A leitura é essencial. Da infância à terceira idade, o hábito de ler contribui de diferentes maneiras para o desenvolvimento e manutenção das habilidades cognitivas humanas. E é no folhear de livros, encartes e outros escritos que a população idosa encontra meios para se manter saudável, pois, além de auxiliar nas funções motoras, estudiosos apontam que a leitura diária de informações simples favorecem até mesmo a saúde mental desse público.
A escrita faz parte da História da humanidade e, naturalmente, compõe a história da maioria dos indivíduos. Leitora assídua de A União, a dona de casa Maria da Salete Morais, de 78 anos, exercita a leitura de variadas formas. Além do periódico, que lê da capa ao Memorial, Salete realiza a leitura da Bíblia todos os dias e costuma devorar livros de muitos autores, dentre eles Ariano Suassuna, José Lins do Rego, Carlos Drummond de Andrade e Manoel de Barros.
"Os livros são, para mim, mais do que simples histórias; são uma companhia" Maria da Salete Morais
A história de Salete com as letras, porém, começou muito antes, através de seu pai, que, sempre muito empenhado com a educação dos filhos (dentro e fora de casa), desejava que eles fossem à escola alfabetizados. “Papai resolveu que chegaríamos lendo na escola. Ele tinha uma estante com vários livros e, ali, arranjou um espacinho para colocar os livros que comprava para a gente. Na estante ficavam, então, os dele e os nossos, como se um abrisse caminho para o outro”, lembra Salete, que antes dos cinco anos já sabia ler.
Conforme apontado pela Mestre em Linguística pela Universidade Federal da Paraíba, Lívia Teixeira Lins, no artigo “História da Leitura”, da revista acadêmica Educação Pública, a leitura (ou melhor, a decodificação da fala em pedra, papel e outros materiais para posterior interpretação visual) faz parte da evolução humana. Para a especialista em linguística, “a escrita e a leitura são reconhecidas pela sociedade como forma de comunicação e conhecimento; sua história avança para além-texto”.
Foi, justamente, a partir da leitura que o dom da escrita aflorou em Maria da Salete. O convidativo universo de páginas preenchidas fez com que ela descobrisse, mais tarde, o igualmente interessante mundo das páginas vazias, onde ela mesma poderia enfileirar letras e construir suas próprias frases, cobertas do sentido que ela mesma quisesse. Assim começaram a surgir os delicados poemas que a dona de casa dedica aos quatro filhos - três deles formados jornalistas - e aos amigos próximos.
“Lembro-me do primeiro conto que li e também das primeiras poesias. Acredito que cada pessoa nasça com um dom e este seja o meu. Cada cabeça é única e capaz de produzir coisas maravilhosas. Eu sou capaz de escrever meus poemas”, conta a dona de casa.
Uma fonte de prazer e lazer terapêutico
Ao longo das eras, a sociedade desenvolveu uma saudável e positiva relação com a leitura, o que evoluiu progressivamente para diversos benefícios que ultrapassam a aquisição de conhecimento. Segundo a bibliotecária Clarissa Benassi Gonçalves, a leitura é vista não apenas como hábito saudável, mas também como fonte de prazer e lazer terapêutico; responsável por estimular, ainda que indiretamente, a autoestima daquele que lê.
A bibliotecária, que estudou ações de leitura desenvolvidas por outros bibliotecários para o público idoso, entende que a leitura é uma experiência transformadora: “Ao fazer uma leitura, o indivíduo pode resgatar suas próprias experiências e suas necessidades. A leitura, seja ela qual for, pode tornar uma pessoa alegre ou deprimida, despertar a curiosidade, estimular a fantasia, provocar descobertas, lembranças, liberar as emoções, levar as pessoas a outros tempos e lugares, imaginários ou não, provocar satisfação, promover a compreensão do indivíduo e do mundo”.
Aliás, para Clarissa, o ato de ler e ouvir histórias é fundamental, porque, além de ser fonte de conhecimento, é, também, terreno fértil para a prevenção de “possíveis problemas psicológicos causados por uma sociedade altamente tecnológica, como nos dias atuais”.
“Os livros são, para mim, mais do que simples histórias; são uma companhia. Me sinto tão bem lendo. Sou um desastre na cozinha, então, me ocupo há 30 anos com o jornal e há muitos anos com os livros e com a Bíblia”, relata Maria da Salete, que, em plenos 78 anos recém-completos, goza de boa saúde, vitalidade e incalculável singeleza.
Segundo a biblioteconomista Juliana Andreza de Sousa, as vantagens do incentivo à leitura na terceira idade são muitas. Juliana aponta que há contribuição emocional no ato de ler: “seja romance, drama, aventura ou interesse do leitor, a prática da leitura permite acalmar e trazer benefício para aqueles que vivenciam contratempos em meios as lidas cotidianas que sobrecarregam a saúde”. E, para Maria da Salete, que alheia à sua própria sabedoria, admira os outros pelo caráter e pela inteligência, é isso mesmo. Os óculos da pequena senhora são como um portal para outros mundos, a maioria deles desconhecidos e existentes apenas na mente de quem deu vida à história e dos que a consumiram.
Com muita sensibilidade e a transparência de quem já leu o suficiente para não se recordar de tudo, Maria da Salete pede desculpas ao anunciar que a foto que ilustraria sua entrevista não seria posada, ensaiada ou fingida. “Se querem tirar uma foto minha lendo, tenho que ler. Não sei fingir. As sensações estão enraizadas na gente. Acho que, por isso, jamais seria atriz. É muito difícil. Talvez por isso goste de ler e escrever… É algo natural para mim”, afirma a senhora, que atualmente lê, “Eu sei por que o pássaro canta na gaiola”, autobiografia da escritora e poetisa estadunidense Maya Angelou, ao iniciar uma nova incursão ao delicado mundo das letras.
Benefícios da leitura
- Previne doenças, como Alzheimer e Parkinson;
- Estimula a memória;
- Auxilia na apreensão de informações;
- Melhora a compreensão de mundo do leitor;
- Mantém a saúde intelectual e mental ativa
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 15 de julho de 2023.