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CONSUMO CONSCIENTE

Economizar energia é um ato sustentável

publicado: 28/10/2024 09h29, última modificação: 28/10/2024 09h29
Reduzir o consumo de eletricidade não só alivia o bolso em tempos de bandeira vermelha, como também diminui a poluição gerada pelas termelétricas
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Ilustração: Bruno Chiossi

por Priscila Perez*

O consumidor desembolsa, hoje, R$ 7,87 a mais a cada 100 quilowatts-hora (kWh), devido à bandeira tarifária vermelha — patamar 2, em vigor neste mês. Mas é apenas quando a conta de energia chega, bem mais alta do que o esperado, que esses números fazem sentido. Nesse momento, as luzes acesas sem necessidade e os aparelhos ligados na tomada por conveniência surgem como um lembrete de que “economizar é preciso”.

A bandeira vermelha, por si só, já sinaliza algo importante: com a falta de chuvas no país, são as termelétricas — mais caras e poluentes — que entram em cena e complementam o abastecimento em um país onde 93,1% da energia é gerada por fontes renováveis.

No entanto, a conta mais alta não pesa só no bolso do consumidor. Quanto maior o consumo de energia, mais poluição é gerada, já que as termelétricas produzem eletricidade a partir da queima de combustíveis fósseis, como carvão mineral, gás natural ou derivados do petróleo.

Na Paraíba, a combinação de altas temperaturas e baixa umidade leva muitas pessoas ao uso constante de ar-condicionado e de ventiladores.  Nesta época do ano, considerada a mais quente e seca, a utilização desses eletrodomésticos tende a aumentar.

Ainda que a relação entre consumo de energia e impacto ambiental não seja tão visível para o consumidor, por que não aproveitar o momento para ajustar os hábitos e adotar práticas mais conscientes?

Segundo Hygor Mathaeus Afonso Santos, engenheiro e mestre em energias renováveis pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), pequenas mudanças podem fazer uma grande diferença na conta, além de reduzir a necessidade de geração de energia pelas termelétricas.“Usar equipamentos eficientes e tecnologias novas, como inverter no caso do ar-condicionado e LED nas lâmpadas, são formas de evitar o desperdício. Basicamente, o consumidor tem o mesmo resultado gastando menos energia”, analisa.

Ele destaca que é fundamental prestar atenção nas instalações elétricas, pois cabos subdimensionados também podem gerar perdas de energia. “Quando os cabos esquentam, essa energia vira calor e aumenta o consumo sem que o usuário perceba”, explica.

 Termelétricas

Antes de mergulhar no universo do consumo consciente, é importante entender como o ato de ligar um aparelho em casa impacta diretamente a geração de energia. “A energia que usamos é gerada e consumida no mesmo instante”, observa o especialista.

Isso acontece, porque não há como estocar vento ou energia solar, por exemplo. Já no caso das hidrelétricas, Hygor explica que a energia pode ser “armazenada” em forma de potencial gravitacional, mas, assim como as demais fontes energéticas, também é altamente influenciada pelo clima. “Quando tem água, tem energia. Mas quando está escassa, temos menos energia”, resume.

"Usar equipamentos eficientes e tecnologias novas são formas de evitar o desperdício"
- Hygor Santos 

Não à toa, embora o Brasil conte com uma matriz energética majoritariamente renovável, as termelétricas desempenham um papel importante na garantia do abastecimento, sobretudo nas horas de pico de consumo. Basta ter combustível para queimá-lo no momento que for necessário para gerar eletricidade, mas essa disponibilidade, claro, tem seu custo ambiental.

Segundo Joácio Morais, engenheiro civil e doutor em engenharia ambiental pela UFPB, além de professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental, o problema não está nas usinas em si, mas no combustível que alimenta seus motores. “A termelétrica funciona como um motor gigante. Imagine 40 caminhões ligados ao mesmo tempo, gerando energia e poluindo. A emissão de gases de efeito estufa na atmosfera é significativa”, explica.

Ao mesmo tempo, Joácio levanta uma questão importante: se, em um cenário de estiagem, os reservatórios ficarem vazios e a rede entrar em colapso, qual será a solução para garantir o fornecimento no horário de pico? Hoje, são as termelétricas que entram em ação, já que o Brasil pouco investiu em energia nuclear, por exemplo.

