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Turismo pelas memórias augustianas

publicado: 27/11/2023 09h01, última modificação: 27/11/2023 09h02
Escritor e crítico Milton Marques Junior lança obra que é um “roteiro cultural” pelas reminiscências do poeta do ‘Eu’
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Livro será lançado na próxima segunda-feira (dia 27); hoje, o próprio Milton Marques Jr. será o guia no passeio que sairá às 9h da sede da APL para percorrer o Centro Histórico - Foto: Edson Matos

por Guilherme Cabral*

Um verdadeiro “roteiro cultural” pelas memórias do poeta paraibano e autor da seminal obra Eu, publicada em 1912. É assim que o professor aposentado da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), crítico literário e escritor Milton Marques Junior define o livro Ei-lo pulando de uma casa para outra, nas ruas da capital – Um roteiro de Augusto dos Anjos, nas ruas da Paraíba (Ideia Editora, 100 páginas, R$ 40), cujo lançamento se realizará na próxima segunda-feira (dia 27), a partir das 18h, na Academia Paraibana de Letras (em que o autor ocupa a cadeira número 40), no Centro de João Pessoa. Na ocasião, o acadêmico Eitel Santiago de Brito Pereira fará a apresentação da obra.

Hoje, dois dias antes do evento, o próprio Milton Marques Junior será o guia no passeio denominado Nos Passos de Augusto dos Anjos, que sairá às 9h da sede da APL para percorrer o Centro Histórico.

A obra faz uma abordagem não apenas das moradias de Augusto dos Anjos (1884-1914), como também, em certos casos, de casas e locais citados em versos do poeta do Eu, no qual o autor inclui o trecho relacionado. “Esse livro é produto de uma pesquisa que realizei no ano passado, quando saí percorrendo o Centro Histórico de João Pessoa, a partir da Igreja São Francisco até o bairro do Varadouro, procurando documentar as casas em que Augusto dos Anjos viveu. Inclusive, ele morou em uma das duas casas, a de número 37, onde atualmente está a sede da APL, que dá para a Rua Duque de Caxias. Cheguei a tirar 200 fotos de casas, ruas e prédios que pertenceram à família do poeta, mas, em razão dos custos, escolhi 50 fotos para ilustrar o livro”, comentou o pesquisador.

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Com fotografias do próprio autor, edição aborda moradias de Augusto dos Anjos (1884-1914) na capital paraibana, como também casas e locais citados nos versos do poeta do ‘Eu’ - Imagem: Editora Ideia/Divulgação

Milton Marques Junior restringiu o interesse do seu estudo ao período em que o poeta viveu na capital paraibana, entre 1908 e 1910. Depois de realizar as visitas aos locais, ele disse que se dedicou a consultar vários textos de outros autores, dos quais destacou três. Um é o livro intitulado Poesia e vida de Augusto dos Anjos, de Raimundo Magalhães Júnior, publicado em 1977, e que considera a biografia mais minuciosa que se tem do poeta. “Essa obra contribuiu bastante para o nosso trabalho, ao fornecer informações que permitem confrontações”, explicou ele.

Já Eu e eles (1978), de José Américo de Almeida, o escritor se valeu da conferência denominada “Augusto dos Anjos, o homem e o poeta”, proferida pelo autor da obra e que contém, de acordo com Milton Marques, o depoimento de quem “privou da intimidade do poeta”, após a sua mudança para a capital paraibana, em 1908. “Foi a partir de uma referência do autor de A Bagaceira, a respeito das mudanças de endereço de Augusto dos Anjos na capital, que nos inspiramos para dar o título deste livro: ‘Ei-lo pulando de uma casa para outra, nas ruas da capital, no beco do Carmo, na Rua Direita, na Rua Nova, na rua Padre Lindolfo’”, observou Marques.

O autor também ressaltou como de suma importância para o seu trabalho de pesquisa o livro O outro eu de Augusto dos Anjos, de Ademar Vidal, publicado em 1967, por ter sido escrito por alguém que privou da intimidade do poeta entre 1909 e 1910. “Além disso, ali se encontram as cartas de Augusto dos Anjos à mãe, Sinhá Mocinha, documentos fundamentais para estabelecer o roteiro de sua permanência nesta cidade de João Pessoa, facilitando o mapeamento dos lugares por onde morou e por onde andou”, disse ele.

Ordem no caos

Com essa obra, Milton Marques Junior apontou que a sua intenção não foi inovar nada. “As informações já existiam, só se encontravam dispersas em vários livros e estudos, cujo foco não era mapear os lugares por onde o poeta augusto dos Anjos passou ou se estabeleceu, razão por que elas se repetem. O que fizemos foi uma leitura seletiva, para realizar a sistematização daquilo que nos interessa: o roteiro de Augusto dos Anjos, na nossa capital”, justificou ele.

Não obstante, ele que enfrentou desafios na pesquisa. “Tentar decifrar os locais específicos dos vários endereços do poeta é como tentar pôr ordem no caos. Haveria duas possibilidades para ajudar na organização: a existência de documentos fotográficos da época, já que alguma coisa pode ser vista, mas não tudo, em Walfredo Rodriguez (Roteiro sentimental de uma cidade), e uma apurada investigação nos arquivos da Prefeitura para se constatar a mudança de numeração e identificar as moradas de Augusto dos Anjos. O descaso com a memória, com frequência jogada no lixo, impõe, contudo, muitas dificuldades ao pesquisador”, lamentou o escritor.

O autor ainda esclareceu que a sua pretensão, com tal obra, não é a de fazer mais uma biografia de Augusto dos Anjos, por não ser essa sua área de atuação. O intuito é o de ser uma tentativa de mostrar o roteiro das moradas e andanças do poeta pela cidade. “A minha esperança também é a de que esse livro sensibilize as autoridades constituídas para que seja criado um roteiro turístico pela memória do poeta”, frisou ele.

Na orelha do livro, o escritor registra o seguinte trecho: “Para Augusto dos Anjos, a Rua Direita é, sem qualquer dúvida, de suma importância. O poeta morou nela, escreveu aí muitos dos seus poemas, inclusive o impressionante Noite de um Visionário, escreveu para o Jornal A União, ensinou no Liceu Paraibano e, sobretudo, casou-se na antiga Capela de São Gonçalo, que virou, com o tempo, a Igreja de Nossa Senhora da Conceição dos Militares, demolida em 1929, para dar lugar aos atuais jardins, segundo informação de Walfredo Rodriguez”.

No outro trecho da orelha, o autor escreve: “A nosso ver, a Rua Duque de Caxias deveria se chamar Rua Augusto dos Anjos. A rua, em nossa cidade que recebe o nome do poeta, espremida entre as avenidas D. Pedro I e Almirante Barroso, no Centro da cidade, nada guarda ou nada diz sobre ele, a não ser o seu nome. Já a Duque de Caxias é toda a sua memória”.

Quanto ao passeio de hoje, que sairá da sede da Academia Paraibana de Letras, Milton Marques Junior disse que será aberto gratuitamente ao público que se interessar em participar da iniciativa. Ele comentou que essa caminhada é a primeira etapa do evento e depois virá a próxima, o lançamento do livro na segunda-feira, o qual o autor espera que contribua para sensibilizar as autoridades para a realização de um trabalho de revitalização do Centro Histórico da cidade de João Pessoa.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 25 de novembro de 2023.