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Quarteto no trio

publicado: 26/02/2025 09h35, última modificação: 26/02/2025 09h35
Uma das atrações do Muriçocas, hoje, é o Trio Maravilha, formado por quatro mulheres de estilos diversos: Val Donato, Sandra Belê, Ana Regina Limeira e Thaíse Porto
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Thaíse, Val, Sandra e Ana Regina: todas participando do momento de todas | Fotos: Rickson Riccelli/Divulgação (1); Thercles Silva/DIvulgação (2); Kate Joenne/DIvulgação (3); Cláudia Oliveira/DIvulgação (4)

por Esmejoano Lincol*

O nome do Trio Maravilha vem do tradicional veículo que conduz os artistas nos festejos de rua durante o Carnaval. O conjunto, que será uma das atrações principais da 39a edição do Muriçocas do Miramar, hoje, em João Pessoa, é composto, na verdade, por quatro mulheres, com trajetórias distintas na música, reunidas para levar alegria a um dos blocos mais conhecidos da capital: Ana Regina Limeira, Sandra Belê, Thaíse Porto e Val Donato cantam clássicos da MPB, do axé e do rock, sob arranjos de Toni Silva. A concentração será logo mais, a partir das 19h, na Praça das Muriçocas, situada no bairro de Miramar. Além do Trio Maravilha, Fuba, Capilé, Juzé e seu Bando, Raifi Sousa e Nattan completam a festa (saiba mais sobre o desfile das Muriçocas em matéria na página 5).

Sandra carrega em seu nome artístico a sua cidade natal — Zabelê, cidade com pouco mais de dois mil habitantes, situada na Borborema paraibana. É de lá que vem as primeiras lembranças carnavalescas da cantora, compositora e atriz — primeiro, na infância, com as festas da escola, e depois, na adolescência, com os shows em municípios circunvizinhos.

“Tínhamos blocos em Camalaú, Congo, São Sebastião do Umbuzeiro. Em Camalaú, mais especificamente, a gente ia para um balneário maravilhoso, com as bandas tocando lá, ao vivo, e o banho de chuveiro rolando. Eu ia para onde estava todo mundo”, recorda.

Depois de alguns anos morando em Campina Grande e em São Paulo, o contato com as Muriçocas do Miramar se deu na fase adulta. O primeiro desfile do qual participou foi há uma década — o deslumbre inicial de Sandra ficou com a animação dos grupos de batuques, bois e alas ursas que compõem o Muriçocas.

“De lá para cá, fui aproveitando muito cada momento. Também acho o bloco mais seguro, me sinto muito bem acompanhando o cortejo. E, este ano, poder sair num trio, foi um grande presente para mim. Todas nós estamos muito empolgadas e tenho certeza de que será delicioso”, adianta. 

Sandra também atenta para a diversidade de universos musicais de cada uma delas. Mas isso não foi objeto de conflito no conjunto: segundo a filha ilustre de Zabelê, o repertório individual das intérpretes foi respeitado e incluído no show de hoje. A “cola” entre todas as faixas apresentadas está nos arranjos em clima de axé.

É importante que a gente mesmo se reconheça enquanto povo e que fortaleça a cultura local – a principal função do bloco na rua   --   Sandra Belê

“Eu vou trazer frevo e arrasta-pés. Ana Regina vai trazer os ijexás [canções afro] e os sambas. Val Donato virá com aquela pegada maravilhosa do rock, pincelado com tons carnavalescos. E Thaís Porto, muito axé. Todas participam do momento de todas, sempre com o microfone na mão, fazendo resposta, coro”, detalha. 

O bloco, criado em 1986 pelos moradores do próprio bairro, nasceu de uma festa de aniversário e evoluiu para este clássico festejo, que começou na noite de ontem, com o Acorde Miramar (liderado pelo idealizador Fuba). Sandra atenta para a importância do Muriçocas, assim como a sua manutenção e as possibilidades de incremento.

“Eu penso que estamos cada vez maiores. Isso é muito bom, né? Uma tradição que diverte as pessoas da cidade e que chama turistas, além de, claro, ser tudo muito lindo. É importante que a gente mesmo se reconheça enquanto povo e que fortaleça a cultura local — a principal função do bloco na rua”, assinala.

Palco móvel

Natural de Campina Grande, Thaíse Porto acumula mais de 15 anos de carreira, e reside há apenas três meses na capital. Apesar do contato recente com o cotidiano pessoense, ela celebra a oportunidade de se apresentar num dos blocos mais tradicionais da cidade. A cantora revela que os arranjos foram pensados e decididos em conjunto pela banda, com o apoio de Toni Silva.

“Está sendo tudo muito novo para mim. Mas os carnavais da minha infância e da minha juventude também eram na rua, brincando com minha família e amigos. Usávamos máscaras e fazíamos guerra de confete e maisena. Gostávamos de ver os nossos bloquinhos de rua passarem”, rememora.

Na juventude, a também campinense Val Donato, era mais low profile em relação ao Carnaval: preferia participar do Encontro da Nova Consciência, evento que ocorria no mesmo período, na Rainha da Borborema. A cantora aproximou-se mais da folia nos últimos anos, integrando projetos especiais nesta data, como o Quem Roubou Minha Cueca, conjunto composto por ela, Lukete, Nathália Bellar e Toni Silva, atração do bloco Cafuçu nesta sexta-feira (28). No mesmo dia, também no Cafuçu, Val se apresenta com o Caronas do Opala.

“O convite para estar nessa festa com o Trio Maravilha partiu mesmo do próprio Fuba. Ele me lançou a proposta de convidar mais três mulheres com estilos diferentes para compor esse elenco”, revela.

Apesar de estar “onipresente” nas prévias de João Pessoa, Val explica que cada atração da qual faz parte tem um estilo diferente na avenida. O Quem Roubou Minha Cueca traz axé, mas mescla com “lambadão” e brega, segundo a cantora. O Caronas, além do brega, tem repertório mais orientado pelo rock n’ roll. O Trio Maravilha, por fim, passeia por todo o cancioneiro carnavalesco.

“Já participei do trio de Capilé nas Muriçocas, em outro ano, e também com minha própria banda, tocando rock, em 2013, se não me engano. Eu acho fantástica a proposta de estar em um palco móvel, fluindo pelo público. Independente do estilo, é sempre uma experiência marcante”, afirma.

Encampando um projeto com outras três mulheres, Val reflete sobre o ambiente carnavalesco para o público feminino que está “no chão”, acompanhando o trio: a artista assevera ser necessária educação e vigilância para inibir ou combater casos de assédio e importunação sexual. A conscientização do público masculino é a chave, segundo ela. “É necessário um trabalho constante nesse sentido, uma vez que esse comportamento reflete o machismo estrutural que há séculos predomina na sociedade. Não podemos esperar que seja resolvido rapidamente. Mas acredito que vem diminuindo ao longo dos anos, por meio das campanhas como a ‘Não É Não’,”, conclui.

Além da programação dos trios elétricos, o Muriçocas deste ano conta com oito grupos de maracatu e cinco orquestras de frevo, que acompanham os desfiles dos grupos culturais a partir das 20h40, antes da abertura oficial. O primeiro será o Urso Amigo Batucada; em seguida, apresentam-se: Baque Mulher (20h50), Baque de Raiz (21h00), Quilombo Nagô (21h10), Nação Pé de Elefante (21h20), Maracastelo (21h30), As Calungas (21h40) e o Boi da Macuca (21h50).

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 26 de fevereiro de 2025.