Corruptela do Museu de Arte Moderna de Nova York, mais conhecido como MoMA, o MaMA (Museum of Animated Modern Art) aparenta ser um museu normal, não fossem as obras ali expostas. No jogo eletrônico Please, Watch the Artwork, desenvolvido pelo belga Thomas Waterzooi, o fictício espaço artístico abriga pinturas vivas, semelhantes a gifs animados, o que é percebido pelo jogador enquanto operador de monitoramento das câmeras de vigilância do local. A data de lançamento oficial ainda não foi divulgada.
Em conversa com A União, o criador do jogo de suspense/terror que faz uso de pinturas reais do estadunidense Edward Hopper (1882-1967) como pano de fundo para a trama — entre outras telas, figuram Automat (1927) e Nighthawks (1942) como cenários jogáveis —, deu mais detalhes sobre o spin-off de Please, Touch the Artwork (2022) e Please, Touch the Artwork 2 (2024), ambos de sua autoria.
“Os dois primeiros jogos já são bem diferentes, mas sinto que eles têm esse aconchego em comum: você nunca pode realmente perder e não há pressão de tempo. Meu novo jogo traz a pressão do tempo e um game over, e é mais sombrio, aumentando a possibilidade de estresse–paranoia. Mas todos eles têm muito humor, isso é algo que não consigo evitar”, explica.
Famoso pelas representações de solidão e isolamento urbano, Hopper foi caminho plausível. “Eu queria fazer um jogo com temática de terror. Senti que o trabalho de Hopper aproximava-se da estética mais sombria que eu buscava. As pinturas de Hopper costumam ser muito voyeurísticas, e somos culturalmente ensinados que é indelicado investigar a vida privada das pessoas, por isso nos sentimos estranhos fazendo isso. Eu queria amplificar esses sentimentos adicionando animação, som e alguma forma de narrativa abrangente: o palhaço triste”, pontua.
Please, Watch the Artwork engrossa o caldo do subgênero “anomalia”, inaugurado por games como I’m on Observation Duty (2018) e The Exit 8 (2023), nos quais o jogador assume o mesmo papel de um arguto observador por ambiências em que nada de novo parece acontecer. A quebra do marasmo advém do elemento loop, o eterno retorno a um mesmo quadro, o que subverte o contexto “normal” da cena, suscitando o inusitado.
Soa como a função precípua de uma obra de arte. Questionado sobre o recurso, Thomas afirma as potencialidades do jogo em sua empreitada referencial. “Funciona bem para conhecer as pinturas de um artista. A jogabilidade força você a estudar e lembrar como a obra de arte se parece, cada pequeno detalhe. Também ensina o nome das pinturas (algumas anomalias precisam ser relatadas por localização). Suavizei o aspecto de terror, geralmente, associado ao gênero e optei por uma vibe assustadora e bem-humorada, sem monstros ou sustos. Mais David Lynch [1946-2025] do que Stephen King”, comenta.
Thomas Waterzooi iniciou sua trajetória como estagiário na Larian Studios (responsável pelo aclamado Baldur’s Gate 3). Depois, mudou-se para Copenhague para trabalhar na IO--Interactive, no reboot de Hitman, mas decidiu, desde 2016, que não iria mais trabalhar com jogos cuja mecânica principal fosse a violência, caso da maioria dos chamados AAA, os jogos eletrônicos de maior orçamento de produção.
“Decidi, então, começar minha jornada como desenvolvedor independente, criando jogos casuais acessíveis para pessoas que não jogam com frequência, mas têm outros interesses adultos, como arte, cultura e sociedade”, ele conta. “Adicionar esses tópicos aos jogos foi minha estratégia para atingir um público diferente. Digamos que eu quisesse fazer um jogo que minha mãe pudesse jogar”.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 30 de setembro de 2025.