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Almanaque: Mamanguape em chamas

publicado: 27/03/2023 12h43, última modificação: 27/03/2023 12h43
Há 390 anos, além de Olinda, em Pernambuco, cidade paraibana também foi incendiada no início do período Brasil-holandês
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Ilustração: Tônio
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Incêndio ocorrido em terras paraibanas, provocado pelos holandeses calvinistas, está em obra de 2008. Foto: Reprodução
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Adiel Alves Rodrigues, pesquisador e historiador natural de Mamanguape e que reside na capital de Pernambuco. Foto: Arquivo Pessoal
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por Ademilson José

A guerra por territórios, econômica e religiosa que muitos europeus travavam por lá e que acabou sendo transportada para o Brasil colonial não causou estragos somente em cidades como Olinda, em Pernambuco, onde a Igreja Católica já esbanjava alguma ostentação de poder. Atingiu igualmente povoados que ainda eram pequenos e que, a exemplo de Mamanguape, a cinquenta quilômetros da capital paraibana, João Pessoa, também foi incendiada pelos holandeses calvinistas no começo do Brasil-holandês.

O fato se deu mais precisamente em 15 de novembro de 1633 e está detalhadamente registrado no livro ‘Panorama de Mamanguape’ (Comunigraf, Recife-2008), de autoria de Adiel Alves Rodrigues, um pesquisador e historiador natural de Mamanguape que reside na capital pernambucana.

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Incêndio ocorrido em terras paraibanas, provocado pelos holandeses calvinistas, está em obra de 2008. Foto: Reprodução

Mamanguape só viria a se tornar cidade mais de 200 anos depois, em 25 de outubro de 1855, mas, em 1633, já era freguesia e já contava com sua atual Catedral São Pedro e São Paulo, que é de 1630. O tamanho do povoado é que, de fato, ainda não era lá essas coisas, mas o problema é que, para os incendiários batavos, “tinha jesuítas demais”.

Segundo o ‘Panorama’ de Adiel Rodrigues, foi justamente a justificativa apresentada para o incêndio pelo relatório encaminhado à Holanda e à sede do Brasil-holandês em Recife, por um dos representantes da Companhia das Índias Ocidentais, Joannes Laet: “...Mamanguape já era um povoado com vistosos edifícios e um centro religioso católico de jesuítas que eram muito atuantes”, afirmou Laet nas páginas 336-337 do seu ‘História ou Annaes dos Feitos da Companhia’.

Tudo muito parecido com as motivações do incêndio de Olinda que, na chegada holandesa, já somava enormes conventos e belas igrejas pelos morros da cidade. Os holandeses não queimaram Olinda e se instalaram no Recife porque preferiam espaços planos, não. Como calvinistas, o fizeram para apagar símbolos religiosos do inimigo – Espanha e Portugal. E com um adendo sintomático de fé: a data do incêndio foi 24 de dezembro (véspera de Natal) de 1631.

Conforme Adiel Rodrigues, também escrevendo sobre as ações holandesas no Vale do Mamanguape, Robert Southey reconhece que “não eram estas (casas) assaz numerosas para poderem resistir com a maior esperança...” ao poderio militar holandês. Ou seja, era prédio de menos, só que, com jesuítas demais!

E transcrevendo Laet e Robert Southey juntos, Adiel relata detalhes relacionados às ordens do incêndio que foram oriundas de Recife: “...Com toda prudência, duas das quatro expedições de fuzileiros que se achavam na região deveriam ir a um lugar chamado Mamanguape, perto do qual se mantinham os jesuítas e outros padres...”.

E supostos cuidados depois do fato consumado: “...Duas companhias, a de Hendrick Hendricksz e a de Charles Turlon Junior (...) marcharam tão circunspectamente descobertas, e os habitantes tiveram bastante tempo para fugir; os nossos, encontrando o povoado deserto, incendiaram completamente todos os seus vistosos edifícios, e voltaram ao acampamento...”.

A pesquisa de Adiel Rodrigues, que tem outros livros e é membro fundador da Academia de Letras, Ciência e Artes do Vale do Mamanguape (Alca-VM), também mostra um aspecto que poucos pesquisadores paraibanos dão atenção. Que a presença holandesa no Vale do Mamanguape é anterior ao Brasil-holandês (1630 – ocupação de Recife). Na Baía da Traição e Mamanguape, ela se dá em 1625, posterior somente a também curta ocupação de Salvador (1624).

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 26 de março de 2023.