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Diversidade 60+

Desafio de envelhecer trabalhando

publicado: 30/10/2023 09h31, última modificação: 30/10/2023 11h21
Mercado de trabalho tem modificado o olhar para as pessoas idosas, que possuem a vantagem da experiência
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Empresas têm se moldado para receber pessoas com mais de 60 anos, porém profissionais precisam estar abertos às mudanças - Foto: FreePick
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"O mercado tem mudado o seu olhar... As pessoas que estão com 50, 60 anos, na sua maioria são pessoas bastante qualificadas, com bastante experiência na área" Patrícia Queiroz - Foto: Acervo pessoal
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Os filhos logo pensam: mamãe vai se aposentar e vai cuidar dos netos. Não, bebê, não estou aqui para cuidar dos netos. Estou aqui para ser útil, ter uma mente renovada, um corpo são, diz Regina Borges - Foto: Acervo pessoal
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por Michelle Farias*

Conseguir emprego nem sempre é fácil e as dificuldades tendem a aumentar conforme a idade avança. Porém, a experiência profissional das pessoas a partir dos 50 anos tem sido cada vez mais valorizada por empresas. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que, no segundo trimestre de 2023, 174.607 pessoas estavam desempregadas no país. Deste total, 31,8% se encontram na faixa etária entre 40 e 59 anos, o que representa a maioria dos casos. São 55.682

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) mostra ainda que a terceira maior taxa de desemprego está entre as pessoas partir dos 60 anos, com 19,14%. São 33.420 pessoas desempregadas nessa faixa etária em todo o país. O IBGE frisa, no entanto, que o número representa apenas as pessoas com idade superior a 60 anos que estavam à procura de emprego na época da pesquisa.

Especialista em Gestão de Pessoas e Desenvolvimento Humano, Patrícia Queiroz explica que 10 anos atrás as dificuldades eram bem maiores para conseguir emprego após os 40 anos, idade em que a pessoa já era considerada “velha” para ingressar no mercado de trabalho e alcançar um emprego de carreira. No entanto, ela frisa que essa realidade tem sofrido alterações em todo o mundo e no Brasil não é diferente.

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Os filhos logo pensam: mamãe vai se aposentar e vai cuidar dos netos. Não, bebê, não estou aqui para cuidar dos netos. Estou aqui para ser útil, ter uma mente renovada, um corpo são, diz Regina Borges - Foto: Acervo pessoal

“O mundo inteiro está envelhecendo, está tendo mais tempo de vida e isso é muito bom, é vida com qualidade, porque antes a gente tinha pessoas que chegavam aos 60, 70 anos, mas muito debilitadas, então considerava-se que até os 45 era a idade ativa para estar no mercado. Contudo, o próprio mercado tem mudado o seu olhar, por conta da escassez de alguns profissionais especializados em determinadas áreas. As pessoas que estão com 50, 60 anos, na sua maioria são pessoas bastante qualificadas, com bastante experiência na área”, avalia Patrícia.

Segundo a especialista, contratar pessoas em idade mais avançada tem sido uma alternativa para as empresas que não tem conseguido encontrar talentos. Ela cita que há cerca de 15 anos as oportunidades de emprego eram mais voltadas para o segmento operacional. No entanto, algumas empresas não têm conseguido suprir com jovens a necessidade de ter um gestor com experiência em determinadas áreas.

Regina Celi Batista Borges, de 59 anos, já tinha trabalhado em órgãos públicos e voltou ao mercado ao ser contratada como atendente na empresa A&C. Ela contou que não demorou para conseguir o emprego, mas revelou o preconceito que ainda existe em torno da contratação de pessoas com idade a partir dos 50 anos, principalmente por conta da falta de habilidade com as novas tecnologias.

“Me senti feliz e realizada ao ser contratada. Quando chegamos nessa idade os filhos logo pensam: mamãe vai se aposentar e vai cuidar dos netos. Não bebê, não estou aqui para cuidar dos netos. Estou aqui para ser útil, ter uma mente renovada, um corpo são e minha autoestima lá em cima. Nisso agradeço a AeC, por me contratar. É mais uma realização na minha vida ao trabalhar em uma empresa de grande porte. Tenho poucos dias que estou aqui, mas tenho muito respeito dos meus supervisores, coordenadores e dos colaboradores”, disse.

Um dos principais desafios para as empresas consiste em adotar políticas que possam garantir uma melhor convivência das diversas gerações em um mesmo ambiente. Patrícia Queiroz destaca que o mercado de trabalho tem se moldado para receber pessoas maiores de 60 anos, mas ressalta a necessidade dos profissionais também estarem mais abertos a mudanças na forma de pensar e dispostas a conviver com novas gerações, tecnologias e recursos dentro das organizações e na execução de suas funções.

“A gente tem uma geração baby boomers que são as gerações dessas pessoas de mais idade, que tem uma linha de pensamento diferente, mas essas pessoas também tiveram que mudar sua forma de pensar. Tantas empresas, organizações e pessoas mudando abriu um espaço para esse novo mercado”, disse Patrícia.

Programas de empregabilidade para idosos

A mão de obra experiente tende também a ser cobiçada pelas empresas. Algumas organizações têm investido em programas para recrutamento de pessoas com idade superior a 50 anos. A Unilever, por exemplo, desenvolveu o programa “Senhor Estagiário” com o intuito de preparar e inserir no mercado de trabalho profissionais com mais de 50 anos. Já a Votorantim possui o programa “Mime”: Melhor idade, melhor emprego.

“Eles não estão apenas preocupados em trazer de volta esse profissional para o mercado de trabalho, mas eles estão preocupados em trazer esse profissional com qualificação. Porque eles têm uma experiência, um conhecimento muito importante e que é extremamente colaborativo para o resultado da organização, mas eu preciso também, quanto empresa, estruturar essa recepção para que todos trabalhem para o mesmo objetivo”, analisou Patrícia Queiroz.

O mercado tem mudado o seu olhar... As pessoas que estão com 50, 60 anos, na sua maioria são pessoas bastante qualificadas, com bastante experiência na área  ---  Patrícia Queiroz

Na Paraíba, a empresa A&C tem dois programas voltados a pessoas a partir dos 50 anos. Conforme a empresa, o projeto “Longevidade” ajuda a disseminar a experiência e a alegria de viver dos trabalhadores nessa faixa etária, além de contribuir para uma maior diversidade na equipe. O projeto atua na recepção desses novos funcionários e no desenvolvimento de um plano de treinamento acolhedor que pensa nas particularidades tanto das pessoas maduras quantos dos mais jovens.

Outro projeto é a “Caravana do Bem Melhor Idade”, que realiza inclusão digital, com capacitação em tecnologia e redes sociais para pessoas mais velhas e familiares de colaboradores. Conforme Yveth, os próprios funcionários também foram capacitados para serem os multiplicadores dos grupos participantes. No ano de 2022, a A&C criou a Política de Diversidade, Equidade e Inclusão.

A gerente de Pessoas da A&C, Yveth Alves, explicou que os resultados obtidos a partir de contratação das pessoas com idade superior a 50 anos são os melhores possíveis tanto em engajamento quanto em produtividade. Ela considerou que os profissionais “mais maduros” trazem uma gama de experiências relevantes para a empresa.
“A realidade é que, enquanto os jovens estão mais abertos às inovações, se adaptando rapidamente ao avanço da tecnologia, que muito empregamos na empresa, as pessoas mais velhas trazem todo o conhecimento de sua experiência ao longo da jornada. Essa combinação é perfeita para o nosso negócio, pois os mais experientes podem ajudar inclusive na tomada de decisões”.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 28 de outubro de 2023.