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Produção de cordel ainda é muito forte na Paraíba

publicado: 22/04/2018 00h05, última modificação: 22/04/2018 01h58
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Estado tem mais de 200 cordelistas em atividade entre novos e antigos e mulheres já produziram 125 títulos - Foto: Divulgação

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Jamarrí Nogueira

Para aqueles que acham que o cordel acabou, é bom tirar o cavalinho da chuva. Pelo menos na Paraíba, a produção – conforme quem é do ramo – ainda é grande. Pesquisa realizada pelo arte-educador Bento Júnior mostra que o Estado ainda tem mais de 200 cordelistas em atividade e que essa produção tem sido enriquecida por jovens artistas, inclusive mulheres. Na terra de Leandro Gomes de Barros (paraibano considerado o maior cordelista do Brasil, cujo centenário de morte foi comemorado no mês passado), o cordel vive!

“Tenho andado muito pelas capitais nordestinas e noto em mais de 10 anos de pesquisa que o cordel vem cada vez mais me surpreendendo pela efetivação desta arte e por mais pessoas se interessarem pela literatura de cordel. As regiões hoje na Paraíba que se concentra a maior propaganda do cordel está em Campina Grande, em Guarabira e em João Pessoa”, disse Bento Júnior.

O pesquisador enumera uma lista de cordelistas: Sander Brown, Chico Mulungu, Merlânio Maia, Thiago Monteiro, Tiago Alves, Sander Lee, Anne Ferreira, Anne Karolynne, Pádua El Gorrión, Silvinha de França, Célia Castro, José Dantas, Zé Lacerda, João Dantas, Severino Honorato, Artur Silva, Maria Gordelivie, Medeiros Braga e Francisco de Assis. Também os pernambucanos [radicados na Paraíba] Oliveira de Panelas, Marcelo Soares, Marco Di Aurélio e Fábio Mozart e o piauiense Beto Brito [autor do maior cordel do mundo]. 

Se você tem menos de 30 anos de idade, é possível que pense que cordel “é coisa de gente velha”. O pior é que faz algum sentido. Eu disse ‘algum sentido’... Conforme Bento Júnior, os cordelistas precisam abordar temas que chamem a atenção da juventude. Precisam modernizar o cordel.

“O jovem se distancia do cordel porque ele também se distancia do jovem. É preciso fazê-lo mais acessível e buscar temas que deixem os jovens mais compenetrados na sua própria existência e que haja a possibilidade de também criar no cordel temas educativos que em muito servirá para o aprendizado das nossas crianças”, argumentou Bento.

Atualmente, de acordo com o pesquisador, há vários cordéis que tratam temas especificamente infantis. Ele destaca a pernambucana Mariane Biggio, autora de “O Romance do Homem da Meia-Noite com a Mulher do Dia para Crianças”.

Desde a década de 1990, Bento Júnior realiza atividades em salas de aula com crianças e adolescentes atividades em torno do cordel. Um dos resultados foi o lançamento do cordel ‘A menina namoradeira’, escrito por adolescentes. Já através do EJA (Educação de Jovens e Adultos) saiu o cordel ‘A carta da viúva’.
 
Academia de Cordel do Vale do Paraíba

A criação da Academia de Cordel do Vale do Paraíba, presidida pelo poeta Sander Lee, é de suma importância para o fomento à produção cordelística. Em três anos de atuação, a Academia de Cordel do Vale do Paraíba, na cidade de Itabaiana, já tem reconhecimento internacional.

Em dezembro de 2017, quatro poetas da Academia (Fábio Mozart, Josafá de Orós, Sander Lee e Thiago Alves) foram homenageados pelo Museu de La Palabra, da Fundação César Egido Serrano, em Barcelona, Espanha, com o título de “Embaixadores da palavra”.  A Academia também recebeu a comenda pela produção do “Sarau da Palavra”.

Sander Lee conta que o mais novo projeto que vem sendo desenvolvido pela ACVPB é o Cordel na Rádio Comunitária, que gerará DVD e livro com as obras dos poetas participantes. “O Cordel encontra-se em plena pujança! Está na televisão, com Braulio Bessa. Está na Academia, através das monografias, dissertações e teses. Está na música de Zé Ramalho e Alceu Valença. Está na dança armorial de Antônio Nóbrega”, declarou Sander.

“A Academia tem realizado oficinas de cordel para crianças e adolescentes, aproximando os jovens da arte da poesia popular, incluindo técnicas de xilogravura, estrutura e tipos de estrofes, rima e ritmo, até a produção literária de cordéis feitos pelas próprias crianças. Essas experiências têm se propagado pela Paraíba, nas escolas públicas e particulares”, disse Fábio Mozart.

Na Paraíba, conforme Mozart, o livro “Na memória da tradição – Fontes de informação em literatura de cordel”, lançado pela Editora UFPB em 2017, com equipe comandada pela professora Beth Baltar, relaciona mais de 200 “poetas de bancada” em atuação no Estado. Há 30 mulheres cordelistas, que já produziram 125 títulos. “Na Academia de Cordel do Vale do Paraíba, composta por 40 poetas, cinco são mulheres assumindo sua identidade autoral”, informou Mozart.
 
Cordel na Internet

A tradição de vender o cordel pendurado em barbantes ou mesmo em tabuleiros pode estar com os dias contados. As inovações tecnológicas e a busca de novos leitores fez com que diversos cordelistas passassem a divulgar seus trabalhos na Internet. O cordel perdeu o papel, mas não perdeu a poesia.

Merlânio Maia aderiu às tecnologias, acreditando que é necessário fazer uso de todos os recursos para a divulgação e manutenção do cordel. Seu trabalho encontra leitores em seu blog e também através de divulgações nas redes sociais e através de aplicativos de troca de mensagens. Merlânio também faz uso de postagens de vídeos no YouTube.

“Os mais velhos criaram um círculo muito fechado para a produção e consumo do cordel”, criticou Merlânio, que defende a modernização dos formatos de divulgação. “O formato original do cordel está sumindo. Tem muita gente migrando para a Internet”, alertou ele, enfatizando que o cordel vindo de Portugal já não mais existe por lá.
 
Mulheres cordelistas

Houve um tempo em que mulheres só podiam lançar cordéis com pseudônimos masculinos. Ainda bem, as coisas mudaram. Recentemente, a Academia Sergipana de Cordel lançou ‘Das Neves às Nuvens’, uma coletânea que reúne cordéis de mulheres cordelistas sergipanas. Essa academia é presidida pela cordelista e professora Izabel Nascimento.

Conforme Bento Júnior, a paraibana Maria das Neves Pimentel foi uma das primeiras a enveredar na produção de cordel. Ela é mãe do folclorista Altimar de Alencar Pimentel (1936-2008). Primeiro cordel de Maria das Neves foi “O Violino do Diabo”, com ela usando o pseudônimo de Altino Alagoano.

Na cena contemporânea da Paraíba, destaque para a cordelista Fátima Coutinho. Uma das primeiras obras da professora foi “A vida da mulher”. Entre os cordéis assinados pela professora estão “As oito propostas para acabar com a fome no mundo”, “A luta de um povo na sua escola em Santa Rosa” e “De cordel de mulher muito se tem a dizer”.

Destaque, ainda, para a atuação das cordelistas paraibanas Luciene Soares, Anne Ferreira, Anne Karolynne, Silvinha de França, Célia Castro e Maria Gordelivie. Bento Júnior também enfatiza a importância das cearenses Dalinha Catunda e Maria Anilda, e da pernambucana Mariane Biggio. As poetas Dalinha Catunda e Rosário Pinto são autoras do blog “Cordel de saia”.

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