O que Xuxa, Djavan e Barão Vermelho têm em comum? Todos eles iniciaram suas carreiras musicais na Som Livre, gravadora brasileira criada pela Globo em 1969 para abrigar, inicialmente, as trilhas sonoras de suas novelas e que acabou desenvolvendo um catálogo próprio de artistas, pelo qual passaram nomes como Alceu Valença, Jorge Ben Jor, Rita Lee, Luan Santana e Marília Mendonça. Vendida recentemente para a gigante Sony Music, a gravadora tem sua história recontada no livro Som Livre – Uma Biografia do Ouvido Brasileiro, editado pela Globo Livros, que o autor Hugo Sukman lança hoje, em evento no Rio de Janeiro.
Sukman é jornalista com mais de 35 anos de experiência. Antes deste livro, publicou outros 14 títulos, a maior parte deles sobre música, a exemplo de Martinho da Vila — Discobiografia (Casa da Palavra, 2014) e Nara — 1964 (Editora Cobogó, 2022). O interesse por esse campo começou na juventude, período em que consumiu muitos dos discos de sucesso da Som Livre. “Ouvia os LPs de novela até furar: O Bem Amado só com canções de Toquinho e Vinícius, Gabriela e Água Viva. Mas também a fase mais pop da Rita Lee e Roberto de Carvalho — o de 1979, da marchinha ‘Chega mais’ e do bolero ‘Mania de você’ é dos discos que mais ouvi na vida”, detalha.
"Percebi que ambos tinham o mesmo sonho: fazer uma música que o Brasil inteiro cantasse"
- Hugo Sukman
Trabalhando como jornalista do Grupo Globo, foi convidado para escrever o texto de apresentação de um box com trilhas de novelas reeditadas em CD, nos anos 2000. “Mergulhei nos discos e entrevistei João Araújo, fundador da Som Livre e seu primeiro presidente. Para os 60 anos, acho que por coincidência, a Globo Livros me encomendou este livro e eu já tinha parte da pesquisa, além de toda vivência como ouvinte e jornalista”, relatou Sukman.
Entrevistas atuais com artistas, produtores e executivos complementam o material investigado pelo autor. Hugo destaca o encontro com Lucinha Araújo, viúva de João, que aviou algumas das informações coletadas anos antes com o executivo, falecido em 2013. “Elenco várias entrevistas que fiz com o atual presidente, Marcelo Soares, para entender a transição do analógico para o digital, além de conversas com produtores como Guto Graça Melo e Max Pierre e artistas como Ivan Lins e Marília Mendonça”, frisou o jornalista, que dividiu o livro em 23 tópicos temáticos.
SOM LIVRE – UMA BIOGRAFIA DO OUVIDO BRASILEIRO
- De Hugo Sukman. Editora: Globo Livros. R$ 65.
Música para brasileiros
A Globo se desfez da Som Livre em operação que foi concluída em 2022. Hugo Sukman diz que essa ação partiu da estratégia do Grupo Globo em focar na produção de conteúdo audiovisual, vendendo empresas que não tinham ligação direta com esse segmento. Todavia, hoje, a gravadora opera de forma independente. “Depois da crise quase terminal da indústria na virada do século, com a pirataria e as primeiras plataformas digitais que não remuneravam, a Som Livre foi a primeira gravadora brasileira a entender o novo momento. Ela já dava muito lucro novamente quando a Sony se interessou em comprá-la”, atestou.
Durante o seu processo de escrita, Hugo conta que descobriu o “segredo” por trás da diversidade de artistas e estilos que já passaram pelo selo — dos Novos Baianos às Paquitas. “Depois que revistei uma entrevista com o compositor e produtor Nonato Buzar e de um papo com Marília Mendonça sobre seu projeto de cantar em cada capital brasileira, percebi que ambos tinham o mesmo sonho: fazer uma música que o Brasil inteiro cantasse”, revelou Hugo.
Como legado, além de seu catálogo recheado de pérolas da nossa música, Sukman assevera que a aposta na “música brasileira para o mercado brasileiro” é o grande trunfo da Som Livre. “E, apesar da invasão inexorável e mundial da música pop de língua inglesa, a música brasileira continuaria a ser importante no seu próprio mercado. Até hoje. Foi isso que a Som Livre sempre buscou, desde seu primeiro disco, trilha da novela O Cafona, até o último streaming”, finalizou o jornalista.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 02 de julho de 2024.