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Ações visam à proteção do pássaro

publicado: 01/09/2025 09h12, última modificação: 01/09/2025 09h12
Classificada como vulnerável, espécie é endêmica do Nordeste e tem sofrido com o tráfico e o desmatamento
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Ave é típica da Caatinga e entoa um canto característico; fêmea e macho são diferentes, com o segundo tendo uma coroa preta | Foto: Breno Farias/Colaboração

por Samantha Pimentel*

Ele mede cerca de 10 cm de comprimento e tem coloração amarelo brilhante. Nos machos, há uma coroa, cauda e asas em tons pretos. Já nas fêmeas, a coroa preta é ausente, e elas possuem as partes superiores verde--oliva amareladas e brilhantes. A espécie também possui um belo canto e é endêmica do Nordeste do país, sendo encontrada principalmente na Caatinga e na Mata Atlântica da região. Essas são as características do pintassilgo-do--nordeste (Spinus yarrellii), ave que vem se tornando cada vez mais rara e é classificada como vulnerável na lista nacional de espécies da fauna ameaçadas de extinção. Por isso, o pássaro está contemplado no Plano de Ação Nacional para a Conservação das Aves da Caatinga (PAN Aves da Caatinga), juntamente com outras 33 espécies ameaçadas. A iniciativa é coordenada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), por meio do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres (Cemave).

Também conhecido como coroinha ou pintassilva, a ave é um passeriforme. Segundo o professor de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Erich Mariano, o pássaro é uma espécie típica da Caatinga. “Ele come pequenos grãos, pequenos frutos e até mesmo pequenos insetos, que fazem parte da sua dieta. Naturalmente, distribui-se por regiões mais secas, onde têm áreas arbóreas e arbustivas, [não ficando] nem em áreas muito abertas nem em áreas muito florestais. Aí, ele se expande ao longo da Caatinga como um todo, nos estados do Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Bahia e Maranhão, em alguns pontos”, explica ele. Ainda de acordo com o docente, o pintassilgo-do-nordeste costuma margear pontos próximos à Mata Atlântica, devido ao desgaste desse ambiente.

Erich conta que a espécie, por volta dos anos 1980, era muito abundante na Região Nordeste. “Esses são os relatos que temos e que demonstram que, já na década de 1990, ela [a espécie] começa a ser sentida como rara pelas pessoas que praticam observação de aves, pelas pessoas que criavam passarinhos e também pelos pesquisadores da época. Então, de lá para cá, tem-se percebido cada vez mais uma perda no número de indivíduos nas suas populações naturais”, lamenta. O professor informa ainda que, atualmente, a estimativa é que haja, ao longo de toda a área onde ela é encontrada, por volta de 900 a, no máximo, dois mil indivíduos adultos. “Isso já mostra um problema bem sério de conservação dessa espécie”, enfatiza Erich Mariano.

Ele relata também que o pássaro é muito visado pelo tráfico de animais, principalmente por quem gosta de criar passarinhos com um comportamento vocal ativo, como canários e similares. “Os machos são bem amarelos, com algumas manchas pretas características, e têm uma atividade vocal característica e bem ativa. Isso faz dele um atrativo para o tráfico de animais. A estimativa é que, todo ano, se perca 10% da população de pintassilgos em razão do tráfico, pela captura direta desses animais”, lamenta.

Erich Mariano destaca que, além do tráfico de animais, principal ameaça à espécie, há outros fatores que levam à sua redução, como situações de envenenamento por agrotóxicos, já que ela se alimenta de frutos, além de alterações climáticas e do avanço da urbanização, o qual leva ao desmatamento e afeta os ambientes naturais que seriam hábitat da ave. Com a sua raridade, o valor no comércio ilegal aumenta, tornando sua venda mais rentável e atrativa.

Projeto deseja monitorar as aves reintroduzidas na natureza

O PAN Aves da Caatinga tem por objetivo unir esforços com diversos setores da sociedade e buscar as melhores estratégias para reduzir as ameaças às espécies contempladas e para promover a recuperação de suas populações, como aponta o analista ambiental do ICMBio, lotado no Cemave e coordenador do plano, Emanuel Barreto. O primeiro ciclo do PAN ocorreu de 2012 a 2016, enquanto o segundo foi implementado de 2018 a 2023. Atualmente, o PAN está em seu terceiro ciclo de gestão, com vigência até junho de 2029. Quanto ao pintassilgo-do-
-nordeste, especificamente, o projeto teve início em 2022 e conta com a parceria da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), da Superintendência de Administração do Meio Ambiente (Sudema), da Agência Estadual de Meio Ambiente de Pernambuco (CPRH) e das prefeituras paraibanas de Boa Vista, Cabaceiras e São João do Cariri.

“O que motivou esse projeto foi a necessidade de entendermos qual a melhor metodologia para realizar solturas dessa ave na natureza, com o maior índice possível de adaptação e sobrevivência em seu hábitat natural. Os órgãos ambientais realizam apreensões em feiras livres ou em criadouros ilegais e essas aves são encaminhadas aos Centros de Triagem de Animais Silvestres [Cetas]. Aquelas que têm condições são soltas na natureza, mas são raras as iniciativas de monitoramento após a soltura. Então, muitas vezes, não sabemos o que acontece com elas, se conseguem se adaptar e sobreviver na natureza, após passar longos períodos aprisionadas em gaiolas”, esclarece Emanuel Barreto. Ele enfatiza que, com o projeto do pintassilgo-do-nordeste, há a tentativa de mudar essa realidade, por meio de uma pesquisa envolvendo solturas experimentais.

