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No calor da poesia

publicado: 23/08/2024 10h02, última modificação: 23/08/2024 10h02
Sérgio de Castro Pinto lança hoje seu novo livro, no MAG Shopping: “Brando Fogo das Palavras”
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Sérgio de Castro Pinto: enfrentando as palavras em longas jornadas noite adentro | Foto: Rodolfo Athayde/Divulgação

por Daniel Abath*

Saídos do forno, os mais novos versos abrandados pela pena do consagrado poeta paraibano Sérgio de Castro Pinto chegam às prateleiras. Brando Fogo das Palavras (Editora Patuá, 2024) será lançado hoje, a partir das 18h, na Livraria do Luiz, no MAG Shopping. O livro conta com capa e ilustrações de Flávio Tavares e prefácio do poeta e crítico literário Expedito Ferraz Jr. Na oportunidade, o grupo Evocare fará a leitura de alguns poemas do autor e os compositores Paulo Ró e Adilson Medeiros executarão “Poema” e “Atos falhos”, textos de Sérgio musicados por ambos. O livro custa R$ 50 e será vendido no local.

“O título do meu livro seria ‘Exercício findo’, mas, infelizmente, o crítico de teatro e dramaturgo Sábato Magaldi já o havia utilizado para nomear uma de suas obras. Creio que esse título expressaria melhor a atmosfera do poeta notívago e já longevo, que aos poucos vai perdendo o preparo físico e mental para enfrentar, nas longas jornadas noite adentro, as palavras; palavras que escapolem feito enguias, que teimam em negacear o corpo”, explica Sérgio.

Diante desse fato, não coube a Sérgio qualquer alternativa, senão substituir o título primeiro por Brando Fogo das Palavras, extraído de um dos versos de seu poema, “escrever/ não escrever”, presente em seu livro O Cerco da Memória (Editora da UFPB, 1993): “escrever é um suicídio branco./ um consumir-se/ no fogo brando das palavras.// não escrever, um suicídio em branco./ um consumar-se sem metáforas”.

Vida, toda poesia

Dotado de uma poesia quase sexagenária, Sérgio estreou nas letras em 1967, com Gestos Lúcidos. Pertenceu ao Grupo Sanhauá, que arregimentou nomes como Marcus Vinícius, Anco Márcio, Marcos Tavares e Marcos dos Anjos e tinha como proposta integrar a produção poética paraibana aos movimentos de vanguarda, tais como o concretismo e a poesia práxis, entre outros, mas sem se submeterem ao ideário desses movimentos, buscando as bases de uma poesia nordestina de vanguarda.

“Na esteira de Manuel Bandeira, costumo dizer que as minhas influências são tantas quanto as estrelas do céu e os grãos de areia na praia. O primeiro a me influenciar foi o meu pai, autor do volume Páginas de um Diário, cujas crônicas tratam a respeito das pugnas entre liberais e perrepistas sob a ótica, sob o ponto de vista de uma criança. Depois vieram outras influências, sobretudo a de João Cabral de Melo Neto, cuja poesia personalíssima marcou toda uma geração de poetas”.

Para Sérgio, esta última influência foi, até certo ponto, nefasta, somente superada pela incorporação do humor e da ironia à dicção lírica, em uma espécie de contraponto com o tom sisudo e austero do autor pernambucano.

Obra em progresso

Dentre as obras de sua lavra, destacam-se: Gestos Lúcidos (1967), A Ilha na Ostra (1970), Domicílio em Trânsito e Outros Poemas (1983), O Cerco da Memória (1993), A Quatro Mãos (1996), Zôo Imaginário (2005), O Cristal dos Verões (2007), A Flor do Gol (2014) e Folha Corrida (2017). Publicou ainda obras ensaísticas, a exemplo de Longe Daqui, Aqui Mesmo: A Poética de Mário Quintana (2000) – originalmente, sua tese de doutorado defendida no Curso de Pós-Graduação em Letras da UFPB.

Outra produção destacada pelo autor foi um fascículo premiado e publicado pela Fundação Espaço Cultural da Paraíba, na qual o artista plástico John Monteiro, hoje radicado na Alemanha, quadrinizou o conto de Sérgio, “Cantilena”, também premiado no Concurso Nacional de Contos do Paraná. O poeta gravou ainda, no estúdio Peixe Boi, o disco Muito Além da Taprobana e de Pasárgada: Poemas de Sérgio de Castro Pinto por Sérgio de Castro Pinto (2015), com concepção gráfica de Vant Vaz, fotografias de Antonio David e fabricação da Pindorama Records.

