A Língua Submersa (Editora Alfaguara, 216 páginas, R$ 74,90) é o título do novo romance que o paulista Manoel Herzog lançará, hoje, em sessão de autógrafos a partir das 19h, no GardBeer Bar, localizado na cidade de João Pessoa. Considerado uma “utopia decolonial” pelo autor, o livro possui uma narrativa épica sobre a força da destruição humana. Durante o evento, que é promovido pela Livraria A União, o escritor paraibano Roberto Menezes fará a apresentação da obra e também participará, com o autor, de um bate-papo com o público a respeito do livro.
Natural do município de Santos (SP), mas que cresceu numa cidade industrial vizinha, Cubatão, o escritor Manoel Herzog lembrou que está vindo a João Pessoa pela terceira vez, já que esteve na capital paraibana em 2014 e 2021 para o lançamento de outras obras de sua autoria. A Língua Submersa, oitavo livro que publica no gênero romance, tem conteúdo complexo e múltiplo. Na trama, depois da ocorrência de um cataclisma ambiental, apenas uma região na América Latina sobreviveu ao avanço das águas, que foi a Bolivana-Zumbi. Sua classe média remanescente se reestruturou à base do comando evangélico, do jugo chinês e da obrigação de restaurar a natureza, mas prossegue mantendo suas rixas e discriminações.
A narrativa do livro apresenta a Bolivana-Zumbi, que seria o Brasil atual, como sendo o “gigante dócil e inofensivo”, onde a moeda é chamada de bênção e o poder dominante – que se submete como um fantoche dos desígnios chineses – é a Eclésia, gerida pela igreja evangélica Bola de Fogo. Nessa região, a natureza é a principal preocupação, tanto que são – de forma expressa – proibidos o desmatamento e a caça de animais silvestres, e os infratores punidos com a morte. Nessa nação, a língua falada é o portunhol, pois o idioma português se tornou não apenas uma língua submersa, como também proibida. Por isso, em diálogos, o leitor vai encontrar nas páginas do romance termos como “Qual la graça?”, “Estoy feliz”, “Qué passa?” ou “You lo sei”, entre outras falas amalgamadas dos dois idiomas-irmãos.
Apesar de um cenário destrutivo, o autor consegue, por meio de um humor desconcertante e de maneira contundente, levar o leitor às entranhas dessa nova sociedade que passou a habitar as antigas regiões de Santos e Cubatão.
Manoel Herzog disse que a ideia de escrever esse novo livro surgiu há alguns anos. “A ideia começou em 2016, com a ocorrência de vários fatos políticos, como o impeachment da presidente da República, Dilma Rousseff, naquele ano, passando pela pandemia da Covid-19, que não entrou no livro, e foi sendo escrito até o ano passado. Não faço nenhuma alusão a governos, mas deixo fluido, porque não é um livro panfletário, mas relato uma situação na qual imagino, embora com base em alguns fatos da atualidade, como estaria o mundo daqui a vários anos, já dominado pela China, depois da destruição de biomas naturais pelo agronegócio e o aparecimento de uma teocracia evangélica”, explicou o romancista.
Não é uma distopia
Manoel Herzog comentou que reluta um pouco considerar a obra como uma distopia. “Os fatos terríveis e fez, em tese, o nível do mar, em todo o planeta, que o livro narra já estão, na verdade, meio que acontecendo. A gente passou por um cataclisma político e o livro fala, também, de um cataclisma político, mas que ocorreu um aumento súbito da temperatura, que fez o derretimento e fez, em tese, o nível do mar, em todo o planeta, subir 90 metros. Acabou tudo, acabou Santos e Cubatão foi até a cota 95 e tornou-se uma estância praiana, onde era o depósito de ferro-velho do meu protagonista, que não considero protagonista, porque o livro é formado por pequenas sagas de histórias de famílias que se sobrepõem e se complementam, com um mundo novo e perturbador, onde a própria realidade é tecida de pesadelos. Depois do cataclisma se proíbe radicalmente a exploração de petróleo, corte de vegetação, agronegócio, qualquer dessas atividades malucas que já estão nos levando a essa catástrofe que já estão aí, com o mar batendo nas nossas canelas. O ferro-velho passa a ser a grande atividade econômica”, relatou ele.
O livro é formado por pequenas sagas de histórias de famílias que se sobrepõem e se complementam, com um mundo novo e perturbador
Manoel Herzog também considera o livro como uma “utopia decolonial”, o que faz alusão ao título da obra. “O português se tornou uma língua submersa porque foi proibida na nação Bolivana-Zumbi, onde passsou a se falar o portunhol. Talvez pela rebelião das nações sul-americanas, que foram as grandes prejudicadas nesse processo de exploração global, a escolha do portunhol é um chamado à união dos povos latino-americanos pela libertação contra a dominação que o norte e a Europa fazem”, detalhou o escritor.
No romance A Língua Submersa, o autor consegue transitar entre a ficção e a realidade. “Não foi muito difícil passar por esse processo, porque a realidade já tem fatos bizarros e, por meio da ficção, pude projetar uma versão possível para o mundo daqui a 50 anos”, justificou o autor, que já lançou 13 livros, dentre eles o romance CBA – Companhia Brasileira de Alquimia, que conquistou o Prêmio Facult e foi semifinalista do Prêmio Portugal Telecom, e a coletânea de poesia A comédia de Alissia Bloom, terceiro lugar no Prêmio Jabuti.
Manoel Herzog informou que, atualmente, tem se dedicado a produzir uma trilogia de comédia de costumes, cujo primeiro volume, Memorial de Fescência, lançou no ano passado. Ele planeja publicar o segundo tomo, já concluído, em 2024, e já vem escrevendo a sua última parte.
Excepcionalmente, a sessão de lançamento de A Língua Submersa acontecerá no GardBeer Bar, que é situado na Rua Bancário Enilson Lucena, 301, no Bairro dos Bancários. O livro poderá ser encontrado também na Livraria A União, localizada nas dependências do Espaço Cultural José Lins do Rego, na capital paraibana.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 3 de agosto de 2023.