Guilherme Cabral
Ele possui duas armas, mas ambas não provocam destruição, porém - muito pelo contrário - o bem ao ser humano. Elas são a palavra e o raciocínio rápido, as quais utiliza como ferramentas de trabalho. E o proprietário, o palhaço Cabeça de Espantalho, que é representado pelo ator e diretor paulista Odécio Antônio, radicado na Paraíba há oito anos, vai utilizá-las hoje e no dia 18 deste mês para - acompanhado de mais duas palhaças, companheiras de cena - fazer rir os clientes que estiverem frequentando, na hora do almoço, restaurantes localizados nos bairros do Cabo Branco e Manaíra, na orla marítima de João Pessoa. Com essa iniciativa, o artista vai retomar, após dois anos de ausência, as apresentações nas ruas, cuja modalidade é conhecida como de invasão.
“As minhas armas são a palavra e o raciocínio rápido para lidar com as situações inesperadas, pois é preciso estar atento a tudo e a todos”, justificou Odécio Antônio para o jornal A União. “Alguns donos de restaurantes me conhecem e sabem que eu trato bem os clientes”, disse o artista, acrescentando que, após a performance a ser realizada com as duas palhaças - com as quais integra o grupo Teatro Alternativo (Tal), do qual foi um dos fundadores em 2001, na Universidade de São Paulo, e que se espalhou por vários locais - vai passar o chapéu para arrecadar dinheiro entre os comensais que quiserem contribuir. “Vou matar as saudades”, confidenciou ele, referindo-se à retomada da modalidade invasão.
O estilo do palhaço Cabeça de Espantalho é mambembe. E, diferentemente das roupas e maquiagem multicoloridas, que são tradicionais na composição desse personagem, Odécio Antônio atua com figurino nas tonalidades preta e branca, desde as botas até o chapéu, que é preto, assim como o nariz. E, nos lábios e nas bochechas, aplica, de maneira que classificou de “sutil”, o vermelho. “É para trazer um ar de seriedade e resgatar os palhaços do cinema, como Charles Chaplin, Buster Keaton e o Gordo e o Magro, todos eles da linha clássica”, justificou ele a opção por vestir esse tipo de traje. “Sou um palhaço sério, mas, se na plateia tiver criança, ela vai receber o foco maior, porque a criança é mais verdadeira e sei que o palhaço desperta o imaginário lúdico. E para ela sei que vou transmitir a mensagem e aprender com elas, pois são capazes de nos surpreender”, garantiu o artista. E, caso se depare com algum garoto que demonstra medo diante da figura fantasiada, por causa de eventual trauma, ou por outro motivo, confessou ter uma tática para procurar derrubar essa barreira. “Fico à distância e tento me aproximar, explicando que o palhaço é só um homem que usa nariz e que pinta o rosto”, confessou.
Não importa quem integre a plateia, pois Odécio Antônio tem sempre uma maneira de atuar, conforme a faixa etária que assiste a sua performance. “Busco o riso inteligente para o adulto, com o uso da ironia, do sarcasmo e falo de sátira política, pois é um espaço onde se pode usar o humor de forma inteligente. E, para a criança, o riso é a partir do contato visual e entrego balões. Antes, eu entregava balas, mas deixei essa prática, por causa do açúcar que provoca cáries. Como já existe um lúdico nas crianças, procuro ouvir o que elas têm a dizer”, comentou ele.
A propósito, diante de um quadro tão duro que o Brasil passa, no momento, nas áreas política, econômica e social, uma pergunta precisava ser formulada para Odécio Antônio. Como é, para alguém que encarna um palhaço, induzir o espectador a abrir um sorriso? A resposta é que ele também possui uma maneira particular para superar esse obstáculo. “Em uma conjuntura de crise, as pessoas se identificam com o riso. Não é difícil fazer rir, mesmo na atual conjuntura difícil, porque, primeiro, o brasileiro tem esse espírito mais alegre de levar a vida. E, mesmo quando toco na política brasileira, procuro não tomar posição, ou procuro ouvir os dois lados, agindo com uma posição diplomática, apartidária, apesar de saber que as pessoas têm as suas posições políticas”, explicou .
A última apresentação de Odécio Antonio com seu personagem ocorreu no último dia 13 de outubro, para alunos da Escola Estadual José Vieira, localizada no bairro de Tambauzinho, em João Pessoa, dentro da Semana da Criança. Na ocasião, apresentou o espetáculo experimental intitulado Monólogo do palhaço mudo e mouco. Em situações assim, recebe ajuda de custo, mas o artista - casado com uma paraibana - já não depende apenas das performances do Cabeça de Espantalho, pois é coordenador de extensão do Centro Estadual de Arte (Cearte) e, desde 2011, ator do grupo de teatro Osfodidário. Ele também dirigiu e está montando o filme denominado Não tema, um documentário reflexivo cuja previsão de lançamento é para o primeiro semestre de 2017. E já atuou em 13 curtas-metragens e duas séries para a TV Brasil.
Uma curiosidade destacada por Odécio Antonio é que sua estreia no teatro ocorreu em 1996, quando, em sua cidade natal, São João da Boa Vista, foi convidado pela diretora Marly Marques para encarnar justamente um palhaço - seu primeiro papel na vida - no espetáculo intitulado Vem buscar-me que ainda sou teu, de Carlos Alberto Sofredinni e baseado na música do cantor e compositor Vicente Celestino. “Foi ela quem me lapidou para esse personagem”, lembrou ele, que usava seu próprio nome de batismo nas apresentações até que, em 2002, durante performance na cidade de Trancoso, na Bahia, as crianças o apelidaram de Cabeça de Espantalho, por causa da grande cabeleira, e, a partir de então, adotou esse nome artístico.