Moderado com as palavras, Sérgio reconhece seu passo brando e prudente na poesia: “Me considero um poeta das coisas simples, miúdas, dos sobejos de Deus. E embora não seja um poeta contumaz, não sou um poeta bissexto, apenas produzo pouco. Sou um poeta do menos, não só com relação às palavras, já que os meus poemas, na sua grande maioria, são minimalistas, como também com relação à publicação de livros”.

Traduções

Recentemente o autor teve parte de seu poema “Camões/Lampião” traduzido para o inglês pelo professor emérito da Universidade do Texas, Fred Ellison. Terezinha Pereira, professora brasileira que leciona nos Estados Unidos, também traduziu alguns de seus poemas. Além disso, participou de várias antologias, entre elas, Os Cem Melhores Poetas Brasileiros do Século (Geração Editorial, 2001), Sincretismo: APoesia da Geração 60 (Topbooks, FCF, Fundação Rioarte, 1995), Antologia de Contistas Bissextos (L&PM, 2007) e O Cangaço na Poesia Brasileira (Escrituras, 2009), organizadas, respectivamente, por José Nêumanne Pinto, Pedro Lyra, Sergio Faraco e Carlos Newton Júnior.

Desde 1970, trabalha em parceria com Flávio Tavares, responsável pela capa de A Ilha na Ostra, ilustrações de A Quatro Mãos, capas e ilustrações de Zôo Imaginário e do atual lançamento, Brando Fogo das Palavras. Ele acrescenta que os professores João Batista de Brito e Hildeberto Barbosa Filho farão a apresentação da obra, pois foram eles, Hildeberto e João quem mais escreveram sobre seus livros.

“De minha parte, a escolha de ambos consiste num preito de gratidão. Procuro fazer com que a minha linguagem seja uma espécie de dublê dos sentimentos, de corpo das emoções, pois estas, quando à frente da linguagem, fazem muito barulho por nada. É o que eu tento”, declara. 

Livro tem capa e ilustrações de Flávio Tavares | Imagem: Divulgação/Patuá

Dicas

O que dizer a um autor iniciante? Apesar dos quase 60 anos de poesia, Sérgio se vê como aprendiz de sua arte, mas repete aquilo que escreveu no ensaio “Meninos eu vi(vi)! Sobre o Grupo Sanhauá”, a respeito dos jovens que perseveravam em redor da poesia: “Benfazejos arroubos os da juventude, a soberba desmedida dos jovens, virtudes sem as quais teríamos nos extraviado dos caminhos sempre tortuosos e íngremes da poesia. A perseverança, hoje, talvez seja o vocábulo mais exato para substituir as efusões da juventude perdida. Perdida? Não, pois creio que, de alguma forma, ela permanece na devoção à palavra, na profissão de fé na poesia”.

Sérgio lembra ainda de uma entrevista concedida ao também poeta, hoje editor, Linaldo Guedes, no ano de 2017, na qual foi indagado se valeram a pena os 70 anos de vida e os 50 de poesia. Sua resposta naquela oportunidade, nada arrefecida sete anos depois, foi a seguinte: “Mais moça do que o ancião de 70 anos, a poesia me é uma amante de 50 anos cujo relacionamento às vezes é conturbado, pois, arredia, caprichosa, quase sempre ela se entrega ao mutismo, ao silêncio mais sepulcral durante meses e meses. Em todo o caso, nesse relacionamento o poeta é um gigolô sustentado pela poesia, uma vez que ela o faz suportar os momentos de crise, o fardo da existência, os desequilíbrios emocionais. Apesar dos pesares, valeram a pena, sim”.

BRANDO FOGO DAS PALAVRAS
- De Sérgio de Castro Pinto.
- Editora: Patuá.
- Hoje, às 18h na Livraria do Luiz (MAG Shopping, Av. Gov. Flávio Ribeiro Coutinho, 115, Manaíra, João Pessoa).
- Entrada franca.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 23 de agosto de 2024.