Inaugurado em 10 de novembro de 1945, o Cineteatro São José celebrou ontem 80 anos de história e resistência e consolida-se como um espaço artístico e cultural, fundamental na formação da identidade campinense e paraibana. Administrado atualmente pela Fundação Espaço Cultural (Funesc) e palco de grandes nomes, como Marinês e Elba Ramalho, o local mantém viva a tradição dos antigos cinemas de bairro e, ao longo das décadas, tornou-se um ponto de encontro para diversas linguagens artísticas.
Em comemoração ao aniversário do Cine e da cidade de Campina Grande, o governador João Azevêdo reinaugurou, em outubro de 2025, a sala de cinema do Cineteatro São José. Foram investidos cerca de R$ 824 mil na aquisição de novos equipamentos de projeção, como tela retrátil, projetor DCP e nobreak. Com a reestruturação, a sala de cinema volta a funcionar pela primeira vez após 40 anos de inatividade.
“A celebração do aniversário do Cine se estenderá por todo o ano de 2026, pois ainda estamos ajustando algumas questões técnicas, como a elaboração de editais para contratação de uma equipe qualificada, incluindo projetista e operadores especializados. O futuro é muito promissor: nossa proposta é que o São José volte a exibir filmes nos finais de semana, com ingressos a preços populares. Às quartas-feira, teremos sessões dedicadas exclusivamente a produções paraibanas e, nos demais dias, abriremos espaço para outras linguagens artísticas — dança, música, teatro, pintura e muito mais”, explicou Moema Vilar, diretora do Cineteatro São José.
Além da programação semanal, o espaço cultural também se organiza para voltar a receber eventos tradicionais da cidade, como o Comunicurtas — promovido pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Foi no próprio Cine que nasceram grandes realizações, a exemplo da Feira Literária Internacional de Campina (Flic) e do Festival Muído. “Hoje, os organizadores me dizem que seus eventos cresceram tanto que já não cabem mais no Cine, e isso me enche de alegria. É gratificante saber que projetos tão grandiosos e importantes para a cidade tiveram início aqui”, destacou Moema.
Apesar de estar completando 80 anos e ter uma longa histórica com grandes nomes consagrados da Paraíba e do Nordeste como um todo, o Cine também é conhecido por ser um espaço que acolhe novos talentos. O rapper paraibano Chuck MC foi um dos artistas que encontrou o Cine de portas abertas para receber sua produção.
“A minha história com o Cine São José é recente, porém já é cheia de realizações. A primeira vez que estive lá foi em 2022, quando lancei meu EP ‘Um Sonho, Mil Corres’. Queríamos fazer um show de lançamento para apresentarmos as músicas ao público, o Cine abraçou essa ideia e foi um sucesso. Contamos com a participação de outros artistas locais e conseguimos fazer um evento muito bonito Encheu a casa”, contou.
Para ele, o diferencial do espaço é a possibilidade de abrigar a produção de arte nas suas mais diversas formas. “Você pode fazer um show, você pode fazer uma mostra de filmes, uma peça, uma apresentação de dança. Com certeza é um ambiente muito importante para os artistas porque acaba sendo um espaço bem viável e bem acessível para nós. Para mim, sempre foi um espaço que eu tive a honra de estar presente e de me apresentar. Faz parte da minha história, assim como faz parte da história de vários outros artistas paraibanos”, afirmou Chuck.
Arquitetura art déco foi totalmente preservada e restaurada

- Tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba (Iphaep), o prédio é considerado um marco em CG
Localizado no bairro de mesmo nome, o São José, o Cineteatro é uma construção em estilo art déco erguida pela família Wanderley. Tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba (Iphaep), o prédio é considerado um marco do início da arquitetura moderna em Campina Grande.
A professora de Arquitetura e Urbanismo Alcília Afonso, que coordena o Grupo de Pesquisa, Arquitetura e Lugar (Grupal), da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), explica que “a art déco se caracteriza por ser uma transição entre a arquitetura eclética e a modernidade. As fachadas ficam mais limpas, mais geométricas, há a utilização de platibandas”.
Ela ressalta ainda que o projeto foi idealizado por uma família que possuía outros cinemas na Paraíba. “Eles construíram o São José com o intuito de oferecer ao público de classe média o acesso às salas de cinema, que estavam em alta na cultura brasileira da época”. O Cineteatro funcionou como cinema por vários anos, mas, com o declínio dos cinemas de rua, acabou sendo abandonado. Apenas em 2010 o edifício foi resgatado e restaurado pelo Governo do Estado, recuperando seu valor histórico e cultural para Campina Grande.
“Isso aconteceu graças a um movimento aonde alunos, professores, intelectuais e artistas campinenses se uniram para resgatar o uso do edifício e conseguir sua devida conservação enquanto equipamento artístico. A história do Cineteatro São José é uma história de cultura e de participação cidadã e pode servir de exemplo para que a população exija o mesmo tratamento em outros prédios históricos do município”, afirmou a arquiteta.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 11 de novembro de 2025.