Apesar de ser uma doença mental que atinge todas as faixas etárias, é na velhice que a depressão se mostra mais presente. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, entre 2013 e 2019, houve no Brasil um aumento de 34% do número de indivíduos que receberam diagnóstico de depressão. Em 2019, os idosos entre 60 e 64 anos representavam a faixa etária proporcionalmente mais afetada: 13,2% tinham sido diagnosticados com depressão.
Para Sânzia Maria de Souza, psicóloga clínica, doutora em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e mestre em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), o aumento significativo de idosos com depressão é resultado de dois fatores. “O aumento da expectativa de vida da população, junto ao despreparo da sociedade em termos de estrutura para o amparo dessa faixa etária”.
De fato, e ainda de acordo com o IBGE, nos últimos nove anos, o contingente de idosos residentes no Brasil aumentou 39,8%. Em 2012, moravam no país 22,34 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, representando na época 11,3% de toda a população residente no país. Atrelado ao crescimento populacional, a falta de planejamento e estrutura familiar e de políticas públicas para atender essa população colocaram os idosos em uma situação de maior vulnerabilidade, e isso se resvala, também, na saúde mental.
Solidão, perda da vitalidade e da autonomia, dúvidas e angústias
Em pessoas acima dos 60 anos, os riscos de desenvolver depressão aumentam porque são muitos os fatores que favorecem um quadro depressivo. É nessa fase da que as pessoas passam pelas mudanças sociais mais significativas: perda de amigos, parentes e cônjuges, aposentadoria – que desencadeia um sentimento de inutilidade, doenças que começam a surgir, perda de autonomia e mobilidade, mudança brusca na própria autoimagem.
Outros fatores mais complexos também tendem a surgir após os 60 anos. Além da solidão, da perda da vitalidade e da autonomia, as dúvidas e angústias da juventude aparecem para “cobrar”. Casei com quem eu gostaria? Escolhi bem minha profissão? Será que eu deveria ter ido por um outro caminho? Deveria ter sido um pai, ou uma mãe, melhor? Questionamentos que podem gerar um sentimento negativo em muitos idosos, que talvez não estejam preparados para lidar com essa passagem de tempo em uma nova configuração de vida.
De forma geral, a depressão atinge os idosos de duas formas específicas: aqueles que já tiveram quadro depressivo em algum momento da vida, tratado ou não e entram na idade avançada com depressão; e aqueles que desenvolvem a doença somente nessa fase, justamente pelos fatores relacionados ao envelhecimento e já mencionados. No segundo caso, o catalisador, geralmente, é a perda do seu papel social, fazendo com que o idoso se sinta menos integrado ao meio, menos útil para a família e para a própria sociedade.
Apesar da situação complexa, é possível mitigar e até prevenir o surgimento de quadros depressivos em idosos. “Exercícios físicos, estimulação cognitiva, atividades ao ar livre como caminhadas e uma rede de apoio atenta podem ajudar a diminuir os efeitos”, afirma Sânzia Souza. “Os familiares e a rede de apoio têm um papel fundamental, pois são eles que vão conscientizar o paciente sobre a doença, incentivá-lo a procurar ajuda e dar o suporte necessário no enfrentamento à depressão”.
Em alguns casos, o uso de medicamentos é recomendado, isso vai depender do estágio da doença, se é um caso leve, moderado ou grave. Manter a mente produtiva, se sentir parte da dinâmica familiar, estar integrado ao ambiente, receber e proporcionar afeto, e manter o corpo ativo, proporcionam aos idosos uma vida saudável para o corpo, e para a mente.
Uma doença que não escolhe idade
Relatório da Unicef aponta que pelo menos uma a cada sete crianças e jovens de 10 a 19 anos convivem com algum transtorno mental diagnosticado
Foi apenas em 2021 que a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) incluiu o tema da saúde mental entre crianças e jovens no Tratado de Pediatria, principal publicação direcionada aos médicos que cuidam de pessoas até 18 anos em todo o país. No mesmo ano, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) publicou o relatório ‘Situação Mundial da Infância 2021’, e, de acordo com as estimativas do estudo, pelo menos uma a cada sete crianças e jovens de 10 a 19 anos convive com algum transtorno mental diagnosticado em todo o mundo.Fatores como violência doméstica, falta de diálogo em casa e na escola, uso exagerado de celulares e computadores se somam à ebulição hormonal, fazendo com que crianças e adolescentes se tornem suscetíveis a desenvolver transtornos como ansiedade, estresse e depressão. Com a pandemia da Covid-19, o isolamento social e a perda de pessoas próximas agravaram ainda mais esse quadro.
Um levantamento realizado pelo Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo indicou que 36% dos jovens brasileiros desenvolveram quadros de ansiedade e depressão durante a fase mais aguda da doença. Com ou sem pandemia, a depressão entre crianças e adolescentes é um problema que demanda uma atenção extra de pais, familiares e cuidadores.
Sânzia Sousa é categórica ao afirmar que é, sim, possível prevenir o surgimento ou agravamento de quadros depressivos em crianças e adolescentes. “Essa prevenção é feita com a garantia do suprimento às necessidades próprias desse ciclo de vida, com atenção ao comportamento do adolescente para observar mudanças repentinas”.
Situações de irritação sem motivo aparente têm que ser observadas
Em crianças de até 12 anos, cabe observar situações de irritação sem motivo aparente; desinteresse por brincar; queda no rendimento escolar; cansaço; e dores somatizadas (dor nas pernas, na cabeça e na barriga). Já no caso dos adolescentes, é importante atentar para quadros de agressividade; alteração de apetite; isolamento social; e, em casos mais extremos, pensamentos suicidas.
“O mais importante a se destacar é que os pais prestem atenção em mudanças bruscas de comportamento e procurem ajuda profissional. Quanto mais cedo os sintomas forem tratados, maiores serão as chances dessa criança ou adolescente voltar a levar uma vida saudável”, finaliza a psicóloga.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 21 de maio de 2023.