Quase 22 mil pessoas já foram recepcionadas pela Onça Caetana de quatro metros de comprimento instalada desde maio no Museu de Arte Popular da Paraíba, em Campina Grande. Uma figura imponente que convida os visitantes para a exposição Mostra Movimento Armorial 50, que reúne mais de 140 obras de artistas plásticos importantes para essa matriz cultural. Mas para a representação completa do universo imaginado por Ariano Suassuna faltava um elemento fundamental nessa história: a música. É por isso que entra em cena, hoje, uma série de atrações musicais que acontecem gratuitamente até o próximo domingo (dia 6), no Teatro Municipal Severino Cabral.
Pela primeira vez no Nordeste, o projeto Encontros Petrobras de Música Armorial estreia às 19h de hoje, com a Aula Espetaculosa – do Mendigo ao Pintor, comandada pelo artista plástico Manuel Dantas Suassuna, filho de Ariano, que conduz a plateia por uma imersão lítero-musical sobre as influências armoriais que recebeu desde a infância, e pelas memórias musicais que fazem parte de sua formação artística. O espetáculo é permeado de histórias e afetividade da relação entre pai e filho. Manuel Dantas terá a companhia da cantora pernambucana Isaar França, que foi parceira de Ariano nas aulas-espetáculo que ele ministrava em todo o país. Ambos serão acompanhados pela violeira e pesquisadora musical Lais de Assis.
Começar a programação pela apresentação de Dantas não é algo fortuito. “Essa aula abre um canal de afeto. É nela que se fala das questões sobre memória e se faz reverências a pessoas muito importantes para o Armorial”, justifica Regina Rosa de Godoy, idealizadora e produtora da Mostra. Entre as histórias que aproximam a plateia da convivência em família está a própria justificativa do nome da aula. É que quando Dantas era criança, costumava dizer ao pai escritor que almejava ser mendigo, ao que Suassuna sempre apoiava. Mas um dia, Dona Zélia, esposa de Ariano, chega nervosa avisando que agora o desejo do menino agora era de ser ladrão. ‘Olha só, ele agora já tem aspirações’, teria dito o pai. “O espetáculo é quase um cerimonial, anunciando o que está por vir durante a semana”, explica Godoy.
E o que virá em seguida a cada dia da programação é como a montagem peça a peça de um mosaico com as várias influências do Movimento Armorial. Amanhã, por exemplo, haverá uma homenagem da cantora Leticia Torança, através do espetáculo cênico A Mãe Essência, a Antonio Madureira, que desde os 21 anos compartilhava com Ariano Suassuna o sonho de ter uma música brasileira de raízes populares que realizasse um mergulho profundo nos folguedos e nos grupos instrumentais de tradição nordestina. Torança estará acompanhada do Grupo Aralume, apresentando um repertório inspirado no maestro, violonista e compositor pernambucano que criou o Quinteto Armorial. O Quinteto teve longa trajetória em Campina Grande, para onde se mudaram os músicos vindos do Recife depois de serem contratados como professores da UFPB.
“Campina Grande tem uma relação histórica com o Movimento Armorial. A cidade abrigou os músicos do Quinteto. E nós fomos muito bem recebidos lá. Levar a Mostra para lá também foi decisão artística, mas também de produção. Em João Pessoa não tínhamos um local disponível de fácil acesso para a população para abrigar a Mostra”, justifica a coordenadora. Esse laço com a Rainha da Borborema será mais bem explorado na próxima sexta-feira (4), quando a noite será comandada por artistas locais. O grupo Batuque Nagô comanda a programação ao lado Companhia de Projeções Folclóricas Raízes e o grupo de cultura popular Ariús para um espetáculo marcado pelas cores, ritmos, batuques e tradições do maracatu, coco e cavalo marinho.
Já no próximo sábado (5), quem assume o palco do Severino Cabral é a música instrumental da violinista paulistana Ana de Oliveira e do compositor e multi-instrumentista pernambucano Sérgio Raz. Ele tem uma forte ligação com o Armorial e, entre 2008 e 2014, participou como violinista do grupo que acompanhava o mestre em suas aulas-espetáculo, além de integrar o Quarteto Romançal, liderado por Antonio Madureira. No último dia dos Encontros Petrobras de Música Armorial, um dos mais representativos grupos de câmara do Brasil: Quinteto da Paraíba. Transitando entre a música de concerto e a música popular, o grupo é integrado por Ronedilk Dantas, Anderson Carvalho, Ulisses Silva, Nilson Galvão e Xisto Medeiros.
“Já foram mais de 250 mil pessoas indo para a exposição apenas em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília. Por esses espaços, o que a gente percebe é que existem muitos artistas que continuam influenciados por esse movimento, que é quase orgânico, mesmo que eles não percebam. É um movimento que está vivo e segue pulsando”, reforça Regina Rosa de Godoy. Os ingressos para todas as atrações são gratuitos, mas é necessário fazer as reservas na plataforma do Sympla (www.sympla.com.br). A promoção e o patrocínio são da Petrobras, através da Lei de Incentivo à Cultura.
Antes que a exposição itinerante se despeça de Campina Grande, no dia 20 deste mês, e rume para Recife (PE), haverá ainda, entre os dias 9 a 13, os Diálogos Petrobras sobre Arte Armorial. O evento vai acontecer no miniteatro Paulo Pontes, um anexo do Teatro Municipal Severino Cabral, reunindo convidados representativos para tratar principalmente sobre literatura e dança em palestras sob curadoria de Carlos Newton Júnior, um dos maiores especialistas na vida e na obra de Ariano Suassuna.
Confira algumas das atrações dos Encontros Petrobras de Música Armorial
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 2 de agosto de 2023.