Para ele, contudo, a melhor resposta estaria na diversificação das fontes de energia para equilibrar o sistema, já que as hidrelétricas representam 58% da capacidade instalada do Sistema Interligado Nacional (SIN). “Se tivermos mais energia solar e eólica, vamos diminuir nossa dependência das hidrelétricas. E ainda há a biomassa. O lixo também gera energia, mas o biogás ainda é pouco explorado no Brasil”, reflete Joácio Morais.

Ainda assim, ele é claro quanto à importância das termelétricas no cenário nacional. “O que falta é modernizá-las”. Uma alternativa citada pelo especialista seria usar usinas de metanização, que produzem biogás a partir de resíduos orgânicos, ou seja, do lixo. Com isso, os motores poderiam ser movidos a gás, resolvendo dois problemas de uma vez só e de forma sustentável. Essa solução seria viável a partir da coleta seletiva, o que é um gargalo para o Brasil, já que o país recicla somente 4% dos resíduos que produz — segundo dados da International Solid Waste Association (ISWA).

Instalar placas solares em casa pode reduzir impacto financeiro

Fazia tempo que a bandeira vermelha — patamar 2 — não era acionada. A última vez aconteceu em agosto de 2021 e, desde então, o país teve um alívio com uma sequência de bandeiras verdes até julho deste ano. Para Igor Ferreira, de 31 anos, o alerta emitido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não representa mais um desconforto financeiro como nos anos anteriores.

Desde janeiro, ele conta com um sistema fotovoltaico para alimentar sua residência, no bairro Valentina Figueiredo, em João Pessoa, onde mora com os pais e o irmão. “A bandeira vermelha representava um acréscimo muito grande. A gente ficava naquela obrigação de ter que economizar para a conta não vir alta. E no verão era pior, porque aumentava o uso dos ventiladores”, relembra.

Agora, com as placas solares, a história é diferente. “Logo no primeiro mês, a conta, que antes era em torno de R$ 230, caiu para R$ 52. E, no último mês, pagamos apenas R$ 36. É uma diferença gigante”, comemora.

"A bandeira vermelha representava um acréscimo muito grande. A gente ficava naquela obrigação de ter que economizar"
- Igor Ferreira

Apesar da mudança, Igor continua praticando o consumo consciente aprendido ao longo dos anos e, ainda hoje, destaca a importância de verificar a eficiência energética dos aparelhos antes de comprar. “No geral, a gente já não gastava sem necessidade. Nem micro-ondas tínhamos mais em casa”, conta.

 Mesmo com o sistema solar, ele afirma que os bons hábitos não mudaram, embora a vida tenha ficado mais confortável.“Eu não ligo o ar-condicionado só por ligar, uso apenas quando necessário”, conta, reforçando que pequenos gestos podem fazer a diferença.

Embora Igor seja um exemplo positivo de consumo consciente, o professor Joácio Morais alerta que a responsabilidade não pode recair apenas sobre a população. “O consumidor tem um papel importante, mas não podemos colocar todo o peso nas suas costas. Precisamos de um planejamento que torne nossos ambientes mais sustentáveis”, reflete.

Ele ressalta que, em muitos casos, as cidades não são pensadas para serem sustentáveis. “Como esperar que alguém seja consciente morando em um prédio todo de vidro, sem ventilação natural, onde o uso do ar-condicionado é indispensável?”, questiona Joácio. Além disso, o professor lembra a finitude dos recursos. “Se eu não pensar no meu filho, no meu vizinho ou nas futuras gerações, uma hora esses recursos irão acabar”, conclui.

 Dicas de economia

Quer pagar menos na conta de luz sem perder conforto? Para Hygor Mathaeus, mestre em energias renováveis, a chave está na eficiência energética dos aparelhos. Quanto menos energia eles consomem, melhor. E o primeiro passo nessa direção é simples. “Uma lâmpada LED, por exemplo, ilumina muito mais gastando bem menos que uma incandescente”, exemplifica. E aquela etiqueta do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) não está ali à toa — o selo A é amigo do bolso.

E, na hora de usar os eletrodomésticos, vale juntar as roupas para passar ou lavar todas de uma vez e ajustar a iluminação ao ambiente. “Você não precisa de uma luz forte num corredor, por exemplo. É só de passagem, então dá para economizar ali também”, completa. Outra dica é desligar os aparelhos da tomada quando não estiverem em uso, já que o modo de espera também consome energia.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 27 de outubro de 2024.