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Um ano sem a arte de Cristovam Tadeu

publicado: 07/04/2018 00h05, última modificação: 07/04/2018 07h09
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Paraibano era reconhecido pelo talento humorístico e versatilidade artística

tags: cristovam tadeu , arte , comédia , teatro


Jamarrí Nogueira

Na segunda parte da década de 1980, um comercial de loja de eletroeletrônicos bombou na Paraíba. Um homem magrela perguntava com ar de surpresa “Você não tem videocassete?”. E o próprio magricela respondia, com ar esnobe e de reprovação: “Oh, pobreza!”. Se você tem mais de 30 anos é possível que lembre do comercial... e do videocassete.

Pode até não lembrar do videocassete, mas é impossível não lembrar do ator que protagonizava a peça publicitária: Cristovam Tadeu. Pois é... Impossível não lembrar do artista neste domingo marcado pelo aniversário de um ano de sua morte. Na publicidade, no traço, no teatro, no cinema e no humor Cristovam Tadeu deixou sua marca.

Hoje, às 8h, haverá missa. O ato cristão, conforme Luana Valentim (filha de Cristovam) será na Paróquia de Nossa Senhora Aparecida, no Treze de Maio, em João Pessoa. “É como se ele tivesse viajado. Sinto como se ele tivesse próximo de chegar de viagem... “, disse Luana.

Nos últimos anos, Cristovam e Luana dividiam um apartamento do tradicional edifício Caricé, no Centro da capital. “Ele foi pai e mãe ao mesmo tempo”, destacou Luana. Ela revela que Cristovam sempre tentou mantê-la distante das artes cênicas. “Mas, ficou feliz quando passei no teste de Beiço de estrada. Deu dicas preciosíssimas”, relatou.

‘Beiço de estrada’, longa de Eliézer Rolim, deve chegar aos cinemas este ano. O filme tem participação especial de Cristovam Tadeu, que também atuou em outro longa-metragem paraibano: ‘Por trinta dinheiros’, de Vânia Perazzo e do saudoso Ivan Hlebarov.

Somente quem conviveu com Cristovam Tadeu sabe o quanto ele era de veneta. E mais: podia ser muito chato. Adorável e divertidamente chato, com parentes, amigos e colegas de trabalho. A jornalista Romye Schneider que o diga... A apresentadora do programa ‘Munganga’ foi namorada de Cristovam e, mesmo após o fim do romance, manteve a amizade.

“Ele era mesmo [de veneta]. Mas, até nessas horas era engraçado. Quando me chamava para almoçar, eu perguntava: - o que é o almoço? E ele respondia: - macarronada. Bastava eu insistir para saber mais detalhes do cardápio e ele já se afobava: - Se quiser comer coisas que aqui não tem, traga!”.

Romye conta que, um dia, pediu a Cristovam para editar um vídeo a ser veiculado no YouTube. Ele teria elogiado o vídeo, mas feito uma ponderação: “Você não é uma comediante e sim uma jornalista engraçada”. Nascia o Munganga [projeto de Romye para rádio e standup]....
 
Parceiro de palco e de rádio

O humorista Marcello Piancó foi um dos grandes parceiros de Cristovam Tadeu, nos palcos, no rádio e na vida. Ele disse que o ‘mago’ faz muita falta. “Nossa cena cultural perdeu uma espécie de Dom Quixote. Foi um dos maiores defensores da nossa arte”, declarou Piancó.

Ele afirma que Cristovam foi ‘acima da média’ em todas as suas áreas de atuação. A faceta predileta, porém, era o ator... “Quando ele imitava, incorporava quase que como uma entidade. Fazia o download de Ariano e tantos que quisesse.

Piancó e Cristovam já dividiram o palco em shows de humor e disse que jamais houve disputa. Era como um jogo de frescobol... um jogava para o outro não deixar a bola cair. O projeto que ele mais se orgulhava, e eu também, era o Radiozona”.
 
Exímio imitador

Na primeira metade dos anos 80, Cristovam iniciou seus shows de humor no Bar Travessia. Era exímio imitador. Destaque para as imitações de Caetano Veloso e dom Marcelo Carvalheira. A melhor, todavia, era a de Ariano Suassuna - que Cristovam homenageou em seu último show, ‘Movimento Humorial’ [trocadilho com Movimento Armorial].

Suas imitações e aptidão para o humor o colocaram em programas nacionais de TV. Em 1989, estava no Só Riso, da Bandeirantes, ao lado de nomes como Costinha, José Vasconcelos e Jorge Loredo. Depois, foi participante do Show do Tom, de Tom Cavalcante, na Record.
 
Teatrando

Cristovam Tadeu Carneiro Vieira nasceu em Cajazeiras, em 6 de maio de 1962. No fim da década de 1970, entrou para o grupo do Teatro Santa Roza, onde atuou com Ednaldo do Egypto, na peça “O Dia em que deu Elefante”. Seus espetáculos de maior sucesso popular são ‘Vovô Viu a Uva’ e ‘Vovó Viu a Ave’.

Cristovam dirigiu, produziu e escreveu 15 shows solo de humor, DVDs, duas peças e também trabalhou com rádio, cinema e televisão, atuando em quase cem comerciais no Nordeste. Também dirigiu e produziu o primeiro sitcom da Paraíba, o “Sábado de Graça”.

Escreveu a ‘Branca de Calvão e as Sete Nevinhas’, que ganhou montagem da Cia. Paraibana de Comédia, com direção de Edilson Alves.  

Quadrinhos

Aos 12 anos, publicou sua primeira tirinha no jornal O Norte. Cristovam produziu várias charges e tiras para jornais impressos. Inesquecíveis são ‘Bartolo’, ‘Lampirão’, ‘Baratos Afins’, ‘Ostradamus’ e ‘Herr Fróide’. Cristovam era rápido e certeiro, conforme a quadrinista Thaïs Gualberto. “Charges e tirinhas dele continuam atuais”, disse ela.

Thaïs aponta Cristovam como uma importante referência na Paraíba, para qualquer geração. “Na Tertúlia HQ, na Gibiteca Henfil [na Funesc], pude ver o encantamento com que os meninos lá presentes conheceram o artista e sua obra”.

O quadrinista Mike Deodato classifica Cristovam como ‘talentoso e diversificado’. Eles se conheciam há mais de 30 anos. ”Um artista único, com uma energia contagiante, que ainda tinha muito a criar. Deixou uma lacuna impreenchível, mas fica o consolo de que sua obra continue inspirando outros artistas por muito, muito tempo”, declarou Mike Deodato.

Desde 2011, Cristovam era o diretor de programação da Rádio Tabajara. Sua morte prematura não teve graça nenhuma. Aquele sábado não foi de graça... Videocassete eu sei que você já ouviu falar (e até usou). Mas, você já ouviu falar em Cristovam Tadeu? Não?!?! “Oh, pobreza!!!”.