As bandas de rock, sejam pequenas ou grandes, costumam compartilhar histórias de formação muito similares: um encontro de amigos na escola ou bares, uma garagem e o desejo de imitar seus ídolos mundiais da guitarra. Existem muitas coisas em comum entre as atrações de hoje do Palco Tabajara, que acontece gratuitamente às 20h, na Usina Cultural Energisa, com transmissão ao vivo pela Rádio Tabajara e YouTube da emissora. Ambas criadas em João Pessoa, Retrohollics e In The Mood Hard Blues nasceram com nomes estrangeiros, em meados da década de 2000, e hoje se tornaram referência da cena underground paraibana, onde se mantém com resiliência para uma fiel legião de fãs do rock.
Com um início tão despretensioso, os músicos desse estilo musical se afinam pela capacidade de expor seus sentimentos, atuando em defesa de uma sonoridade comum. E pesada. É assim há 17 anos, desde que os integrantes do Retrohollics reuniram-se na mesa de um bar para criar o grupo que homenageia os maiores clássicos do rock. “O que nos mantém resilientes é a questão de gostar muito do que fazemos. O repertório agrada muito com uma certa diversidade, nos adaptando aos ambientes. Se o ambiente pede os clássicos mais na linha pesada, a gente toca pesado. Mas se pede uma coisa mais leve dos clássicos do rock, ou pop, ou psicodélico, a gente toca também. E é assim, todo final de semana que a gente tá tocando”, explica o baixista Degner Queiroz.
Ao lado de Bruno Trindade (vocal), Eugenio Pacelli (guitarra), Markel Trindade (guitarra) e Marconi Jr. (baterista), Degner é mais um ponto em comum entre as bandas: ele fará sessão dupla no Palco Tabajara, já que também integra o In The Mood Hard Blues. A capacidade de adaptação do Retrohollics está no seu DNA, uma vez que eles tocam os clássicos de rock, em todas as suas vertentes. “Tem muitas bandas que a gente toca que têm outros instrumentos, vários vocais. A gente tem pegadas diferentes. Quando se fala dos clássicos do rock mundial, você tem uma diversidade sonora gigantesca, com a impressão da nossa cara autoral no meio desse repertório vasto de tributos”, conta Degner.
Depois da pandemia, a banda viciada em música retrô (vem daí a aglutinação dos termos em inglês do nome) passou a apostar também em um repertório próprio, e se reinventou. Desde então, foram seis singles lançados até o momento e que estão disponíveis em todas as plataformas de streaming. “Pela primeira vez a gente vai tocar todas as músicas autorais num show, numa apresentação. E é um pouco de tudo que influencia a banda, dos clássicos, está ali impresso nesse trabalho autoral”. As músicas são ‘The forsaken death row’, ‘Primal damage’, ‘Feel my Hendrix soul’, ‘Spiritualized’, ‘Blast from the past’ e ‘Stand still’. O grupo já trabalha no próximo single para que em breve possam lançar um álbum completamente autoral.
Acostumados a tocar em festivais do gênero, em pequenos pubs e em encontros de motociclistas, a Retrohollics já se apresentou até em trio elétrico no Carnaval do Folia de Rua, na capital. Eles podem ser vistos semanalmente em bares locais da cidade que se mantêm fiéis ao espírito rock’n’roll da cena paraibana, com o After Pub, Atol Music Bar, General Store e no Caravela Cultural. São nesses espaços que eles sempre se esbarram com a outra atração do Palco Tabajara: In The Mood Hard Blues, o grupo dos rapazes envolvidos afetivamente no clima das experiências musicais que deram origem ao rock. E a origem se deu em uma garagem no bairro de Jaguaribe.
“Quando a gente começou a ouvir e conhecer mais a história do blues, a gente percebeu que ele não podia ficar fora de um contexto rock, até porque é fonte de muita informação musical para a criação do próprio movimento. Foi aí que a gente decidiu sair da garagem e se arriscar nos palcos no underground para um outro público que não fosse só nossos amigos”, relembra o vocalista Levi Oliveira. Com uma proposta de produzir blues e rock paraibano em português, a banda lançou em 2010 o primeiro álbum, o Eu só preciso de blues. “A história era basicamente essa, mostrar que com essa essência, o blues, a gente conseguiria contar várias histórias musicais, compor músicas e criar coisas interessantes. A gente só precisava de blues mesmo naquele momento para poder tomar essa decisão, e acabou dando certo”, acrescenta Levi.
A transformação da estética musical da banda se consolidou em 2021 com o segundo álbum Parahyba mood. “Nesse disco, a gente consegue trazer um pouco mais a essência nordestina, trazer mais elementos e deixar a coisa ainda mais com a nossa cara. Foi a descoberta de qual estilo e por onde a gente quer enveredar”. É um pouco dessa história que o In The Mood vai levar ao Palco Tabajara, tocando músicas do primeiro disco e as autorais, recheadas de questionamentos sociais e denúncia da realidade brasileira vivida nos últimos anos. Entre as canções esperadas estão ‘De cima do muro’, ‘No mundo cão’, ‘Necessidade básica’ e ‘Espírito blues’. “‘Espírito blues’ é uma inspiração principalmente no estilo que foi difundido pelo Hendrix. Essa coisa da liberdade da guitarra, dando destaque à movimentação rítmica dos instrumentos”, complementa Levi.
In The Mood Hard Blues sobe ao Palco com a formação clássica: Eliezer Rocha (guitarra), Degner Queiroz (baixo), Levi Oliveira (vocal) e Maquilson Cordeiro (bateria). Todos consideram o momento da apresentação de logo mais como especial em suas carreiras. “Vai ser mais um divisor de águas. A gente vai ter a oportunidade de ter um registro histórico. O desejo que a gente tem é de consolidar essa proposta do blues rock paraibano e que outras audiências escutem e outras pessoas curtam. Que esse som chegue a outras pessoas”, considera Levi. Com o sonho do blues, do rock e da regionalidade, as maiores similaridades que as bandas de hoje do Palco Tabajara têm é a relevância que deram aos músicos independentes e do underground local.
“Nós temos ainda hoje na cena muitos projetos que nasceram um pouco antes de nós, um pouco depois de nós, mas que enveredaram principalmente pelo campo do autoral e que se mantêm vivos. Isso fez com que a gente tomasse para si a responsabilidade de manter vivo, através de colaborações para a formação de projetos, planejamentos de shows, investimentos, e até mesmo de divulgação de uma banda divulgando a outra”, conclui Levi Oliveira.
O Palco Tabajara será transmitido também nos canais 8.2 (TV aberta Grande João Pessoa, Campina Grande, Patos, Cajazeiras, Catolé do Rocha e Matureia), 11 na net e 340.2 na Sky, GVT e Claro.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 14 de novembro de 2023.