“Primeiramente, as aves são encaminhadas do Cetas para o Hospital Veterinário no campus da UFPB em Areia, onde passam por um período de quarentena e avaliação sanitária. Aquelas que estão comprovadamente sadias são consideradas aptas para a etapa seguinte, que consiste na aclimatação em um recinto maior, localizado na região do Cariri Paraibano. Após o período de aclimatação, é realizada a soltura e o monitoramento pós-soltura. Para tanto, cada ave recebe uma marcação com anilha do Cemave — um anel metálico colocado na pata da ave e que contém um código de identificação único — e uma anilha colorida, para facilitar sua observação a distância, com auxílio de binóculos”, afirma.

Até então, foram soltos 13 pintassilgos-do-nordeste. O melhor resultado obtido foi o de uma fêmea batizada de Dinorah, que a equipe conseguiu monitorar por um período de 163 dias após a soltura. “Nossa meta é soltar até 20 indivíduos na região e avaliar os resultados obtidos, os quais poderão subsidiar um futuro protocolo de soltura para a espécie”, projeta Emanuel.

Educação

O coordenador do PAN Aves da Caatinga pontua que, recentemente, foram realizadas reuniões com as prefeituras de Boa Vista, Cabaceiras e São João do Cariri, com a participação das secretarias municipais de Educação, Meio Ambiente, Turismo, Assistência Social e Agricultura. “A intenção é desenvolvermos um grande projeto de educação ambiental em parceria com esses municípios que compõem a Área de Proteção Ambiental [APA] do Cariri. Entendemos que não adianta ter um projeto de solturas de pintassilgos-do-nordeste na região se não combatermos uma das grandes ameaças a essa e outras espécies de aves, que é a captura para abastecer o comércio ilegal de animais silvestres”, declara, ressaltando que essas ações educativas podem ajudar na mudança de conduta das pessoas.

Esse viés da educação ambiental está em fase inicial de planejamento, e as primeiras ações de capacitação de professores e atividades educativas estão previstas para iniciar em novembro deste ano. “É importante que a sociedade também cumpra sua parte, denunciando aos órgãos ambientais sempre que presenciar a captura desse pássaro ou sua criação ilegal, bem como a destruição do seu hábitat”, orienta Emanuel.

Atualmente classificado como espécie vulnerável, o pintassilgo-do-nordeste está em uma situação preocupante, pois, se nada for feito em prol de reduzir as ameaças a sua sobrevivência, a tendência é que seu declínio populacional se eleve, levando-o a um risco iminente de extinção. Por isso, o superintendente do Ibama na Paraíba, Nino Tavares Amazonas, alerta para a importância de se promover ações de conservação da ave. “Isso exige nossa ação imediata. Nesse sentido, a educação ambiental é uma ferramenta poderosa, e o êxito desse projeto dependerá do engajamento e da responsabilidade de cada um”, destaca.

Quanto à participação do Estado da Paraíba, Nathália Flôres, técnica ambiental da Coordenadoria de Estudos Ambientais (CEA/Sudema) e membro do PAN Aves da Caatinga, informa que o órgão atua, de forma integrada com os demais, para implementar ações na APA do Cariri. “Essa unidade de conservação é gerida pela Sudema, por meio da CEA. Já ocorreram as primeiras mobilizações, junto aos três municípios que compõem a APA. E as prefeituras, por meio de suas secretarias, nos acolheram com entusiasmo e demonstraram interesse no desenvolvimento do projeto. A proposta é que seja uma iniciativa permanente, contribuindo de forma contínua para a conservação da espécie”, comenta.

Ela ainda observa que, para se obter os resultados necessários e reduzir as ameaças à espécie, a ação precisa ser integrada com diversos entes. “Fortalecimento da fiscalização, educação ambiental para sensibilização das comunidades locais, incentivo à participação das prefeituras e órgãos ambientais, além de parcerias com instituições de pesquisa e organizações não governamentais. O trabalho de conservação precisa envolver tanto o Poder Público quanto a sociedade civil para obter resultados efetivos”, reforça.

Fiscalização

A fiscalização relacionada a criação, captura e comércio irregular de animais silvestres é realizada por diversos órgãos que integram o Sistema Nacional do Meio Ambiente. No estado da Paraíba, destacam-se as atuações da Sudema, do Ibama, da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e do Batalhão da Polícia Ambiental da Polícia Militar da Paraíba, conforme aponta o coordenador da Divisão de Fauna da Sudema, Leandro Silvestre. “São desenvolvidas ações conjuntas para coibir práticas ilegais e preservar a biodiversidade. Além das ações repressivas, há também fiscalização voltada aos criadores amadoristas de passeriformes devidamente registrados. Essa categoria permite a manutenção e reprodução de espécies como o Spinus yarrellii em plantéis autorizados, desde que respeitadas as normas legais”, afirma.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 31 de agosto de 2025.