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Palco Giratório retorna à Paraíba

publicado: 25/04/2023 00h00, última modificação: 25/04/2023 15h45
Nesta semana, Campina Grande e João Pessoa recebem gratuitamente o premiado espetáculo ‘A Invenção do Nordeste’
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Peça do Grupo Carmin (RN), vencedora do Prêmio Shell, será encenada hoje, no Teatro Municipal Severino Cabral, em Campina Grande, e na próxima quinta-feira (27), no Teatro Santa Roza, na capital paraibana - Foto: Daniel Torres/Divulgação
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Foto: José Tellys Fagundes/Divulgação
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por Guilherme Cabral*

Espetáculo mais premiado em 2019, inclusive com o Prêmio Shell, na categoria Dramaturgia, a peça A Invenção do Nordeste será apresentada pelo Grupo Carmin (RN) hoje, a partir das 20h, no Teatro Municipal Severino Cabral, em Campina Grande, abrindo a temporada 2023 do Palco Giratório do Sesc, que está completando 25 anos de criação. Na próxima quinta-feira (dia 27), a montagem terá encenação no Teatro Santa Roza, em João Pessoa, no mesmo horário. Ambas as apresentações são gratuitas.

“Estamos ansiosos para voltar a Campina Grande, cidade onde já apresentamos o espetáculo antes da pandemia. A peça, que estreou em Natal, em agosto de 2017, é uma comédia leve, mas que trata de coisas pesadas, os estereótipos em relação ao Nordeste, construídos ao longo do tempo, como o de que é uma região onde há fome, seca e o povo é preguiçoso. Através do espetáculo, queremos mostrar o contrário, ou seja, que a região cresceu muito, nos últimos anos, e evoluiu em áreas como a educação, a ciência e a tecnologia”, disse a diretora paraibana Quitéria Kelly, que nasceu em João Pessoa e, aos 19 anos de idade, se mudou para o Rio Grande do Norte, onde fundou, com a atriz Titina Medeiros, há 16 anos, o Grupo Carmin.

Selecionado pelo Sesc para circular pelo Brasil entre abril e outubro, período em que será apresentado em 14 cidades de 12 estados do Brasil, A Invenção do Nordeste aborda o surgimento e a trajetória histórica da região, propondo a desconstrução da imagem tipificada do nordestino. Quitéria Kelly disse que foi motivada a realizar o projeto por causa de reações xenófobas, manifestadas na internet, durante as eleições de 2014. Para isso, ela disse ter encontrado no livro A Invenção do Nordeste e Outras Artes, do professor e historiador paraibano Durval Muniz de Albuquerque Júnior, “um ponto de partida para refletir sobre as divisões sociais brasileiras. Ficamos apaixonados pelo livro, quando o lemos”, contou a diretora e atriz.

Durante a pesquisa, o Grupo Carmin mergulhou nos mecanismos estéticos, históricos e culturais que contribuíram para a formação de uma visão reducionista do Nordeste. A partir daí, Pablo Capistrano e Henrique Fontes escreveram uma autoficção em que um diretor é contratado por uma grande produtora de fora do Nordeste para preparar dois atores nordestinos na disputa pelo papel de um personagem nordestino. Durante a preparação, a identidade nordestina entra em cheque. Afinal, existiria apenas uma identidade nordestina?

“O espetáculo retrata o teste de elenco entre dois atores para se saber quem vai interpretar um personagem nordestino. Em certo momento, o produtor pede que o sotaque seja mais enfatizado e a peça também brinca com isso. Só que o espetáculo também procura desconstruir outras imagens criadas pelo imaginário coletivo em relação ao Nordeste, como as de que é só cangaço e miséria. Muita coisa mudou e o Nordeste agora está moderno e bombando”, explicou Quitéria Kelly, que, recentemente, integrou o elenco da novela Mar do Sertão, da Rede Globo.

Assinada por Henrique Fontes e Pablo Capistrano, a dramaturgia levou o prestigiado Prêmio Shell. “Jamais esperava receber essa premiação, porque, na época, a peça estava concorrendo, por exemplo, com dois musicais, sendo um sobre Elza Soares e outro sobre Bibi Ferreira. Sabemos o quanto se investe para a produção de musical, enquanto o nosso espetáculo foi de R$ 50 mil. Essa premiação serviu para atrair os olhares da crítica nacional, que passaram a se voltar para cá. É difícil fazer teatro, mas esse prêmio contribuiu para mostrar a outros grupos que é possível continuar trabalhando para se obter êxito”, confessou Quitéria Kelly, lembrando que, no mesmo ano de 2019, a peça ainda levou os prêmios Cesgranrio, do Humor, APTR, Botequim Cultural e Questão de Crítica.

Já o paraibano Rafa Guedes, que interpreta um dos atores no teste – sendo o outro Igor Fortunato –, informou que a peça ainda inclui a exibição de vídeos. “O espetáculo resulta de pesquisa aprofundada nos mecanismos históricos e estéticos que contribuíram na formação da visão pequena do Nordeste brasileiro. Mas a peça é muito instigante, procura desconstruir imagens de que a região é seca e de solo rachado e, nesse processo, vai enxertando, através das falas, de forma irônica, o que foi obtido através da pesquisa para a realização do espetáculo, na qual Henrique Fontes interpreta o produtor”, comentou o ator.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 25 de abril de 2023.