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Palco Tabajara traz a ancestralidade no encerramento

publicado: 25/04/2023 11h54, última modificação: 25/04/2023 11h54
Hoje, em João Pessoa, nas últimas apresentações da edição, as bandas Agoiê e Gabi Blue & os Dendês sobem ao palco com ritmos diversificados
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Celebrando os ritos e cultos afro-brasileiros com repertório autoral, Agoiê se prepara para o lançamento de seu primeiro single: a música ‘Ogunhê’, que vai abrir o show - Foto: Thercles Silva/ Divulgação
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Passeando entre o pop e a MPB, Gabriela Conceição, da banda Gabi Blue & os Dendês, trará músicas com representatividade do universo LGBT - Foto: Salinê /Divulgação
Agoiê - Foto por Thercles Silva-4439.jpeg
Gabi Blue - Foto Salinê Divulgação 1.jpg

por Joel Cavalcanti*

A Paraíba é cheia de exemplos de artistas locais que migram para diferentes centros do país, em busca de maior visibilidade e oportunidades na carreira. Muitos deles saem logo cedo, antes mesmo de terem seus nomes valorizados na terra natal. Mas o fluxo inverso também existe, e esse intercâmbio tem trazido mais riqueza e diversidade cultural ao estado. O Palco Tabajara de hoje apresenta duas bandas lideradas por mulheres negras que realizaram esse percurso: Agoiê, da paulista Helô Uehara, e a baiana Gabriela Conceição, de Gabi Blue & os Dendês. Radicadas em João Pessoa, os grupos fizeram da cena local uma forma de estimular processos criativos e explorar novas formas de expressão.

A nona temporada do programa Palco Tabajara, que celebra os 20 anos da Usina Cultural Energisa, será encerrada a partir das 20h de hoje, na Sala Vladimir Carvalho, com entrada gratuita ao público. Depois de seis semanas e 12 atrações dos mais variados gêneros musicais, os últimos shows desta edição serão transmitidos pela Rádio Tabajara 105,5 FM e, em vídeo, pela TV Assembleia ou através das redes sociais das emissoras. São formas de se conectar com a música que é produzida na Paraíba, independentemente do estado onde os artistas foram registrados.

Helô Uehara é natural de Barretos, em São Paulo, e chegou em João Pessoa há sete anos. “Na Paraíba, me reencontrei com minha ancestralidade. Encontrei parcerias que acreditaram no meu projeto, que sonham junto comigo e possibilitam sua realização. A força dos artistas desta terra é uma inspiração potente e alimenta minha arte”, destaca a artista que em 2017 formou o grupo de samba de terreiro Agoiê. No Palco, Helô estará ao lado de Mel Vinagre (voz e percussão), Cristiano Oliveira (voz, violão e viola), Naomi (voz e cavaquinho) e Naldinho Repick (percussão).

O termo samba de terreiro é definido pela vocalista do Agoiê como uma manifestação de festejos e bailados realizados geralmente em espaços de terra batida onde se celebram ritos e cultos afro-brasileiros. Essa vertente do samba exalta o lugar ancestral onde o samba surgiu, como por exemplo, a casa de Tia Ciata, no Rio de Janeiro. “Na cena cultural paraibana, ainda é um grande desafio o enfrentamento do racismo religioso que sistematiza nossa sociedade. Mas o encantamento que percebemos em nosso público nos inspira e fortalece a resistência de nosso trabalho”, acrescenta a artista que é também formada em Medicina.

No programa de encerramento da edição, Agoiê vai apresentar um repertório predominantemente autoral, a exemplo das músicas ‘Jijidi Leguá’, ‘Balanço do Mar’ e ‘Paraíba Feminina’, entre outras. Haverá ainda um cover das canções ‘É D’oxum’, de Gerônimo, e ‘Emoriô’, de Gilberto Gil e João Donato. A banda se prepara no momento para o lançamento de seu primeiro single, a música ‘Ogunhê’, que abre o show de hoje. De autoria de Helô e oferecida a Ogum, a canção tem a contribuição de muitos paraibanos ligados ao samba e tem previsão de lançamento marcada para o dia 9 de maio. Ela foi gravada no estúdio Peixe Boi, com mixagem e masterização de Marcelinho Macedo, e produção musical e arranjos por Potyzinho Lucena.

“No Agoiê, pedimos licença a toda ancestralidade do samba para compor essa história com nossas canções autorais, exaltando linguagens afro-indígenas, sagradas e ancestrais, que são as matrizes do samba e nossa cultura popular, e assim, honrar nossas fontes de inspiração e axé. Nosso objetivo é promover o resgate da enorme contribuição do povo preto e indígena na cultura popular brasileira”, afirma Helô. Quem também chegou pisando nesse chão devagarinho foi a soteropolitana Gabi Blue, que credita ao destino sua chegada na Paraíba, há pouco mais de um ano.

A alteração de endereço foi só a primeira de uma série de mudanças, que atingiu suas composições, a base rítmica das músicas e até o nome artístico. “A pretensão de ter vindo para cá não tinha a ver com a música, mas foi aqui que eu me alertei que deveria voltar ao meu desejo maior, que é a música. O que João Pessoa fez foi abrir portas para ser uma artista nova na cidade, por ter uma característica diferente das pessoas daqui. E essa construção do público é algo que está acontecendo ainda, aos poucos”, considera a artista.

A apresentação no Palco Tabajara vai mostrar que, na Paraíba, Gabi Blue deixou de lado o formato mais acústico de seus shows, com voz e violão, para se lançar com arranjos que mesclam sonoridades que ficam entre o pop e a MPB, mas com temperos inspirados nas referências baianas. “Já carrego isso naturalmente, então a gente traz muitas coisas que tenham um ritmo e letra pop”. Outra mudança diz respeito à escolha do repertório com letras que revelam outras formas de amar e de se relacionar, e que estavam silenciadas antes da migração da artista. “São músicas que trazem muita representatividade para a gente, do universo LGBT e, em sua maioria, de mulheres”, conta Gabi.

Entre as músicas que estão no setlist de hoje estão ‘Molho Madeira’, de Ellen Oléria; ‘Vermelho’, de Gloria Groove; e ‘Pelejei’, de Marina Sena. Entre as autorais, ela apresenta ‘Por menor’, ‘Não tem condição’ e ‘Psicodélico’, que será divulgada em formato de single nas plataformas de áudio no próximo mês. “É muita ousadia fazer um show em que a maioria do repertório é desconhecido, por ser algo seu e que ninguém nunca ouviu, mas eu tenho a necessidade gigante que isso aconteça e, por isso, eu me jogo. Essa será uma apresentação nova e inusitada em que vamos dar muito de nosso coração e de nossa alma”, adianta Gabi, que, além de cantar, toca guitarra, e terá a companhia de seus Dendês: Samuel Dreher (guitarra), Marcos Mateus (bateria) e Bianca Dias (baixo).

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 25 de abril de 2023.