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Peixe-leão

Espécie invasora ameaça equilíbrio

publicado: 03/11/2025 09h23, última modificação: 03/11/2025 09h23
Mergulhadores registraram a presença de peixe do Oceano Indo-Pacífico nas águas do Litoral da Paraíba
Busca ativa do peixe-leão - credito Clube do Mergulho (4).jpg

O peixe-leão não tem predador natural na região, por isso a sua presença preocupa biólogos e estudiosos | Fotos: Arquivo pessoal

por Samantha Pimentel*

Com um corpo listrado, cores vibrantes e longas nadadeiras que se parecem com uma juba, o peixe-leão é uma espécie invasora no ecossistema marinho brasileiro. Sua expansão populacional vem colocando em risco o equilíbrio ambiental e a segurança de banhistas e pescadores. Ele alimenta-se de outros peixes menores e crustáceos, e não tem predador natural na região, por isso a sua presença é preocupante e precisa ser controlada.

Além disso, o peixe-leão possui 18 espinhos venenosos que oferecem risco aos seres humanos, podendo causar dor intensa, vermelhidão, inchaço, náuseas e, em casos mais graves, pode levar a necrose da região afetada. Nativo do Oceano Indo-Pacífico, ele chegou ao Atlântico e vem espalhando-se pela região.

No Brasil, as primeiras aparições ocorreram em 2014, no Rio de Janeiro (RJ). Na Paraíba já foram 40 exemplares registrados, sendo mais de 30 animais capturados. Houve registros em Pitimbu, Conde, João Pessoa, Baía da Traição e Cabedelo.

Recentemente, mergulhadores da Papuan Mergulho e Turismo registraram a presença de dois exemplares de peixe-leão nas águas da Paraíba. O flagrante ocorreu durante um mergulho no Naufrágio Queimado, um dos pontos mais procurados por mergulhadores no Litoral do estado. 

Segundo informações da Superintendência de Administração do Meio Ambiente (Sudema-PB), a espécie foi identificada aqui em 2023 e, desde então, iniciou-se um trabalho para monitorar e mitigar sua presença no Litoral paraibano. Após a identificação dos primeiros registros no estado, também foram produzidos materiais informativos sobre o peixe--leão, incluindo orientações sobre os cuidados necessários e os canais de comunicação disponíveis.

“Paralelamente, visando uma resposta rápida, foi contratada uma empresa especializada em mergulho para realizar buscas nas unidades de conservação marinha”, destaca Leandro. A maioria dos exemplares capturados foram destinados à Universidade Federal da Paraíba (UFPB), visando fomentar estudos científicos sobre a espécie. Os animais foram encontrados em profundidades de 1,5 m a 30 m, incluindo indivíduos com mais de 30 cm de comprimento.

A proliferação da espécie no Atlântico é uma ameaça ao equilíbrio ambiental nesta região, devido a um conjunto de características: “Sua ampla variedade alimentar, eficiência de predação, alta fecundidade, rápido crescimento, resistência a parasitas e ausência de predadores, que possibilitam o sucesso reprodutivo e o aumento de suas populações”, afirma Leandro.

Os impactos estão relacionados à competição com outros peixes, prejudicando a cadeia alimentar, e a predação de espécies locais, que podem ter redução em sua quantidade. “Além disso, podem gerar riscos aos humanos devido à presença de espinhos venenosos”, ressalta.

O coordenador da Divisão de Fauna da Superintendência de Administração do Meio Ambiente (Difau) informa que, ainda neste ano, haverá uma reunião entre a Sudema-PB e outros órgãos, como a Secretaria do Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas-PB) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) na Paraíba. O objetivo é a implantação de novas medidas de controle e manejo da espécie na região.

Busca ativa será feita por equipe de mergulhadores ou pescadores

O biólogo, mergulhador e instrutor de mergulho, Ivan Occhi, do Clube do Mergulho de João Pessoa, equipe que vem trabalhando em parceria com a Sudema-PB, explica como se dá a busca ativa pelo peixe. “Realizamos uma ação conjunta para evitar a proliferação dessa espécie. Acabamos a segunda fase do trabalho, e vamos retomá-lo agora. Durante o inverno, as águas ficam muito turvas, e não era possível ter boa visibilidade para identificar e capturar os peixes, mas agora será retomado”, destaca.

Ele ressalta que vem sendo proposta a Sudema-PB uma nova forma de atuação, em que se capacite os pescadores para que eles possam capturar os peixes, caso os identifiquem em suas atividades de pesca. “Isso vai aumentar a efetividade desse trabalho de mitigação da espécie. E, em paralelo, a gente mantém a busca ativa”, afirma.

