Falar de suicídio é algo delicado, porém vital na prevenção do que tem se tornado uma epidemia no mundo, com o Brasil ocupando a oitava posição entre os países com os maiores índices do ato. É exatamente a promoção do diálogo que abre espaço para evitar que mais casos venham a acontecer.
"O mais importante, hoje, é a pessoa encontrar um espaço onde ela possa falar sem ser julgada"
- Monika Borges
Com o início do Setembro Amarelo, campanha pela valorização da vida, a psicanalista e coordenadora do Grupo de Apoio Emocional Acolhe-Dor, Monika Borges, explica que é preciso agir de forma proativa sobre o tema, pois, apesar de, nos últimos anos, ter havido uma diminuição do estigma envolvendo os transtornos mentais, a depressão ainda não é tão bem compreendida como deveria.
“Quando falamos de prevenção, estamos buscando fazer a promoção da saúde mental e a valorização da vida de forma ampla, não só com foco no suicídio”, diz Monika. “O suicídio não é um problema que tem uma causa só. Não existe uma receita pronta para combatê-lo. O mais importante, hoje, é a pessoa encontrar um espaço onde ela possa falar e, principalmente, falar sem ser julgada”, aconselha a especialista.
Além de permitir que o indivíduo seja ouvido, a profissional indica a busca por ajudas mais especializadas. “A terapia é muito importante e, muitas vezes, a questão medicamentosa também é essencial, porque pode haver um desequilíbrio nas sinapses biológicas do corpo, que podem estar causando aquele mal”, aponta.
Acesso ao tratamento
Um levantamento do Instituto Cactos, feito no ano passado, mostra que apenas 5% da população brasileira faz algum tipo de tratamento psicológico. Mas não é apenas o estigma que impede o acesso às terapias. Os custos com a intervenção profissional são, por vezes, as maiores barreiras para cuidar da saúde mental.
Monika Borges analisa, no entanto, que há outras maneiras de se manter saudável mentalmente. “Há também a arteterapia, o contato social de qualidade, uma caminhada na natureza, a meditação guiada, a ioga, enfim, são vários os recursos que podem ser aplicados sem custos. Eu escuto muito as pessoas dizerem que terapia é muito cara, mas existem outras formas de se trabalhar. E eu reforço: é preciso descartar qualquer possibilidade de adoecimento físico que possa estar piorando uma depressão, uma tristeza profunda ou qualquer outro tipo de transtorno”, detalha.
O papel da família
Algo que Monika também faz questão de trazer à tona é o cuidado que a família deve ter com a própria saúde psicológica, uma vez que lidar com uma pessoa que tem transtornos mentais ou emocionais pode ser desafiador.
Segundo a especialista, ambos precisam procurar ajuda profissional, tanto o familiar com depressão quanto a sua respectiva rede de apoio. Além disso, Monika relata que muitos familiares ainda perpetuam a ideia de que quem busca terapia ou vai ao psiquiatra é “doido”, pensamento que deve ser, urgentemente, deixado para trás.
“Esses profissionais são treinados para cuidar de quem está adoecido. Quando você tem, por exemplo, uma dor no pé, você não procura um ortopedista? Então, quando se tem um problema emocional, por que não procurar o profissional adequado? A família, muitas vezes, também precisa desses cuidados, e não há problema algum em admitir isso”, reforça.
Procurando ajuda
A psicanalista pontua que existem sinais de alerta que indicam que é hora de procurar ajuda. Alguns exemplos são: não querer sair de casa; falta de ânimo persistente; tristeza profunda e contínua; mudanças nos hábitos alimentares; alterações do humor; e insônia. Porém, esses comportamentos não podem ser avaliados individualmente.
“Todos são sinais, mas precisamos entender que é o conjunto de fatores que deve servir de alerta. Quando perceber que isso está acontecendo em nós mesmos ou em quem amamos, temos que buscar ajuda para perceber o desenvolvimento desse quadro e tentar frear uma evolução que pode, eventualmente, levar a uma tragédia. Os indícios existem, mas, muitas vezes, não são percebidos, e, depois do ato consumado, vem a culpa. Não existem culpados em suicídios, porém devemos prestar atenção”, esclarece Monika Borges.
Em casos urgentes, também é possível buscar os canais de atendimento de entidades como o Centro de Valorização a Vida (CVV), que atende pelo número 188.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 03 de setembro de 2024.