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Obra aborda caso da menina Francisca

publicado: 25/10/2023 09h34, última modificação: 25/10/2023 09h34
Hoje, no município de Patos, no Alto Sertão paraibano, será lançado o livro ‘O Crime da Rua da Pedra’
Renato César Carneiro - Foto Alexandre Dias Divulgação.jpeg

Escritor e professor Renato César Carneiro é o autor do livro sobre o assassinato de maior repercussão, ao longo dos últimos 100 anos, no município de Patos - Foto: Alexandre Dias/Divulgação

por Guilherme Cabral*

Considerado pelo próprio autor do livro como o assassinato de maior repercussão, ao longo dos últimos 100 anos, no município, a morte da menina Francisca é tema da obra O Crime da Rua da Pedra – Realidade e ficção na história de um processo judicial em Patos-PB (Mídia Gráfica e Editora, 214 páginas, R$ 50), que o professor Renato César Carneiro lança hoje, a partir das 18h30, no auditório da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), localizado naquela cidade.

A obra contém algumas novidades, a exemplo das cópias do pedido de desaforamento, com o intuito de levar o caso a ser julgado em outra cidade, e do habeas corpus, que objetivava anular o processo, evitando, assim, o julgamento. O escritor disse que, com tal iniciativa, a ideia é marcar o centenário da criação da Cruz da Menina, surgida após a perpetração desse crime que ceifou a vida da garota, filha de retirantes tangidos pela seca e que, posteriormente, resultou na criação do Parque Religioso de mesmo nome, reconhecido como patrimônio imaterial pelo Governo do Estado em 2020, e que continua sendo ponto de peregrinação de devotos.

Trago documentação no livro, que possui 16 capítulos pequenos, mas também tive a ideia de fazer a parte ficcional da obra, já que só existe o resumo dos debates que ocorreram durante o júri - Renato César Carneiro

Durante a solenidade de lançamento, quem fará a apresentação é o historiador Damião Lucena, que auxiliou o autor no momento das pesquisas para a produção do livro. “Escrever essa obra só foi possível por causa da boa vontade desse historiador patoense, que me cedeu cópia do processo de julgamento. Eu também fiz pesquisas no arquivo do Tribunal de Justiça em Mangabeira, em João Pessoa, onde encontrei o habeas corpus e o pedido de desaforamento”, comentou Renato César Carneiro, que iniciou o projeto de realização desse projeto literário no final de 2022, já prevendo a aproximação do centenário de morte da menina.

“Sou de Patos, embora more na cidade de João Pessoa há 37 anos, e, como também sou historiador, não poderia deixar de produzir esse livro, que é o 15º que estou lançando, porque antes só escrevi sobre a história das eleições”, observou Renato César Carneiro. No intuito de elaborar seu novo trabalho, o autor ainda pesquisou na obra Crimes que Abalaram a Paraíba, do jornalista Severino Ramos. “Sou muito fã de Biu Ramos, por suas nuances, que aborda sobre o caso da Cruz da Menina e me vi na obrigação de resgatar esse caso, para que as novas gerações, inclusive os estudantes de Direito, tomem conhecimento”, disse ele.

César Carneiro comentou sobre os novos elementos presentes na edição. “Além do pedido de desaforamento, que foi solicitado sob o argumento de que os jurados não seriam imparciais, porque a menina já vinha sendo santificada pelo povo, e do habeas corpus, a obra ainda inclui outras novidades, que são as forças políticas que atuaram nos bastidores, para que o caso não fosse julgado, e a autoridade da capital federal, com nome e foto, que influenciou para que o processo fosse demorado e é a cereja do bolo, mas não antecipo detalhes por serem surpresas para os leitores”, afirmou o autor.

Parte ficcional

“Trago documentação no livro, que possui 16 capítulos pequenos, mas também tive a ideia de fazer a parte ficcional da obra, já que só existe o resumo dos debates que ocorreram durante o júri. Então, coloquei como os advogados e os promotores se pronunciaram e para isso o que me ajudou foi a experiência que tive como oficial de Justiça por quatro anos, quando era estudante de Direito no Unipê, em João Pessoa”, explicou Renato César Carneiro.

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Edição contém novos elementos, a exemplo das cópias do pedido de desaforamento, com o intuito de levar o caso a ser julgado em outra cidade, e do ‘habeas corpus’, que objetivava anular o processo, evitando, assim, o julgamento - Imagem: Mídia Gráfica e Editora/Divulgação

Ao lembrar detalhes do caso, o escritor informou que a garota Francisca tinha entre oito a 10 anos de idade, era conhecida apenas por esse nome e filha de retirantes. “A menina foi doada a um casal, que se tornou os seus padrastos, com os quais tinha uma vida de violência e apanhava constantemente. Absalão Emerenciano respondia pela luz elétrica e força da cidade de Patos e sua esposa, Domila, era dona de casa. Por causa das agressões, Francisca morreu e, dois dias depois do crime, ou seja, em 13 de outubro de 2023, o agricultor Inácio Lázaro encontrou o corpo da menina e registrou o fato na delegacia, para onde o cadáver, que tinha o crânio quebrado e um dos braços fraturados, entre outros ferimentos, foi transferido e reconhecido. Mas naquela altura dos acontecimentos, boatos já corriam a respeito de quem teria sido a autoria do assassinato. No local onde encontrou o corpo de Francisca, o rurícola fincou uma cruz de madeira, que passou a servir de orientação. As pessoas que por ali passavam, mantendo uma tradição religiosa, rezavam em sufrágio da alma da menina”, relatou o escritor.

“Pelo martírio que Francisca sofreu, bem como por causa da impunidade, o local, que fica na saída para a cidade de Pombal, passou a ser conhecido como a Cruz da Menina e ser visitado pelo povo, que começou a santificá-la, passando a considerá-la uma mártir do Sertão. Depois veio a construção de uma capela no local, construída, em 1929, pelo agricultor José Justino do Nascimento, para celebrar uma graça alcançada em um ano de estiagem. Em 1993, na gestão do então governador Ronaldo Cunha Lima, foi feita a edificação do Parque Religioso Cruz da Menina, cujo equipamento foi modernizado pelo governador João Azêvedo”, comentou Carneiro.

O autor informou que somente 11 anos depois do crime o processo foi desengavetado e houve a prisão do casal, na cidade de Campina Grande. César Carneiro disse que aconteceram três julgamentos, sendo o primeiro em 15 de junho de 1934, outro no dia 24 de outubro, e o último em 5 de junho de 1935, todos anulados e houve o arquivamento. “Atualmente, é mais difícil ficar impune, porque há leis que protegem as crianças e adolescentes e, inclusive, as mulheres”.

O professor já tem projeto para seu próximo livro. “A ideia é escrever sobre a literatura patoense, a respeito do jornalista e escritor Allyrio Meira Wanderley, que faleceu em 1955 e é um dos maiores nomes da literatura paraibana”.

O autor informou também que haverá um lançamento de O Crime da Rua da Pedra em João Pessoa, na Livraria A União, com previsão para o próximo mês, mas ainda sem data definida.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 25 de outubro de 2023.