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Projeto ‘Palco Aberto’ traz arte de rua para a Funesc

publicado: 20/05/2018 00h05, última modificação: 19/05/2018 13h50
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Os artistas que desenvolvem números circenses nas ruas, se encontram semanalmente em projeto realizado na Funesc - Foto: Marcos Russo

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Jamarrí Nogueira

Uma apresentação artística que dura em torno de um minuto. Graciosidade e leveza circenses em um local tenso e acelerado, onde o artista recebe aquilo que o público acha justo... Em cruzamentos de João Pessoa, tendo os faróis dos veículos  como iluminação e o semáforo como ampulheta, artistas de várias partes do mundo têm se apresentado com cada vez mais frequência. De maneira geral, são artistas com números circenses (legítimos representantes da arte de rua).

Malabaristas (também com objetos em chamas e facões) e mágicos colocam-se sob o semáforo e, depois, passeiam entre os carros em busca do ‘pagamento do ingresso’. São profissionais reconhecidos por lei federal (a 5.429, de junho de 2012, que regulariza apresentações em espaços públicos da cidade e impede que artistas sejam detidos ou sofram represálias por parte das forças de segurança). A organização cresceu nos últimos cinco anos e os artistas criaram um projeto na Fundação Espaço Cultural da Paraíba, em João Pessoa: o ‘Palco Aberto’.

“A ideia era fazer uma vez a cada 15 dias, mas viabilizamos um encontro semanal”, disse o argentino Gustavo Cruces. A grande quantidade de artistas e o poder de mobilização, conforme ele, fizeram com que os encontros se tornassem regulares. Sempre às segundas-feiras, a partir das 19h, dezenas de artistas de rua se encontram no Teatro de Arena, para a realização do ‘Palco Aberto’, um espaço para ensaios que podem ser assistidos pela população. O colombiano Stiven Turizo diz que é preciso divulgar esse trabalho artístico.

“Há um trabalho social em nossas atividades. Queremos a unificação da cultura latino-americana, reunindo as diferentes artes. Esse encontro semanal aqui no Espaço Cultural torna mais profissional a cena dos artistas de rua”, declarou Turizo. Para Cruces, João Pessoa precisa mirar no exemplo de Recife e Olinda, em Pernambuco. “Eles têm uma cena mais organizada”. João Pessoa tem material humano de qualidade e já avançou no processo de organização.

O colombiano Carlos Isaza lamenta ainda haver muito preconceito com relação ao trabalho dos artistas de rua. Assim como os demais profissionais, ele comemora a lei federal 5.429, mas destaca que a realidade das ruas oferece muito prazer e reconhecimento, mas também muitos riscos. “Tem muito preconceito. Dizem que a gente não quer trabalhar. Parte do público não percebe que somos profissionais e que precisamos de treino e dedicação”, afirmou Isaza, que já foi mágico, mas hoje trabalha com malabares.

E Isaza conhece bem os perigos de trabalhar na rua. “Um motorista já me mostrou uma arma e disse que eu tinha que sair de lá [do semáforo] e ficar calado. E falou assim pra mim: ‘olha o que eu tenho para você [mostrando o revólver]’. Ele me viu como um bandido! Sou um profissional”, lamentou Isaza. Ele é casado com a goiana Ana Sampaio, também artista de rua. Ana também conhece bem de perto os riscos de ser mulher e trabalhar em um semáforo. Mas, essa é uma outra história...

Sinal de assédio

Não é fácil ser mulher nessa sociedade machista, responsável por diversos tipos de violência e diversos tipos de assédio. A goiana Ana Sampaio, casada com também artista de rua Carlos Isaza, trabalha com um sorriso no rosto. É uma de suas marcas registradas. Mas, nem sempre é fácil manter o sorriso. “O assédio é grande. Eu fazia apresentações com bolinhas, mas passei a fazer com facões [malabarismos] porque o povo respeita mais e assedia menos”, contou Ana.

A artista deixou a casa da família em Goiânia (GO) há dois anos. Em tão pouco tempo, já passou por diversos estados do País. “A parte mais difícil é ficar longe da família. Mas, é melhor ser pobre andando que ser pobre parado. Ninguém fica rico fazendo malabares, mas conhece muita gente e muitos lugares”, disse a artista, que – durante suas apresentações – costuma usar uma camiseta onde é possível ler ‘Sorrir é de graça’.

A catarinense Eliana Moreira também está morando em João Pessoa e enveredou pela arte de rua há dois anos. “Comecei no Rio de Janeiro, após deixar Joinville. “Saí para fazer crochê e me descobri artista de rua”, disse ela. Eliana classificou como humilhante para profissionais como ela ter de enfrentar o assédio masculino. “Assediam bastante. Às vezes pagam pela apresentação e dizem ‘tome porque você é bonita’ ou ‘tome porque gostei do seu cabelo’”, contou Eliana.

Ela falou já ter sofrido diversos tipos de assédio. Já sofreu, inclusive, uma tentativa de sequestro, enquanto trabalhava em um semáforo. Eliana foi assediada por um motoqueiro. Ignorou. “Pois ele voltou e quis me obrigar a subir na moto para me levar de lá. Queria me levar... Gritei e pedi socorro. Ele fugiu”.

Arte em família

A chilena Camila Silva e o equatoriano Angelo Choez são exemplos de vida mambembe. O casal já passou por quase todos os países da América do Sul, sempre se apresentando nas ruas. Mãe do pequenino Luhan Silva, Camila não pensa em levar outra vida. Ela e o marido trabalham com bolas de futebol. “Eu com três. Ele com cinco”. Em três anos de trabalho como artista de rua, Camila já passou por Chile, Colômbia, Peru, Equador, Paraguai, Argentina e Bolívia. Antes de vir morar em João Pessoa, passou por Ceará e Amazonas.

O argentino Juan Martin está há um ano no Brasil. Já passou por Alagoas, Sergipe, Bahia, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Um dos diferenciais nas apresentações de Martin nos malabares é o uso de uma camisa do Flamengo. Detalhe: ele é torcedor do Boca Juniors. “É marketing! Tem quem pague só porque estou com a camisa do Flamengo”, brincou o argentino.