais que ele ressalta, como as execuções na forca, algo que me marcou muito quando li pela primeira vez, aos 20, 21 anos”, classifica.
Também de acordo com Thélio, a análise minuciosa de Brejo de Areia realça a voz do povo areiense em detrimento do retrato das elites, ao passo que o próprio Almeida tecia, sem medo, críticas à sociedade da época, que julgava preconceituosa e reacionária. “Essa reedição chega para ressuscitar um título essencial para a nossa cultura e a nossa história. Essa e outras obras são difíceis de serem encontradas ou estão inacessíveis, praticamente. Eu mesmo vi um exemplar de Brejo por R$ 450 no site Estante Virtual: a prova de que há demanda, mas que existem poucos exemplares circulando”, pondera.
Reencontrando Cipango
A primeira tiragem de A Menina de Cipango data de 1994 e também foi editada por meio de A União: Marília Arnaud garantiu essa publicação depois de ter vencido um concurso literário da Secretaria de Estado da Cultura (Secult).
Os 14 contos são divididos em duas partes — a primeira, dedicada aos temas juvenis. “Na segunda, as narrativas possuem enredos mais fortes. Mas, de qualquer forma, é um livro que serve ao adolescente e ao adulto. Exploro temas como a maternidade, o despertar da sexualidade na puberdade, a crueldade infantil, a solidão, a incomunicabilidade e a loucura”, detalha.
Marília sustenta que os textos retratam uma época diferente da que vivemos hoje, num mundo menos cosmopolita e sem internet. Ao mesmo tempo, ela atesta que o livro foi de suma importância para a consolidação de sua trajetória na literatura, além de representar o exercício de um gênero que muito aprecia.
“Uma pena que as editoras se recusem a publicar livros de contos, sob a justificativa de que os leitores preferem as narrativas longas. Esse estava esgotado há anos, hoje não encontramos cópias nem em sebos literários”, festeja.
William Costa, da EPC, revela que a Secretaria de Estado da Educação adquiriu um lote dos livros de Horácio de Almeida e Marília Arnaud, para distribuir entre escolas da rede estadual de ensino. O uso das obras em sala de aula será gerido pelas próprias instituições. “É a oportunidade para que novas gerações de estudantes tenham acesso a duas obras muito qualificadas. Estamos estudando novos títulos para darmos continuidade aos lançamentos desta coleção”, conclui.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 11 de fevereiro de 2025.