Para capturar os peixes, a equipe usa um equipamento feito com cano PVC, desenvolvido pelo biólogo e professor da Universidade de Pernambuco (UPE), Múcio Benja. De um lado do tubo, há uma borracha resistente. Do outro lado, uma tampa. A armadilha possui ainda um arpão de ferro inoxidável, com três pontas e uma borracha para controlar a velocidade do lançamento.

Quando o peixe é capturado com o arpão, é colocado no tubo, só sendo retirado quando a tampa é removida. O espaço existente na parte emborrachada permite a entrada do peixe sem deixar que ele fuja. “Descemos, uma dupla de mergulhadores, quando identificamos o peixe, capturamos com essa armadilha. Ele sendo territorial, não costuma sair da região onde foi avistado”, relata Ivan Occhi, que pontua que aos pescadores também foi explicado sobre a importância de atuar nesse cenário, e que eles são parceiros importantes nisso.

O mergulhador ressalta que esse trabalho é essencial para mitigar os danos causados pela presença do peixe, que prejudica o equilíbrio do ecossistema. A bióloga marinha e educadora ambiental, Karina Massei, que também é pós-doutoranda no Programa em Desenvolvimento e Meio Ambiente (Prodema) da UFPB, integra o Instituto de Pesquisa e Ação (InPact). Por meio dele, ações educativas vêm sendo desenvolvidas, para conscientizar pescadores, mergulhadores e toda comunidade local sobre a problemática do peixe-leão.

Ela pontua que a espécie é muito resistente e reproduz-se rapidamente: “Pode ser encontrada em águas mais claras ou turvas, pode estar no raso ou em áreas mais profundas, é bastante adaptável”, afirma.

Karina reforça que é necessário que esse trabalho de mitigação transforme-se em um programa, para que se amplie sua atuação. “Com isso, os pescadores, mergulhadores, os povos do mar vão receber o equipamento para captura e formação para isso, porque se não o peixe pode causar danos por causa do veneno. Então, com as águas mais claras, agora no verão, que se inicie isso, e não apenas a busca ativa que tem um limite menor de atuação”, pontua ela.

Animais encontrados são capturados e estudados por universidade

Uma pesquisa realizada em 2009 reportou que a primeira captura do peixe-leão no continente americano ocorreu na Flórida, nos Estados Unidos, em 1985. “O peixe-leão é popular entre os aquaristas, e uma das possíveis causas da sua chegada na região pode ter sido a soltura e a liberação acidental. A espécie foi, lentamente, espalhando-se pela costa americana, passando pelo Caribe e chegando à América do Sul e consequentemente ao Brasil”, explica Leandro Silvestre.

Na Paraíba, os espécimes capturados são entregues à Coleção Ictiológica do Museu da Biodiversidade da UFPB, e passam por estudos. O objetivo é investigar e monitorar o avanço dessa espécie invasora ao longo do Litoral paraibano.

“Em vista da variação no tamanho dos indivíduos coletados é possível inferir a existência de reprodução. Resultados sobre a avaliação das gônadas dos animais, são os meios que poderiam confirmar a maturidade dos animais e a viabilidade de reprodução, outra confirmação seria o registro de larvas da espécie”, comenta o coordenador da Difau.

O biólogo e técnico responsável pela Coleção Ictiológica da UFPB, André Luiz Costa Castro, afirma que a instituição recebeu o primeiro peixe-leão em novembro de 2021. Coletado na costa do Amapá, ele foi o primeiro encontrado no Brasil. Em 2023, começaram a chegar exemplares capturados na Paraíba.

“Com isso, uma aluna de graduação em Ciências Biológicas manifestou interesse em estudar os peixes. Inicialmente, ela foi estudando a anatomia, como manipulá-lo sem se machucar, e também vem estudando os seus hábitos alimentares. Hoje, temos aproximadamente 30 exemplares, para fazer um estudo profundo ainda não é um número suficiente, mas para fins de uma pesquisa de graduação está sendo interessante”, ressalta André, que informa, ainda, que a avaliação das gônadas ainda será processada.

Ele destaca também que, como predador voraz, o peixe-leão pode afetar drasticamente a abundância de peixes nativos no Litoral paraibano, por isso é preciso um esforço de monitoramento contínuo e ações de educação ambiental.

Informações

A orientação para as pessoas que porventura encontrem um peixe-leão é de que não toquem no animal nem façam a captura sem treinamento e material adequado. Nesses casos, deve-se informar a Sudema-PB pelos contatos da Difau: (83) 92000-7927 (WhatsApp), (83) 3690-1964 ou através do formulário eletrônico.

No site www.sisfaumar.com, mantido em uma parceria entre a Superintendência e o InPact, também é possível obter mais informações sobre a espécie e acompanhar o monitoramento das capturas já realizadas. Se ocorrer acidentes com o peixe, a indicação é usar água quente no local afetado, para aliviar o incômodo, e procurar atendimento médico o quanto antes.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 2 de novembro de 2025.