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Com base em documentos, pesquisadores da USP e da UERJ afirmam que, há 267 anos, um tsunami atingiu o município de Lucena, localizado no Litoral Norte da Paraíba, e a inundação chegou a cinco quilômetros continente adentro

Almanaque: “Dilúvio” paraibano

publicado: 21/11/2022 12h00, última modificação: 29/12/2022 16h13
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- Foto: Ilustração: Tônio

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As praias localizadas no município de Lucena – principalmente no Distrito de Costinha – no Litoral Norte da Paraíba e situadas a uma distância de 50 quilômetros de João Pessoa, foram alvos de um tsunami há 267 anos, gerado pelo terremoto que atingiu Lisboa, em 1755, e que teria matado, somente em Portugal, cerca de 40 mil pessoas. Quem “afirma” isso é um recente estudo realizado em 2020 pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).

Segundo esse estudo, o terremoto de 1755 foi o maior já registrado na Europa, com magnitude de 8,7. Ele destruiu Lisboa, grande parte do sul da Espanha e do Marrocos, e causou um enorme tsunami que atingiu a Irlanda e o Caribe. As estimativas de vítimas variam, pela carência de registros, entre 20 mil e 30 mil mortos, enquanto as maiores falam em 100 mil. O terremoto também deu início a uma era moderna nos estudos sismológicos.

“A onda gigante que se formou com o terremoto em Lisboa atravessou o Atlântico e causou estragos na costa brasileira, principalmente em Lucena, que fica a 5.722 quilômetros de distância”, afirma o líder dos estudiosos do assunto, o professor Francisco Dourado, do Centro de Pesquisas e Estudos sobre Desastres (Cepedes), órgão de estudos sismológicos da Universidade de São Paulo (USP). Esse estudo teve a participação do professor Paulo Rosa (in memorian), da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), que integrava a equipe do Núcleo de Pesquisas de Recursos do Mar (Nepremar).

Maremoto foi documentado em quatro cartas

De acordo com as informações do pesquisador Francisco Dourado, o tsunami gerado pelo terremoto de Lisboa chegou à costa do Nordeste brasileiro no início da tarde de 1º de novembro de 1755. Ele penetrou terra adentro, destruiu habitações modestas e desapareceu levando duas pessoas. “Isso é desconhecido da maioria dos brasileiros”, garante Dourado.

Existem relatos de quatro cartas da época falando sobre o maremoto no Brasil. Elas foram escritas pelo arcebispo da Bahia, pelos governadores de Pernambuco (Luís José Correia de Sá) e da Parayba (Paulo Carvalho de Mendonça) e por um militar. Todas se encontram no Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa.

“As águas transcenderam os seus limites e fizeram fugir os habitantes das praias”, diz uma carta de 10 de maio de 1756, relatando o episódio acontecido em 1º de novembro do ano anterior em praias da Paraíba.

Outra carta relatada por Paulo Carvalho de Mendonça, de 4 de março de 1756, diz: “Em Lucena (PB) e Tamandaré (PE), a enchente do terremoto entrou pela terra adentro coisa de uma légua (quase cinco quilômetros) e levou algumas casas de palhoça, além de um rapaz e uma mulher”. Na Praia de Pontinhas, no Distrito de Acaú, em Pitimbu, Litoral Sul da Paraíba, os pesquisadores do fenômeno teriam identificado uma camada de areia grossa que teria vestígios do ocorrido.

Segundo o estudo da UERJ, na região da Praia de Lucena, as ondas variaram entre 1,8 e 1,7 metros de altura. Na região pernambucana de Tamandaré, as ondas atingiram de 1,9 a 1,8 metros, com grande volume de água. As ondas inundaram até cinco quilômetros terra adentro, principalmente em locais banhados por rios e nas proximidades da Ilha de Itamaracá (PE).

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 20 de novembro de 2022.