A Diocese da Paraíba (hoje Arquidiocese) vai completar 130 anos de sua instalação no próximo ano. Ela foi conduzida por seus arcebispos, vivendo períodos e épocas com acontecimentos que marcaram sua história. Seja uma trajetória guiada pela palavra das escrituras sagradas como também ocasiões em que levantou a bandeira em favor das questões sociais.
A Diocese da Paraíba foi criada no dia 27 de abril de 1892, no entanto, somente foi instalada dois anos depois, com a chegada do primeiro bispo, Dom Adauto Aurélio de Miranda Henriques, abrangendo do Litoral ao Sertão. A criação da Diocese de Cajazeiras, no dia 6 de fevereiro de 1914, possibilitou a elevação da Diocese à condição de Arquidiocese. Foram criadas também as Dioceses de Patos (1949), Campina Grande (1959) e Guarabira (1980), formando, assim, a Província Eclesiástica da Paraíba. No passado, a Paraíba era vinculada à Diocese de Olinda.
Segundo notícia do Jornal Imparcial, do dia 15 de abril de 1861, a Província da Paraíba contava com o número de 32 paróquias, além das do Rio Grande do Norte. Durante os séculos 17 a 19, diversas paróquias foram criadas com a ocupação do território paraibano, através das doações das sesmarias.
O professor e mestre diácono Cristiano Amarante da Silva revela que Dom Adauto teve que superar diversas dificuldades ao assumir a Diocese da Paraíba. Ele precisou organizar e estabilizar as ações diocesanas no âmbito administrativo e pastoral. “Sua primeira providência foi buscar um espaço onde deveria funcionar a administração da nova Diocese, transformando o antigo Convento Carmelita no Palácio Episcopal, em 1894. Ele transferiu o seminário diocesano para o espaço do Convento e Igreja de Santo Antônio. Nesse mesmo período, por iniciativa de Dom Adauto, foram fundados o Colégio Diocesano e o Colégio de Nossa Senhora das Neves”, revela.
Arquidiocese passa por transformações
É no período de Dom José Maria Pires que a Igreja Católica e, consequentemente, a Arquidiocese da Paraíba passam por grandes transformações. O diácono Cristiano Amarante relembra que Dom José Maria Pires chegou à Paraíba em 30 de março de 1966, no período da ditadura militar.
“Quando ele assumiu a Arquidiocese encontrou um verdadeiro ‘barril de pólvora’. Existia a necessidade de se posicionar perante a situação vivida no Brasil. O país estava mergulhado em um período de perseguição aos opositores do regime militar. A Igreja na Paraíba, através do seu arcebispo, se posicionou, ficando ao lado dos pobres, se envolvendo na luta por terra, apoiando as ligas camponesas. A Igreja lutou contra o regime militar dando apoio jurídico e estrutural às pessoas perseguidas”, informa.
Foi no período de Dom José Maria Pires, e depois com Dom Marcelo Pinto Carvalheira, que a Arquidiocese da Paraíba tomou novos rumos na sua evangelização, sobretudo com relação às questões sociais, na luta pelas conquistas de políticas públicas em favor da vida. Na percepção de José Nunes, esses dois arcebispos, notadamente, se sobressaíram pelos posicionamentos em favor dos excluídos.
“Eles se comprometeram em seguir votos de pobreza e de lutar pelas causas sociais dos excluídos. Dom Marcelo Carvalheira, por exemplo, além de seguir a linha social emanada dos Evangelhos desde o Pacto das Catacumbas, tinha um olhar para a vivência das práticas místicas, sobretudo baseadas nos ensinamentos de São Bento, tanto é que, quando concluiu seu trabalho à frente da Arquidiocese, retornou para o Mosteiro Beneditino, em Olinda, como oblato”, destaca Nunes.
No Cristianismo, um oblato é uma pessoa que se dedica especificamente a Deus ou ao serviço de Deus. Oblatos são indivíduos, leigos ou clérigos, normalmente vivendo em sociedade em geral que, embora não sejam monges ou monjas professos, se afiliaram individualmente a uma comunidade monástica de sua escolha.
O diácono José Nunes, que também é escritor e colunista do Jornal A União, cita alguns acontecimentos marcantes ao longo desses anos, como a ocupação das Fazendas Alagamar e Maria Melo, em Salgado de São Félix, onde houve muita tensão entre posseiros e a polícia, cabendo à Igreja a intermediação dos conflitos.
Dom Adauto esteve ligado ao tradicional da igreja
De acordo com José Nunes, diácono, jornalista e integrante do Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba (IHGP), Dom Adauto e seus sucessores imediatos estavam bastante ligados ao tradicional da Igreja, seguindo normas e preceitos herdados do tempo em que a Igreja Católica estava alinhada ao poder temporal. “Na Monarquia e depois nos governos que se sucederam na República, a Igreja estava no estado, mas isso, de certa forma, foi quebrado quando aconteceu o Concílio Vaticano II (1962-1965), que definiu novas maneiras para a Igreja cumprir sua missão evangelizadora”, explica.
Nas gestões de Dom Moyses Coelho e de Dom Mário não aconteceram grandes feitos, apenas práticas voltadas à caminhada pastoral cotidiana, perante o crescimento demográfico da população paraibana nesse período, localizada em sua maioria na zona rural, segundo informações da Arquidiocese.
Momentos tensos na ditadura militar
Outro momento tenso foi nos anos de 1970, quando a Igreja denunciou o Esquadrão da Morte, denominado de Mão Branca, que praticava assassinatos na região de Guarabira. Outra ação que a Igreja atuou efetivamente foi a retirada do Lixão do Roger, em João Pessoa, onde viviam centenas de famílias, com a promessa de que ali fosse criado um parque, o que, quase três décadas depois, ainda não foi implantado.
Com o arcebispo Dom Aldo di Cillo Pagotto, o diácono José Nunes lembra que esse olhar para os excluídos teve uma mudança de rumos. Sua atuação era voltada mais para o sagrado e a aproximação ao poder temporal. “O final de seu mandato, de certa forma, foi conturbado, com afastamento de padres de suas atividades sacerdotais, culminando com sua renúncia”, ressalta. Já a chegada de Dom Manoel Delson à Arquidiocese da Paraíba entra em um novo período na condução de suas ações evangelizadoras, mesclando a mística, questões sociais e a ação evangelizadora.
Por fim, o diácono Cristhiano enfatiza que a Arquidiocese da Paraíba vem mantendo suas tradições, mas também atualizando as práticas do Evangelho, sempre em comunhão com o Papa Francisco. “Inovamos através da evangelização por meio de mídias sociais.
Em relação aos temas atuais, priorizamos tudo que vem a colaborar com a vida e sua preservação, desde a concepção. Com a realização do Sínodo 2023, partimos para a prática da escuta de quem, muitas vezes, é silenciado até na Igreja, a exemplo da comunidade LGBTQIAP+, idosos, jovens, mulheres, pessoas pretas, desempregados e pessoas em situação de rua”, frisa.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 2 de julho de 2023.